Por Melvin Smith, professor de comportamento organizacional na Case Western; Ellen Van Oosten, professora adjunta de comportamento organizacional na Case Western; Richard E. Boyatzis professor nos departamentos de comportamento organizacional, psicologia e ciência cognitiva da Weatherhead School of Management e professor emérito da Case Western Reserve University.
Alguma vez respondeu a um colega ou subordinado de tal forma que fez o seu colega sentir-se menosprezado ou desvalorizado, mesmo inadvertidamente?
Talvez tenha oferecido uma solução arbitrária, e o que eles precisavam era de um ombro amigo.
Ou talvez tenha enfatizado prazos, compromissos relacionados a tarefas e responsabilidades no momento em que o que eles procuravam era compaixão e compreensão. Como gestor, é provável que já tenha passado por isso em alguma ocasião. Esse tipo de experiência tem maior probabilidade de ocorrer em períodos de crise, como aquele em que nos encontramos atualmente.
Vivemos tempos extremamente árduos. Estamos no meio de uma pandemia global com um número de infectados pelo coronavírus na casa dos milhões, e de mortos, nas centenas de milhares. Devido ao lockdown económico que se seguiu, muitas empresas estão a fechar as portas permanentemente. Os EUA estão a enfrentar níveis de desemprego não vistos desde a Grande Depressão. Além de tudo isto, as ruas estão cheias de manifestantes a pedir por justiça após outro homem negro desarmado, George Floyd, ter sido assassinado pelas mãos da polícia, algo visto na íntegra num chocante vídeo de nove minutos, que ficou conhecido em todo o mundo. Em tempos como este, os nossos funcionários também têm passado maus bocados. Eles estão stressados, com medo, e preocupados com a saúde. Eles temem pela capacidade de se sustentarem a si mesmos e às suas famílias. Num nível mais amplo, estão preocupados com a saúde atual e futura do seu país e do resto do mundo. Verdade seja dita, você provavelmente está a sentir alguns desses mesmos temores. No entanto, como gestor, é obrigado a seguir de cabeça erguida. É preciso gerir orçamentos, cumprir metas de vendas e tomar decisões difíceis para garantir a viabilidade da sua empresa.
É de grande importância atender às necessidades, medos e inquietações dos seus funcionários. Também é vital que resolva problemas urgentes e tome decisões críticas e necessárias para a continuidade dos negócios. O problema é que essas duas coisas exigem que ativemos diferentes partes do nosso cérebro. E, às vezes, podemos ficar presos, seja numa parte da nossa rede cerebral que permite a atenção focada na tarefa necessária para resolver problemas, seja na outra parte ligada à reflexão, à compaixão e à conexão social.
Entretanto, para sermos mais eficientes ao liderar e realmente ajudar os nossos funcionários, precisamos de ambas as redes. Precisamos de entender essas pessoas e conhecer as suas dificuldades específicas, e também relacionar-nos com os seus sentimentos e estados emocionais. Precisamos formar e confirmar as nossas ideias sobre as suas perspetivas, além de estarmos abertos para ouvir e perceber o que eles ouvem, veem e sentem. Felizmente, podemos recorrer a pesquisas recentes para descobrir como essas duas redes funcionam no nosso cérebro, e como nos tornarmos mais hábeis ao equilibrar esses dois lados.
Insights de estudos recentes com neuroimagem
A pesquisa do nosso colega, o professor Anthony Jack, da Case Western Reserve University, descreve duas das principais redes neurais atuantes no nosso cérebro como a rede analítica (RA), ou, tecnicamente, a rede voltada a tarefas; e a rede empática (RE), também conhecida como rede de modo padrão.
A RA ajuda-nos a entender as coisas e os acontecimentos. Ela é utilizada quando resolvemos problemas e tomamos decisões e ajuda-nos quando lidamos com pensamentos abstratos ou analíticos, como análise financeira e análise de dados. A EN permite-nos realizar uma varredura no ambiente e ficar abertos a novas ideias e pessoas diferentes. O que é bastante interessante é que essas duas redes se opõem. Mais especificamente, na verdade, elas anulam-se mutuamente. Quando uma entra em ação, a outra é desativada.
O professor Jack chama essas duas redes de pólos opostos da razão. Ambas envolvem atividade cognitiva, ambas envolvem pensamento rápido e lento, ambas envolvem a razão. No entanto, o raciocínio da RA refere-se mais a informações e análises e o raciocínio da RE refere-se a pessoas ou observações qualitativas. Como também discutimos no nosso livro, “Helping people change“, precisamos de ambas as redes. Afirmamos, ainda, que os líderes mais eficientes de facto usam as duas e são capazes de alternar entre elas em frações de segundos. Também acreditamos que a facilidade com que uma pessoa é capaz de ativar ou alternar entre essas redes depende em parte do seu autoconhecimento, prática intencional e decisão consciente.
