A felicidade é um conceito que todos procuramos, sem exceção. Também no contexto empresarial esta é uma realidade que deve ser tida em conta. Não é de estranhar que o cargo de happiness manager esteja a ganhar protagonismo nos departamentos de recursos humanos. Mas a que se dedicam realmente estes profissionais? Qual é a sua função e porque é tão importante para as organizações? Fomos descobrir.
Para Tânia Santos, happiness manager da tecnológica Decode, o papel que desempenha passa por desenvolver um conjunto de estratégias e implementar um plano de ação dentro da empresa, que tem como objetivo aumentar o bem-estar e felicidade dos colaboradores. “Este plano de ação deverá ser pensado e desenvolvido de acordo com um conjunto variado de fatores como, por exemplo, as necessidades reais dos colaboradores, o seu perfil comportamental e a cultura da empresa. Tem de ser inclusivo, ou seja, ter atividades que acrescentam valor a todos os tipos de perfis e necessidades e, ao mesmo tempo, deve ser construtivo, dando a oportunidade a todos de trabalharem e apostarem no seu próprio desenvolvimento pessoal e profissional e saírem da sua zona de conforto, sem que se sintam obrigados a isso”, explica.
Na Zomato Portugal, a premissa base é conjugar o bem-estar e a realização profissional dos colaboradores com os objetivos e planos da empresa, refere a happiness manager Sara Fonseca. Para tal, a responsável, juntamente com os líderes de equipa, identifica, planeia e implementa iniciativas que têm como missão promover profissionais mais felizes, produtivos, eficientes, que obtenham melhores resultados e que estejam comprometidos com o seu crescimento profissional e com o da empresa: “Desde o acolhimento e integração de novos colaboradores, delineação da agenda de formação da equipa, implementação de medidas que visam uma melhor comunicação interna, ao reconhecimento dos melhores performers e à procura ativa de mais e melhores benefícios para a equipa, as tarefas e os objetivos de uma pessoa com esta função poderão ser tão relevantes e diversos quanto a capacidade e criatividade da pessoa que as executa.”
Criar um local de trabalho orientado para a felicidade – seja em casa, seja no escritório; promover o desenvolvimento profissional através de uma comunicação constante; reduzir o stress; atuar como um elo de ligação e comunicação; avaliar os resultados e o seu impacto (ROI da Felicidade); monitorizar os níveis de felicidade dos colaboradores através de ferramentas de feedback; e criar uma cultura de work life-balance são as principais tarefas elencadas por Rita Marques, happiness manager da Milestone, empresa de consultoria especializada na implementação de sistemas de informação de gestão, com dez anos de existência e mais de 130 colaboradores. “O meu maior desafio é, sem dúvida, olhar para um grupo de pessoas de gerações diferentes, necessidades diferentes, desejos diferentes e perceber como, de forma global e seguindo os objetivos e valores da empresa, conseguimos criar uma organização harmoniosa, feliz e produtiva”, nota.
No caso da Zomato Portugal – uma plataforma online e mobile para descobrir restaurantes de origem indiana e presente em Portugal desde abril de 2014 –, aquando da implementação da função de happiness manager, foi identificado que a maior fonte de descontentamento dos colaboradores estava relacionada com uma comunicação pouco clara e eficaz dentro da organização. “Para combater isso, delineámos um plano com diferentes iniciativas para melhorar de forma significativa a comunicação interna. Entre essas iniciativas, destaco a criação de um website para os colaboradores, aliado a uma newsletter mensal onde são partilhadas todas as novidades da empresa, desde o lançamento de novos produtos da marca, a textos de apresentação de novos colaboradores e à comunicação de resultados de cada departamento”, clarifica Sara Fonseca. Também neste âmbito, para uma melhor relação e comunicação entre departamentos, foi estruturado um esquema de partilha de informação, que garante que todos os colaboradores ficam por dentro do que vai impactar diretamente o seu trabalho.

E quais são os maiores desafios desta função? Tânia Santos acredita que é “o cargo em si é um enorme desafio”! “Apesar de ser algo recente e ainda pouco compreendido, surge com o objetivo de humanizar a gestão de recursos humanos e a forma como as empresas, principalmente os quadros de gestão e direção encaram as suas prioridades. Isto vai implicar uma mudança profunda de mindset e crenças, onde se prioriza as pessoas aos resultados e, como é normal, é um processo que requer paciência, tempo, ponderação e pode trazer ao de cima alguma frustração e ansiedade, pelo que sabermos gerir as nossas emoções e expetativas, bem como as dos outros, é fundamental”, clarifica.
