Autor: Georg Dutschke, Co-Fundador Happiness Works
Desde 2012 que avaliamos o nível de felicidade organizacional em Portugal através do projeto Happiness Works, no qual já participaram 43.000 profissionais de 360 organizações. Em 2023, o nível de felicidade organizacional foi de 3,9 (1. muito infeliz a 5. muito feliz), superior ao valor de 3,5 registado em 2012, o primeiro ano de avaliação.
Este crescimento deve-se, principalmente, a uma alteração por parte das organizações sobre o entendimento do que é felicidade organizacional, não apenas um somatório de momentos que proporcionam bem-estar aos colaboradores, mas algo mais estratégico, uma cultura.
Hoje, existem modelos que permitem medir o nível de felicidade numa organização e monetizar o seu impacto na rentabilidade. Existem métricas, validadas através da ciência, que permitem utilizar a felicidade organizacional como um instrumento de gestão e validar o seu impacto na rentabilidade.

Em 2023, o setor com profissionais mais felizes é o de Comunicação/Informação e o menos feliz o Estado. Uma tendência que se mantém nos últimos anos.

Quando analisamos a evolução da felicidade organizacional em Portugal nos últimos 10 anos, é possível verificar que todos os setores de atividade aumentaram o seu nível de felicidade organizacional com exceção do setor Construção e Imobiliário.
É de destacar o crescimento do nível de felicidade organizacional nos setores de Comunicação/Informação e Financeiras/Seguros, os que mais contribuíram para o crescimento da felicidade organizacional em Portugal.

É particularmente interessante o setor Financeiras/Seguros, no qual as organizações se souberam transformar e modernizar, com novos modelos de negócio baseados em tecnologia (Revolut, MBway, …), uma nova cultura de trabalho com maior preocupação no bem-estar para os colaboradores e a possibilidade de trabalho remoto.
O trabalho remoto contribui para a felicidade organizacional, mas origina alguns desafios. Com o aumento do trabalho não presencial a comunicação é mais complexa, o contato físico é menor, em alguns casos quase inexistente, e a relação informal mais difícil.
A liderança, e em particular a liderança intermédia, tem um grande impacto na felicidade organizacional. Não é suficiente uma visão estratégica se no dia a dia a felicidade organizacional não é promovida. Esta é uma evolução gradual e geracional. As gerações mais seniores estão menos habituadas ao conceito de felicidade organizacional e podem ter mais dificuldade em saber como a implementar no dia a dia. Uma grande parte dos líderes intermédios são desta geração. Com o tempo e a renovação geracional é expectável que a liderança se ajuste e contribua para a felicidade organizacional.
No estudo HW23 perguntámos quais os momentos que mais contribuíram para a felicidade organizacional. Das 9.100 citações recebidas, 17% referem-se a ajudar/ser ajudado, o que é mais difícil com o trabalho remoto. O contato físico é menor e existe menos sensibilidade para perceber se o colega precisa de ajuda por razões profissionais ou pessoais.
Estes momentos de comunicação muito empática, sincera e que promovem a relação entre pessoas, são menos frequentes e os colaboradores sentem a sua falta. Este efeito é refletido na variável “considero os meus colegas como amigos”, uma das menos bem avaliadas em 2023 (3,4).
Os momentos de socialização são, também, excelentes oportunidades de relação informal e representam 15% das experiências que promovem a felicidade organizacional (HW 2023). Com o trabalho não presencial existem menos momentos de socialização, formal e informal, condicionando a relação entre colegas.
É importante que as organizações consigam promover momentos de socialização e o encontro físico dos seus colaboradores, que facilitam a resolução de problemas pessoais e profissionais, e promovem processos de inovação incremental ou disruptiva.
O nível de felicidade organizacional de quem apenas trabalha apenas remotamente baixou em relação a 2022. Atualmente é igual ao de quem trabalha em formato híbrido.