Como alcançar o equilíbrio certo
Esteja ciente da sua própria predileção. Qual é a sua rede neural “preferencial”?
Ter ciência da sua rede neural dominante, ou a mais provável de ser ativada em situações diversas, requer a prática de mindfulness. Precisa de estar extremamente atento à experiência momentânea. Pode-se perguntar:
Como estou a processar as coisas neste momento? Estou a pensar em factos, detalhes e soluções concretas, ou estou a refletir de forma mais aberta e criativa sobre as possibilidades? Estou a pensar no que é objetivamente certo ou errado, ou estou a avaliar os méritos relativos ao que parece correto ou moralmente justo?
Que tipos de situações ou atividades tendem a atrair-me para a rede analítica? Quando é que tenho maior propensão a ser atraído para a rede empática?
Em geral, passo mais tempo na rede analítica ou na rede empática?
Exercite a rede neural que não é a preferencial.
Existem várias maneiras de exercitar os “músculos” das redes neurais empática e analítica. Uma abordagem útil é gastar mais tempo exercitando a rede menos utilizada. É algo parecido com a vantagem de um jogador de basquetebol destro que treina dribles e arremessos com a mão esquerda para melhorar a sua habilidade de modo geral.
Para exercitar sua rede empática:
- Conclua pelo menos uma conversa de 15 minutos todos os dias em que o seu único objetivo é entender o outro, não resolver um problema ou dar conselhos.
- Quando estiver a ouvir alguém, pare o que estiver a fazer ou pensar e tente devotar toda a sua atenção a essa pessoa. Tente ouvir além do que se apresenta, sintonizando a imagem completa do que ouve e vê (por exemplo, a linguagem corporal, o tom de voz, sinais emocionais etc.).
- Se acha que há algo que sabe com relativa certeza, esforce-se em questionar essa premissa e considerar outras possibilidades.
Para exercitar sua rede analítica:
- Programe janelas de tempo específicas para concluir determinadas tarefas. Comprometa-se com essas janelas programadas, mesmo que elas não sejam irrevogáveis.
- Identifique uma situação no trabalho que exija uma nova abordagem para chegar a um resultado positivo. Pode ser uma alteração num contrato de fornecedor existente. Antes de recorrer à perspectiva dos outros, pesquise um pouco. Elabore perguntas que precisam de resposta. Liste dois a três novos recursos nos quais você normalmente não pensaria, incluindo pessoas. Anote os prós e contras de cada recurso, considerando o custo de cada um e as suas possíveis contribuições. Conecte as suas anotações num esquema referencial para o ajudar a seguir em frente.
- Compile uma lista de despesas mensais internas, como gastos com serviços. Registe as suas despesas reais pagas nos últimos 12 meses. Quais são as tendências que os números revelam? Qual foi o valor mais alto ou mais baixo pago e em qual mês? Como é que as despesas se comparam à sua previsão?
Exercite o equilíbrio entre as redes.
Depois de dominar a habilidade de estar mais consciente de quando está a atuar na rede analítica ou na empática a qualquer momento e tiver desenvolvido a capacidade de ativar qualquer uma delas quando quiser, estará pronto para praticar o equilíbrio eficaz entre as duas. Novamente, ambas as redes são importantes. O seu objetivo nesse ponto é desenvolver a capacidade de alternar facilmente entre elas, conforme necessário. Entre as práticas que pode executar para exercitar a sua capacidade de alternar entre as duas redes estão:
Tenha clareza sobre a sua intenção. Às vezes podemos estar cientes da necessidade de alternar de uma rede para outra, mas conscientemente opte por não fazê-lo. Em outras palavras, às vezes não é uma questão de habilidade, mas de motivação.
Ao tomar (ou comunicar) uma decisão que afeta outras pessoas, pense nas possíveis implicações pessoais dessa decisão. Reserve um tempo para cuidar desses aspectos relacionais, além dos técnicos.
As redes analítica e empática estão a travar uma batalha constante no seu cérebro. Quando uma entra em ação, a outra é desativada. No entanto, não precisa de escolher um lado. Não é que uma seja boa e a outra má. Você realmente precisa das duas. O segredo para maximizar a sua eficácia como líder e ter relacionamentos mais produtivos é aprender a saber qual rede é ativada em determinados momentos e ser capaz de alternar organicamente entre as duas conforme necessário.
[Artigo publicado anteriormente na Harvard Business Review Brasil]