Manter a felicidade em tempos de pandemia
Rita Marques salienta que o papel de happiness manager não é novo dentro de algumas organizações a nível mundial, mas concorda que Portugal está agora a dar os primeiros passos nesse sentido e que a pandemia da Covid-19 veio reforçar a importância desta função. “É necessário, senão fundamental, que dentro das organizações exista alguém que olhe de forma cirúrgica, madura, humana, para cada uma das pessoas que trabalham dentro da organização. É um olhar macro e micro ao mesmo tempo. Macro no sentido em que é necessário olhar para o comportamento geral da empresa, para a forma como as pessoas se movimentam, como se comportam e para a ligação entre elas e com a empresa. No caso micro é quando olhamos em particular para uma equipa, para um grupo ou mesmo para uma pessoa, de forma a perceber o que é melhor para ela e como a empresa, com as suas ferramentas, pode ajudar essa pessoa ou equipa a resolver uma questão ou criar mais empowerment”, sublinha.
“Teremos pessoas mais felizes e produtivas, empresas mais rentáveis e com novas formas de trabalhar. Acredito numa alteração laboral com mais colaboração, conexão e cooperação entre empresas e colaboradores. No final do dia, o que interessa a uma empresa é chegar aos seus objetivos e ao colaborador ter um trabalho ajustado à sua forma de vida” – Rita Marques (Milestone)
Sara Fonseca reitera que a função ganhou uma relevância acrescida no contexto que vivemos atualmente: “Um dos fatores que mais contribui para a felicidade dos colaboradores da Zomato Portugal é o bom ambiente, a equipa fantástica com que trabalhamos e os momentos que partilhamos. Assim que esta pandemia deixou de nos permitir estar perto, fisicamente, tivémos de criar mecanismos para essa distância não ser tão visível e impactante. Tem sido importante o desenvolvimento de iniciativas não só para a convivência entre a equipa, mas também para a motivação numa realidade que a maior parte de nós não conhecia – o trabalho remoto.” Segundo a responsável, a partilha de conhecimento e experiências entre colaboradores foi fundamental para o sucesso dos projetos que desenvolveram durante a fase mais restritiva da pandemia e para o bem-estar mental de toda a equipa.
De acordo com Tânia Santos, a pandemia veio apenas colocar um foco de luz em algo que há muito já era uma necessidade, mas que, por algum motivo e alguma resistência, poucos se atreviam a mudar. “A verdade é que a estratégia antiga não estava a resultar, e isso vê-se facilmente pelos níveis cada vez mais elevados de insatisfação, ansiedade e stress com que as pessoas vivem no seu dia a dia profissional. Finalmente, temos a grande oportunidade de optarmos e colocarmos em prática uma nova estratégia e fazer as coisas de forma diferente, onde o foco somos nós e não os resultados e o dinheiro”, reforça a happiness manager da Decode – que, com mais de 35 colaboradores, comemorou no passado mês de outubro um ano de existência.
“Está na altura de aprendermos e percebermos realmente o que nos faz feliz e nos motiva a nível profissional e pessoal, e uma das formas de o fazer, mas não a única claro, é através da criação deste cargo e de departamentos de bem-estar e felicidade nas empresas” – Tânia Santos (Decode)
Durante esta fase, a prioridade, na Milestone, passou por criar um espaço online onde se centralizada toda a comunicação interna da empresa. “Todos os projetos novos, algumas parcerias, comunicações e recomendações, resumidamente. Tínhamos de criar uma linha de comunicação direta, diária e atualizável.” Assim surgiu a Milestone INTRA, um espaço, com um layout simples e acessível a todos, que agrega a vida diária da empresa, nomeadamente, ofertas, parcerias, conversas com parceiros, dicas, entrevistas entre colaboradores, newsletters mensais, procedimentos internos, entre muitos outros temas. “O feedback que temos é que as pessoas sabem o que se passa na empresa, com quem devem falar e o que se passa de forma simples e transparente”, diz Rita Marques.
