Por: Maria João Antunes, consultora sénior de RH, talent advisor, coach e mentora
e Guilhermina Vaz Monteiro, diretora geral da Lukkap
Chegar à faixa etária dos “entas” sem ter um trabalho é um novo grande desafio! But “the sky is the limit”.
Tem-se vivido, desde há uns anos, uma forte discriminação no mercado de trabalho para os profissionais seniores, quer pela idade, quer pela senioridade profissional. Esta situação ter-se-á começado a sentir quando a crise económica nos bateu à porta, iniciando-se uma onda de reestruturações, fusões ou iberizações, como revelam abaixo os dados, em que os profissionais mais caros e os mais velhos começaram a ser dispensados, inseridos nos despedimentos coletivos ou por negociações individuais, independentemente das suas valências ou comprometimento com a empresa.
Os despedimentos coletivos em Portugal atingiram o seu pico em 2012, durante a intervenção da troika, afetando 10.488 trabalhadores, no âmbito de 1.269 processos comunicados, maioritariamente por empresas de menor dimensão. Nos oito primeiros meses de 2017, quase 2500 trabalhadores perderam o emprego, devido a 257 despedimentos coletivos, mais de metade dos quais na região de Lisboa e Vale do Tejo, segundo dados do Ministério do Trabalho.
Com a revolução digital e as novas gerações este problema agudizou-se, criando-se na sociedade portuguesa este preconceito, desenvolvendo vários problemas, financeiros, de autoestima e até situações de depressão a largas centenas de profissionais. Os motivos apontados pelos decisores devem-se, em grande parte, a questões de remuneração, adaptação às novas tecnologias, resistência à mudança e falta de talento na função que ocupam.
As empresas procuram hoje profissionais jovens, talentosos, com experiência, oferecendo uma retribuição quase ao nível do salário de um estagiário em muitas circunstâncias. Como existe desemprego também nos jovens, estes aceitam por vezes funções para as quais não estão ainda devidamente preparados, bem como desempregados com experiências sólidas aceitam salários indignos para funções de responsabilidade, porque precisam de rendimento familiar.
Diria que, hoje, vamos observando duas grandes preocupações na vida da gestão das pessoas em Portugal: a digitalização e o talento das novas gerações e muito bem, porque o talento jovem é precioso nas empresas, pois todos sabemos que o mundo está hoje digital e ficará ainda mais amanhã. Mas terá o talento parado nos trinta? Será que a sabedoria e a experiência não valorizam os profissionais? De facto (elas) são relevantes para se ser Presidente da República, Papa ou até os médicos mais velhos, por norma, são os mais procurados, porque criaram notoriedade pela sua experiência e os doentes sentem neles maior confiança para os tratar.
Importa refletir se as pessoas com 40 ou mais de 50 anos não conseguem ser dinâmicas, alegres, produtivas, inteligentes e atualizadas. A verdade é que se criaram mitos de que estes profissionais já não são capazes, são menos rápidos, apresentam dificuldades com as tecnologias e são resistentes à mudança.
Foram realizados estudos organizacionais que revelam que os mais velhos criam um maior comprometimento às empresas, no entanto, são dispensados porque são os mais caros, mesmo que desenvolvam uma performance elevada. Esta crise geracional teria sido evitada se tivessem existido soluções respeitosas, inteligentes e de cidadania para estas faixas etárias. Uma gestão eficiente das pessoas nas organizações teria passado pela formação profissional adequada, sensibilização dos avanços e da necessidade de adaptação, passando por renegociação das condições caso se justificasse. Profissionais desatentos e desinteressados existem em todas as idades.
Talvez o meio-termo fosse o ideal, as gerações ensinam e formam-se reciprocamente, numa partilha saudável e profícua. A idade da reforma em Portugal passa este ano para 66 anos e 4 meses. Pergunta-se, atendendo a este cenário, o que fazem as pessoas até à idade da reforma já que o tecido empresarial não parece estar alinhado com o governo? Estamos perante um grande paradoxo que parece não preocupar ninguém.
