Com a eclosão das novas tecnologias e de formas cada vez mais inovadoras e disruptivas de trabalhar, alterações abruptas de paradigma foram adotadas na forma como conformamos a nossa prestação de trabalho e organizamos a atividade corporativa.
Foi dada primazia a formas colaborativas e mais integradoras de trabalhar, fazendo sobressair o valor acrescentado que advém de tal complementaridade e interação, como sucede com o trabalho em equipa e por projeto.
Open spaces e co-works – vieram mudar radicalmente a morfologia interna das organizações – impondo como tónica de atuação a proximidade, a informalidade, o espírito colaborativo, a agilidade, a interdependência e a diversidade cognitiva.
Porém, este status quo – que aparentemente mereceu o “beneplácito” geral de organizações e Colaboradores, até como modo ótimo de compatibilizar via pessoal e profissional – está, agora, a ser questionado – e sem apelo nem agravo, pela emergência do surto mundial iminente do coronavirus (“Covid-19”), que está a obrigar as organizações, os Colaboradores (e a sociedade em geral), a tomar medidas cirúrgicas que implicam refrear todos os fenómenos que, tendencialmente, possam representar coesão/agregação social.
A adoção de medidas de urgência, planos de contingência e procedimentos de natureza excecional, está, portanto, a ser encarado como o momento por excelência para obrigar as organizações a testar os seus instrumentos de flexibilização laboral, como se afigura o caso do teletrabalho (trabalho remoto).
Com efeito, uma pluralidade de organizações já está a ativar este mecanismo como resposta interna, e a uma escala que é, já, quase planetária e com um sentido de premência nunca até ao momento, experienciado.
Perante a ameaça de podermos vir a ser infetados – e com um índice de probabilidade que começa a ser muito significativo, também em Portugal – o teletrabalho convoca presentemente a envolvência direta do topo estratégico das organizações, como medida de prevenção e combate, destinada a estancar a disseminação do vírus nos locais de trabalho.
Assim, o exercício de atividade em modo remoto via utilização de meios tecnológicos tem sido uma verdadeira “prova de fogo” corporativa nacional, obrigando as organizações a testar a sua capacidade, de manterem ativos e eficientes os seus sistemas, através da utilização de plataformas de gestão com epicentro fora das suas instalações.
Se por um lado, este “êxodo profissional” é qualificado como uma das soluções adequadas para as graves contingências emergentes do Covid-19, a verdade é que a efetiva implantação do regime de teletrabalho em organizações de base não tecnológica e/ou em PME’s não está, ainda, devidamente enraizada.
Cumpre, pois, validar se este mecanismo será exequível em todas as organizações, parcial ou totalmente, devendo proceder-se à seguinte análise prévia:
- Verificar se o teletrabalho é ou não, compatível com o tipo de trabalho exercido por cada trabalhador e atividade empresarial desenvolvida;
- Garantir que a opção teletrabalho está devidamente acautelada no contrato de trabalho (ou em aditamento), com indicação de todas as menções obrigatórias;
- Sendo o teletrabalho uma prestação desenvolvida “fora da empresa, através do recurso a tecnologias de informação e de comunicação”, verificar se o empregador dispõe de recursos / meios tecnológicos bastantes para o assegurar (provendo pela instalação, manutenção e pagamento das despesas associadas);
- Caso o regime de teletrabalho seja de aplicação meramente transitória, acordar na sua duração concreta e findo tal período, definir os termos do regresso à empresa do trabalhador;
- Respeitar a privacidade e tempos de descanso do trabalhador e família – sendo que neste item, ganham particular acuidade, a potencial (e, legítima a nosso ver) interferência na vida pessoal dos teletrabalhadores, a fim de conseguir detetar, com a sua ativa participação, a passagem potencial por zonas de risco/contágio e deter a disseminação do vírus);
- Prover pelo escrupuloso cumprimento, por trabalhadores e teletrabalhadores, das diretrizes emanadas da Direcção-Geral da Saúde (DGS) e Planos de Contingência específicos que o empregador tenha comunicado, garantindo uma completa e atempada informação e divulgação a todos os trabalhadores.
Neste enquadramento, e a contrario, não deixa de ser curioso o facto de o regime legal de teletrabalho (fora do domínio da sua aplicação como solução para a pandemia em referência) impor genericamente ao empregador que evite o isolamento do teletrabalhador, promovendo contactos regulares com a empresa e demais trabalhadores.
No contexto específico que vivemos, naturalmente que o cumprimento desta diretriz deverá reportar-se a um isolamento físico, pelo que o combate a tal isolamento far-se-á, necessariamente, via utilização de contactos telefónicos, teleconferências e outros contactos remotos, em detrimento de reuniões presenciais e viagens em serviço, a fim de não fazer perigar a aplicação das demais medidas de contenção.
Cada organização deverá, assim, estar alerta e sempre em estreita conexão com os seus serviços de SST (segurança e saúde no trabalho) como canal de atuação privilegiada e de feedback ativo, incrementando ações de medicina ocupacional (ex: aumentando o número de exames periódicos de controlo, implementando rotinas de limpeza e de desinfeção frequentes, identificando os trabalhadores mais vulneráveis ou mais expostos);
Por outro lado, cada empregador deverá adotar de medidas SST de maior eficácia – ex: mais ventilação de espaços, desinfeção, identificação de áreas de isolamento equipadas com máscaras, instalações sanitárias, material descartável, desinfetantes, água, perecíveis e linha telefónica para contactar o SNS 24 (808 24 24 24) – identificando os seus recursos materiais e humanos essenciais, estabelecendo regimes de escalas alternativas de trabalho e respetivas linhas de reporte, como forma de otimizar mecanismos de resposta e sistemas internos.
Por fim, e no que concerne à matéria das ausências ao serviço / faltas, designadamente por motivo de isolamento profilático – não obstante este motivo não constar (ainda) do elenco de faltas justificadas – entendemos que, não sendo as mesmas imputáveis a título de culpa, as mesmas poderão, ainda, caber em tal qualificação (sendo esta aliás a tendência que está a ser seguida no plano da sua subsidiação).
Atendendo a que este isolamento é, por definição, transitório, poderemos estar na presença de faltas ao trabalho: (i) recomendadas/preventivas; (ii) situações de quarentena voluntária em situações em que ocorreu algum nível de exposição (ex: passagem por zonas de risco); ou de (iii) faltas por infeção por Covid-19 (incapacidade para o trabalho clinicamente diagnosticada).
Cumpre, pois, a todos e a cada um de nós, tornar esta missão aparentemente Impossível numa missão (corporativa e social) possível, diminuindo os riscos de exposição e fazendo regredir os casos diagnosticados Covid-19, como já está a ocorrer em algumas zonas do globo.
007, Licença para Prevenir e Erradicar!