É evidente que os profissionais são menos felizes quando trabalham apenas presencialmente, mas, a solução não é trabalharem sempre remotamente. O equilíbrio no trabalho híbrido com foco em resultados, parece ser o caminho mais adequado.
Acredito que o grande desafio das organizações é encontrarem um ponto de equilíbrio entre o trabalho presencial/remoto e os momentos de socialização a promover. O caminho pode ser facilitar estes momentos nos dias em que o trabalho é presencial ou através de eventos de maior dimensão durante o ano. Algumas empresas, mais híbridas, realizam grandes eventos anuais onde juntam todos os colaboradores em fins de semana informais e lúdicos. O investimento é elevado, mas, parece, que o retorno também. São momentos de convívio e comunicação formal/informal, que os colaboradores apreciam e memorizam.
Hoje, ainda não é claro o equilíbrio perfeito entre o trabalho presencial e remoto. Seguramente existem vários modelos, dependendo das organizações e sua cultura. Mas, sem dúvida, o modelo híbrido com momentos de socialização, formais e informais, é o caminho certo para uma maior felicidade organizacional.
A evolução do entendimento da felicidade organizacional como algo estratégico, teve um impacto positivo no nível de felicidade dos colaboradores e na rentabilidade das organizações. Esta evolução deveu-se às razões antes referidas, mas existem alguns aceleradores que merecem ser destacados:
- O trabalho remoto, forçado inicialmente pela pandemia do Covid 19. Contribui para uma maior conciliação entre trabalho / família / vida social, aumentado o bem-estar de quem trabalha. Hoje é fácil, e cada vez mais comum, trabalhar remotamente para uma organização em qualquer lugar do mundo. A competição por talento é maior, mais global e não é fácil para as empresas portuguesas competirem com os salários pagos por empresas sediadas em países mais ricos. Disponibilizar condições que permitam aos colaboradores serem felizes no trabalho é uma forma de os reter, muitas vezes com um salário menos competitivo;
- As gerações mais jovens. Quando comecei a trabalhar (tenho 60 anos) a visão era muito clara, se tiver uma boa carreira profissional terei uma boa vida. Hoje, as gerações mais jovens pensam, muito sensatamente, de forma diferente. Tenho de ter uma boa (feliz) vida. Para tal é necessário, naturalmente, trabalhar. No entanto, o trabalho é apenas uma das variáveis da minha vida, que deve contribuir para um todo. Não faz sentido abdicar da família, amigos, …, para me dedicar 100% a uma empresa. Esta geração espera ter condições de trabalho (cultura) que os ajude a ter uma vida feliz.
Conhecendo a forma de estar das gerações mais jovens e as novas realidades no mercado de trabalho, no estudo que realizámos em 2022 adicionámos a seguinte pergunta: O que gostaria de obter da sua empresa para ser mais feliz como profissional?
Através da análise às 1.600 respostas obtidas foram identificados alguns conceitos inovadores e houve um que se destacou: Gostava que a empresa me ajudasse a disfrutar da vida.
Este novo conceito, esperar que a empresa nos ajude a disfrutar a vida, é disruptivo e fascinante. Obriga as organizações a pensarem de forma totalmente diferente a gestão das pessoas, a saber como integrar o trabalho no todo da pessoa e a encontrar formas alternativas de reter os seus colaboradores. Ou seja, a contribuir para uma vida mais feliz.
O estudo da felicidade organizacional em Portugal tem sido uma jornada muito gratificante, mas, apenas tem valor quando é partilhado e pode contribuir para um maior bem-estar das pessoas e organizações. Para terminar, gostaria de partilhar alguns insights do estudo HW realizado este ano:
- 2023 foi o ano em que obtivemos mais respostas (7.000 profissionais) o que demonstra o interesse crescente sobre este tema;
- O estudo mantém a tendência dos últimos anos, com o nível de felicidade organizacional em 3,9 e setor de informação e comunicação como sendo o mais feliz e competitivo;
- As organizações devem prestar atenção ao que as diferentes idades procuram. Apenas desta forma vão conseguir captar e manter os seus colaboradores mais válidos. Quando perguntamos o que gostaria de ter da organização para melhor desfrutar a vida, a importância é diferente conforme a idade:

É relevante observar que o tempo é o fator mais desejado, mas diminui ao longo das idades. Quanto mais jovens mais importante é o fator tempo. Para os mais jovens, tempo e dinheiro é o mais importante. Não tendo, ainda família, procuram o sem bem estar pessoal, desfrutando o mais possível. Na medida em que vamos avançando na idade, temos família e alguma estabilidade financeira, procuramos conseguir um maior bem-estar familiar e estamos disponíveis para abdicar, um pouco, de tempo e dinheiro.
- Esta realidade, muito interessante, coloca um desafio difícil às organizações. Como conseguirem adaptar a sua cultura e benefícios às diferentes idades. Um desafio que obrigará a organizações mais flexíveis, com benefícios flexíveis e personalizados. O que origina uma maior complexidade na gestão dos colaboradores. Ou, organizações extremamente criativas, que de forma simples o consigam fazer. Estas, terão, seguramente, mais sucesso;
- Os momentos que os colaboradores recordam como sendo os mais felizes são a Relação com os colegas e hierarquia, a Socialização, Entreajuda entre colegas, Apoio dos colegas e chefe (47% do total das citações). De entre estes, o que mais cresceu nos dois últimos anos foi a Socialização (de 10,4% para 14,6%). Como já antes referido, os profissionais sentem a necessidade de ter momentos de socialização formais e informais com os colegas. A possibilidade de trabalho híbrido é fundamental, mas a necessidade de momentos presenciais de socialização, também. Este é um equilíbrio que as organizações têm de conseguir, também, de forma flexível e criativa.
Quando iniciámos, em 2011, o estudo da felicidade organizacional em Portugal, sabíamos bem como começar, mas não fazíamos ideia da sua importância para organizações. Ao fim destes 12 anos de investigação podemos afirmar, com evidencias, que a felicidade organizacional é uma ferramenta de gestão estratégica, pode ser medida, é monetizável e tem impacto na rentabilidade. Ou seja, que organizações mais felizes são mais sustentáveis!
Bibliografia
- Dutschke, G., Dias, A., Guillen, C. and Sánchez-Sevilla, S. (in press). Factors contributing for organizational happiness. European Journal of International Management. DOI: 10.1504/EJIM.2021.10037607
- Dutschke, G. e Dias, A. (2023). Felicidade Organizacional. RH Editora. Lisboa, Portugal.
- Dutschke, G., Jacobsohn, L., Dias, A. and Combadão, J. (2019). The job design happiness scale (JDHS). Journal of Organizational Change Management. Vol. 32 No. 7, pp. 709-724. https://doi.org/10.1108/JOCM-01-2018-0035.
- Gramaxo, P., Seabra, F., Abelha, M., & Dutschke, G. (2023). What Makes a School a Happy School? Parents’ Perspectives. Education Sciences, 13(4), 375. MDPI AG. http://dx.doi.org/10.3390/educsci13040375
- Silva, M.M. (2023). Remoto ou híbrido: de que forma os trabalhadores são mais felizes. Revista Exame, 470, Ed. Junho 2023.