Rita Melo Sousa
Licenciada em Sociologia com minor em Recursos Humanos e Organização e pós-graduada em Gestão de Recursos Humanos
No âmbito da Reforma da Administração Pública do XV Governo Constitucional, surge em 2004 um novo modelo de avaliação, designado por SIADAP, através da Lei n.º 10/2004, de 22 de março, e regulamentado pelo Decreto Regulamentar 19-A/2004, de 14 de maio. A grande mudança introduzida nesta nova abordagem é a lógica da gestão por objetivos, bem como a extensão da avaliação a dirigentes intermédios e aos próprios serviços.
Se a criação da Lei que estabelece o sistema integrado de avaliação e gestão da avaliação de desempenho e os seus instrumentos de regulamentação vieram a dar resposta a uma ineficiência da administração pública, a sua aplicação reverte o seu efeito, isto é, a introdução abrupta destes mecanismos de avaliação, sem qualquer intervenção formativa neste sentido, resultou numa atitude de resistência por parte dos funcionários e dirigentes. Este método de avaliação vem assim retirar a atenção das atitudes pessoais e introduzir a avaliação baseada em resultados e limitar as classificações superiores por um sistema de quotas. Todo este processo implicou uma mudança na cultura organizacional dos serviços públicos sem haver uma preparação para a sua aplicação.
O método de gestão por objetivos implica um envolvimento da gestão de topo com a determinação dos objetivos estratégicos para a construção dos objetivos dos níveis seguintes, de modo a garantir uma interligação de todos os níveis influentes na execução dos objetivos da organização. Até então na administração pública portuguesa o envolvimento dos dirigentes de superiores de 1.º grau na gestão do serviço era precário, sendo implementado apenas pela Resolução do Concelho de Ministros n.º 109/2005, de 30 de junho, que determina a construção dos objetivos em cascata, partindo dos objetivos estratégicos para os objetivos dos serviços, dirigentes e colaboradores.
Se a conceitualização do sistema de avaliação na administração pública já era questionável, dado a sua abrupta implementação sem qualquer formação inicial, as alterações introduzidas por força da Lei do orçamento de estado de 2013, LOE2013, vieram a prejudicar ainda mais o sistema. Ora com a diferenciação de periodicidade entre os subsistemas, os intervenientes no sistema de avaliação ficaram ainda mais desiludidos com o sistema, isto é, sendo o SIADAP 1 anual, o SIADAP 2 trienal e o SIADAP 3 bienal, como é possível a adequada articulação entre eles? Isto implica que exista sempre uma reformulação de objetivos dos trabalhadores ou uma duplicação de objetivos dos serviços. E os dirigentes? Se a avaliação é feita em cascata de cima para baixo, com estas alterações a elaboração de objetivos é determinada do meio para baixo e depois para cima, do subsistema com mais duração para o com menos duração.
Outro problema identificado com a alteração da Lei de orçamento de Estado 2013 é o do SIADAP 2, contudo este problema não é proveniente desta alteração, mas sim de Lei de Orçamento de estado de 2010, que revoga o artigo 28.º do estatuto de Dirigente, perdendo estes a correspondência da avaliação como dirigentes com efeitos na carreira de origem e a LOE2013 afirma que a avaliação feita em SIADAP 2, não tem efeitos na carreira e que para tal devem requerer a avaliação de acordo com os pontos 5 a 7 do artigo 42.º e 43.º da mesma Lei. Ora isto revela uma incongruência dentro da própria lei, isto é, é estabelecido o sistema de avaliação de dirigentes, é estabelecido o período de avaliação, são determinados objetivos e competências e respetivos efeitos, que se traduzem numa nulidade pois a avaliação feita neste sistema não produz efeitos para si, mas sim no estatuto de dirigentes, aquando a renovação da comissão de serviço. Interrogo assim, qual a necessidade de haver um sistema próprio para Dirigentes se a classificação atribuída em sede de ficha de SIADAP 2, não é contabilizada. Desta forma os dirigentes têm duas avaliações, sendo a classificação da avaliação em SIADAP 2 uma nulidade.
Outro conflito que surge deste sistema de avaliação é a introdução das quotas. Isso implica que apesar de um trabalhador ter desempenho relevante, por existir uma quota, ele poderá não ter o relevante, no que resulta na sua maioria na indignação e desmotivação do trabalhador e na desacreditação no sistema de avaliação. O próprio artigo que determina a diferenciação de desempenho indica as suas próprias lacunas do sistema, logo no n.º 1 do artigo 75.º remete para um artigo que a própria lei revoga, o artigo com os efeitos da distinção de mérito, que consequentemente implicaria aumentar as percentagens de relevantes de 25% para 35% e de 5 para 10% nos excelentes.
No que concerne aos efeitos da distinção de mérito, esses também sofrem alterações sendo revogada a atribuição do dias de férias como reconhecimento de desempenho excelente e relevante. Concretamente, os efeitos de maior impacto na vida pessoal e profissional do trabalhador, traduzem-se na possibilidade de estágios em outros serviços públicos, em serviços de Administração pública no estrangeiro e frequência em ações de formação, e apenas se o trabalhador tiver a classificação de excelente. Isto é, para além das quotas, que vieram a desacreditar o sistema de avaliação, a revogação dos benefícios de maior impacto para os trabalhadores, colmataram a irrelevância do sistema de avaliação na administração pública.
Estará na altura de repensar a forma como os trabalhadores da função pública são avaliados?! Sem dúvida!