“Até ao momento foquei-me em desenvolver atividades que, por um lado, têm um impacto e ajudam a desenvolver e trabalhar cada um dos fatores que promovem o bem-estar – como, por exemplo, as relações, emoções positivas e os objetivos individuais – e que, por outro lado, ajudem os colaboradores a desenvolver um mindset positivo e construtivo, que agora, mais do que nunca, é extremamente necessário”, nota, por sua vez, Tânia Santos. Exemplos dessas atividades são os fun-times, os happy challenges, as sessões de meditação, o coaching e os brainstorm meetings. Desta forma foi possível à organização manter unida, produtiva e com boa comunicação uma equipa que foi afastada socialmente quando ainda estava numa fase muito recente de formação. “Conseguimos divertirmo-nos e conhecermo-nos mais uns aos outros, para além daquilo que somos e fazemos no nosso trabalho, e aprendermos com outros colegas skills técnicas. Ao mesmo tempo, principalmente através das sessões de coaching e do acompanhamento de carreira que é feito na Decode, vimos a maior parte dos nossos colaboradores a assumirem autorresponsabilização pelo seu crescimento, melhorarem competências e a saírem da sua zona de conforto, atingindo objetivos que há muito queriam atingir.”
“O bem-estar e felicidade de um colaborador é um trabalho que não depende só da empresa mas também do compromisso de cada um” – Sara Fonseca
Um dia de trabalho de uma happiness manager…

Tânia Santos, happiness manager da Decode
“É sempre uma autêntica caixa de surpresas, pelo que sermos facilmente adaptáveis e criativos é fundamental. O facto de estarmos a lidar com pessoas, e tudo o que elas englobam – emoções, crenças, padrões comportamentais, diferentes educações e culturas – faz com que tenhamos de estar constantemente atentos e prontos a alterar a nossa agenda e abertos ao improviso. Acredito que aqui o mais importante é, com isso em mente, criarmos uma ‘rotina’ muito própria que nos permita, por um lado, satisfazer essas necessidades, mas reservando algum tempo para nos podermos organizar, criar e prepararmo-nos para entrar em ação.
No meu caso, gosto de começar o dia por socializar e falar com o máximo de colegas possível, para perceber realmente como estão e se precisam de alguma coisa. Depois reservo algum tempo da tarde para reuniões, planeamento e atividades. Antes de terminar o dia de trabalho, organizo sempre o dia seguinte, marcando apenas o que é prioritário e urgente, deixando um bloco de tempo para imprevistos e surpresas.
O importante aqui é sermos nós a adaptarmo-nos ao que surge e às oportunidades de tempo que vamos tendo, em vez de querermos controlar e fazer essa gestão de forma fechada e de acordo com o que tínhamos planeado. Se fizermos isso irá certamente ser uma enorme fonte de stress que nos irá apenas afastar dos nossos objetivos.”
Sara Fonseca, happiness manager da Zomato Portugal

“Um dia como happiness manager é extremamente diverso e nem sempre fácil obedecer a uma agenda muito planeada. É uma função moldada por sentimentos e acontecimentos, que nem sempre se conseguem prever e podem alterar o percurso e projetos delineados.
No entanto, posso referir que a maior parte do tempo desta função é passado a ouvir todos os stakeholders, a recolher feedback e a conhecer cada vez melhor cada parte integrante, para assim adaptar o plano de trabalho às necessidades atuais e reais da equipa.”
Rita Marques, hapiness manager da Milestone

“Os dias são sempre muito variados, principalmente nesta altura de incerteza. Posso dizer que divido o meu dia em quatro partes:
- Análise. Ver as notícias e inteirar-me de como o mundo acordou, para perceber se as ações delineadas ainda estão dentro da realidade existente.
- Engagement e comunicação. Comunicar com os colaboradores, de forma geral ou particular. Tento medir a pulsação da equipa que cresce de forma muito sustentada.
- Planeamento. Nos anos anteriores, o que fazia era seguir um plano que tinha sido desenhado e aprovado. Falar com fornecedores e parceiros, preparar e promover eventos e iniciativas de interação corporativas. Hoje, penso nas iniciativas possíveis de fazer para este mês e para o próximo, sempre sem certezas. Este é, sem dúvida, o maior desafio que tenho em mãos. Preparar tudo de forma mais ágil, mas sem esquecer que comunicar é fundamental para quem está do outro lado. Desenvolvo ações nas áreas da comunicação interna, engagement e responsabilidade social e sustentabilidade.
- Inovação. Pesquisar o que se faz no mundo, webinares e talks sobre algum tema interessante, etc.”