AUTOR
Jorge Gomes
Professor associado com agregação no ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa
Coordenador científico do MBA e coordenador do ISEG International Program of Doctor of Business Administration Studies (iDBA)
A popularidade da sustentabilidade tem crescido exponencialmente nos últimos anos, sendo apenas equiparável ao forte aumento dos problemas ambientais, sociais e económicos, criados por um sistema centrado nos resultados do curto prazo.
Originalmente centrada na durabilidade da organização no longo prazo, e depois alargada para a responsabilidade social da empresa, a visão atual de sustentabilidade significa não apenas a capacidade de gerar valor no longo prazo, mas também a habilidade da organização de agir ética e harmonicamente com todos os grupos de interessados, que incluem os clássicos clientes e consumidores, mas também a sociedade e o ambiente.
Nesta nova senda, alguns dos melhores exemplos chegam de empresas ancestralmente ligadas a indústrias dilapidadoras do ambiente, que assim ensinam como é possível fazer negócio, respeitando o planeta e o seu futuro. Procure o leitor pela Declaração Ambiental da Renova, pelo Comprometimento para com a Sustentabilidade da Logoplaste, ou pela Estratégia de Sustentabilidade da Jerónimo Martins, para atender às inflexões profundas iniciadas por estas companhias. A este propósito, em janeiro de 2019, a Jerónimo Martins entrou no índice Euronext Vigeo-Eiris Europe 120, que distingue as 120 empresas da Europa que promovem a sustentabilidade. A GALP e a EDP também entraram na lista, que reúne mais de 300 indicadores em tópicos tão diversos como Direitos Humanos, Recursos Humanos, Envolvimento com a Comunidade, Corporate Governance, Ambiente e Conduta Empresarial.
No plano político global, o discurso da sustentabilidade também tem sido amplamente adotado, sendo que talvez um dos acontecimentos mais significativos foi a definição dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, pelas Nações Unidas, quando apresentou em 2015 a sua Agenda 2030. Estes “Objetivos para Transformar o nosso Mundo” definem as prioridades e aspirações globais para 2030 e implicam uma ação à escala mundial de governos, empresas e sociedade civil para erradicar a pobreza e criar uma vida com dignidade e oportunidades para todos, dentro dos limites do planeta.
Esta mudança nos negócios apenas agora está a dar os seus primeiros passos, pelo que não admira a variedade e número de práticas orientadas para a sustentabilidade dos negócios. O exemplo fornecido pelo Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (associação portuguesa que integra a rede mundial do World Business Council for Sustainable Development – WBCSD) é atraente. Ali se expõem os cinco vetores de transformação para mudar o paradigma de criação de valor:
- Economia circular: reutilização, recuperação, reciclagemClima e energia: combate às alterações climáticas e transformação do sistema energético
- Alimentação e natureza: desenvolvimento agrícola em simultâneo com regeneração dos ecossistemas e dos recursos naturais
- Cidades e mobilidade: repensar as cidades, de modo a criar ambientes mais sustentáveis
- Pessoas: uma amálgama de práticas que abrangem desde o consumo sustentável à mudança dos estilos de vida
O último vetor é possivelmente o mais desafiante, e talvez por isso o mais enigmático em termos de concretização, no site do WBCSD. Enquanto os quatro primeiros exigirão soluções relativamente dependentes de fatores controláveis pela volição humana, o quinto implicará uma revolução cultural e social para a qual o ser humano não está preparado. Assim, a concretização dos quatro primeiros vetores dependerá de uma combinação de alterações políticas, legais, económicas, tecnológicas e científicas. Isto trará convulsões e mesmo conflitos, mas a prazo elas tenderão a substituir o atual paradigma de negócios, cada vez mais esgotado, por um outro que garanta um futuro para as gerações vindouras.
A transformação mais profunda deverá ser nas pessoas, nos seus hábitos e comportamentos, individuais e coletivos, e por conseguinte no modo como o ser humano define o seu relacionamento com o meio envolvente. Será difícil precisar historicamente quando terá acontecido, e como terá acontecido, mas, num ponto distante no passado, o ser humano olhou para a sua envolvente como um garante da sobrevivência. Provavelmente incentivado pelo progresso tecnológico e social, evoluiu-se depois para uma conceção totalitária e absolutista relativamente ao meio envolvente, visto agora como um espaço onde se concretizam as liberdades individuais e o direito legítimo de domínio e exploração sobre o sistema.
Ora, é por demais evidente que tal modelo mental se esgotou.
O maior desafio vai ser reconstruir, em termos coletivos, a visão que a humanidade tem da envolvente.
A educação, as lideranças fortes e transformadoras, os casos de referência, as reformas sociais, e outros poderosos instrumentos de engenharia social e cultural, estarão certamente na linha da frente da mudança exigida, mas na sua maior parte eles requerem tempo para produzir efeitos. Resta saber se a humanidade e o planeta têm esse tempo.