É de facto de lamentar esta discriminação e como se deixam perder competências, vivências e sabedoria que poderiam ajudar a catapultar o sucesso das organizações e atravessar crises com maior sucesso. Haveria certamente lugar para todas as gerações competentes, com uma liderança inteligente e eficaz e não colocando apenas o foco no resultado financeiro a curto prazo.
Mas para a geração “entas” que fica sem emprego e numa situação mais fragilizada, não são só as empresas que lhes fecham as portas. Também ex-colegas deixam de ser tão atentos, consultores ou fornecedores que até então lhes foram tão solícitos e solidários de repente também deixam de o ser. Existem exceções de ambos os lados, mas não deixa de ser uma realidade para estes profissionais.
Felizmente ainda existem em Portugal empresas que apresentam preocupações com este problema social pelo que importa salientar o relevante trabalho que a Sonae está a levar a cabo neste âmbito com dois grandes projetos. O Advantage surge de uma parceria com a Faculdade de Psicologia e de Ciências de Educação da Universidade do Porto e IUL Global – ISCTE Knowledge Agency. Trata-se de um conceito de intervenção que visa apoiar as empresas no desenvolvimento e implementação de uma gestão sustentada, proativa e potenciadora da diversidade etária, dando resposta às alterações demográficas e capitalizando o potencial da cooperação entre colaboradores de diferentes idades. Focaliza-se na preparação das organizações para acompanhar o ciclo de vida das suas pessoas, resultando numa advantage para a empresa e colaboradores.
O outro projeto não menos importante e dirigido apenas para a Sonae Modelo Continente, denomina-se Desafia.te e foi desenvolvido em parceria com a Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto. Este projeto de inovação social tem como objetivo reconverter profissionalmente colaboradores da logística que convivem com restrições médicas provocadas pelo desgaste da experiência profissional e problemas de saúde adquiridos. O pressuposto está no desenho de soluções de médio-longo prazo, com impactos imediatos e preparando o futuro. As soluções que têm vindo a ser trabalhadas abrangem um leque de opções tão diferenciadas e diversas como a população que o projeto está a abordar. Os colaboradores são acompanhados por uma equipa multidisciplinar ao longo da sua reconversão, de forma integrada e são desafiados a desenvolverem outra função, saindo da sua zona de conforto, mas garantindo o seu meio de sustento.
Fica o desafio para quem almeje desenvolver algum programa desta natureza.
Impõe-se sensibilizar quem pretende hoje mudar de empresa nestas faixas etárias, porque as portas fecham-se quer fique no desemprego, quer esteja empregado e queira sair sem ser convidado para um novo desafio. Esta é a realidade de Portugal que temos que enfrentar de cabeça erguida, espírito empreendedor e arriscar numa nova etapa da vida, quiçá numa área bem diferente da que foi desempenhada durante anos. É fundamental deixar os preconceitos para trás e encarar de forma positiva o que a sociedade nos proporciona.
Determinante também é estar atento à evolução de novas tendências, apostar na formação profissional e para quem não tem uma bolsa folgada, vão decorrendo ao longo do ano, alguns seminários e workshops grátis, é só estar atento! Existem instituições de formação prestigiadas em Portugal que ministram cursos para desempregados, mas não só, alguns deles subsidiados. É sempre altura de se voltar a estudar ou até investir um pouco mais numa pós-graduação ou num mestrado, algo que provavelmente gostaria de ter feito, mas a vida profissional não deixou tempo.
O Google e a Wikipédia proporcionam também uma panóplia de conhecimentos totalmente grátis.
Uma outra solução pode passar por apostar na sua própria autonomia e trabalhar como freelancer, criar uma empresa ou mudar mesmo de ramo. A emigração também pode ser um outro percurso a seguir. Temos boas experiências de pessoas que vingaram perante uma situação adversa na vida profissional. Em qualquer das situações investir na networking é fundamental.
Uma estatística realizada nos Estados Unidos previu que, em 2020, 43% dos trabalhadores americanos serão independentes. Pois bem, vamos também acreditar que poderá ser um bom caminho para Portugal, uma vez que cerca de 50% da população ativa tem mais de 40 anos. Ainda se pode fazer muito e essa é a boa notícia!
Artigo in RHmagazine, n.º 113, novembro/dezembro 2017
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