Joana Russinho
Senior manager, Consulting FS
Samuel Gonçalves
Manager, Consulting FS
Um conjunto de forças disruptivas está a mudar drasticamente a forma como vivemos e trabalhamos, criando um imperativo para as empresas se adaptarem rapidamente. Mas há várias áreas em que o ritmo da mudança ainda não alcançou as novas realidades do negócio. Os diretores de RH e suas equipas devem assumir a liderança com agilidade e sustentar a criação de valor para o futuro dos recursos humanos.
Apesar de todos os sinais óbvios de mudança e disrupção associados ao mundo do trabalho, ainda existem organizações que não estão a conseguir acompanhar o ritmo desta mudança. Não se trata de ineficiência, mas de desconhecimento sobre como agir e onde atuar.
Perante este contexto, e porque falamos de pessoas na essência do que a uma mudança desta natureza diz respeito, existe uma pergunta que os diretores de recursos humanos devem começar por responder: De que forma é que esta mudança vai afetar o mundo do trabalho, e de que forma a direção de recursos humanos pode ter um papel de liderança nesta transformação?
Este é o momento em que os diretores de recursos humanos podem e devem assumir um lugar na liderança do negócio, participando na construção de soluções para promover a agilidade, redefinindo estratégias para atrair, desenvolver e reter colaboradores, numa época onde escasseia o talento e o compromisso é cada vez mais volátil. Urge definir estratégias de capacitação e reconversão de colaboradores para novas áreas de conhecimento.
Que futuros estão a mudar? 3 forças da mudança
O Futuro das organizações: a duração média das organizações do S&P 500 é agora de apenas 15 anos, por via do surgimento de novos negócios potenciados pelas novas tecnologias e pela crescente capacidade para trabalhar a informação, o que cria uma pressão constante pela subsistência (criativa) em quem gere o negócio, uma necessidade de reinvenção em tempo real para fazer face às exigências dos investidores, clientes e colaboradores.
O Futuro da força de trabalho: onde a duração de uma carreira aumenta até aos 50 anos, ao mesmo tempo que a vida média das competências baixa para dois a cinco anos e surgem no mercado novas formas de vínculos laborais. Estima-se que em 2020, cerca de 40% das pessoas no ativo tenham vínculos de trabalho não convencionais, o que desafia os líderes a pensar na melhor forma de interagir com os colaboradores, e a estes os coloca a questionar sobre a gestão das suas carreiras – ou do seu presente.
O Futuro de como o trabalho é feito: onde o digital altera profundamente a forma como se colabora e interage, criando novas formas de trabalhar e funções ainda não imagináveis, reforçando os desafios acima referidos.
O futuro da gestão de pessoas é digital…
Já todos ouvimos dizer e o futuro é digital – expressão na ordem do dia –, mas é importante esclarecer que as organizações não podem encarar esta necessidade de “ser digital” como apenas uma questão que passa por ter mais tecnologia, ou uma maior diversificação de soluções de última geração, ou colaboradores mais informados e conhecedores destas tecnologias/ soluções.
“Ser Digital” vai muito para além disto. Há que entender que existe uma grande diferença entre dispor de tecnologia, conhecê-la e saber utilizá-la, e “Ser Digital”.
As organizações digitais quebram silos enquanto orquestram equipas multidisciplinares para um mesmo propósito; são ágeis porque respondem em tempo real aos desafios que se lhes colocam; operam em rede e fomentam a colaboração ao reconhecer que só assim se subsiste com sucesso.
As organizações digitais estão predispostas a falhar e a (re)aprender ainda de forma mais rápida, porque compreendem que este modus operandis, que as obriga a uma adaptação permanente, é uma das naturais chaves de sucesso num mercado que testa (novas) soluções diariamente. As organizações digitais procuram colaboradores que saibam operacionalizar a inteligência artificial, com inteligência emocional, e que as consigam incorporar na forma de trabalhar em ecossistema.
… e requer novas competências
As qualificações e competências profissionais estão em constante evolução na medida em que as organizações vão incorporando, de forma mais ou menos célere, o avanço tecnológico nos seus processos. No entanto, numa época onde este avanço se torna exponencial e as organizações lutam para alcançar a maturidade digital e manter o seu negócio relevante, cabe também aos recursos humanos (re)definir os mecanismos que permitam, não só identificar as competências relevantes para o futuro, como também promover o desenvolvimento e reconversão das competências dos colaboradores.
Outro aspeto importante tem a ver com o ADN das áreas de recursos humanos. Conforme temos podido constatar ao longo das últimas edições do Human Capital Trends, estudo realizado anualmente pela Deloitte, e onde Portugal não é uma exceção, as áreas de recursos humanos têm crescido continuamente e formam, cada vez mais, parte integrante na resolução de desafios de negócio, e no acompanhamento do mesmo, ao lado do centro de decisão.
Os líderes já assumiram que os recursos humanos têm um papel importante no processo de digitalização, na promoção da agilidade, colaboração e disrupção. Agora importa também que as áreas de recursos humanos se saibam posicionar e façam o seu trabalho de casa, começando por se reinventar, renovando competências e instituindo novas formas de trabalhar, preparando-se para liderar esta transformação na organização.
Um novo foco
Os colaboradores percebem que o mundo está a mudar e os recursos humanos precisam de se focar nessa mudança para os poder direcionar. É importante conhecer os colaboradores, as suas motivações, perceber quais os seus receios e indicar soluções que lhes sejam relevantes.
Vários estudos revelam que a maior parte das pessoas consideram não ter as competências necessárias para o mercado de trabalho digital. Mas que competências são estas? As áreas de recursos humanos necessitam indicar estas respostas, tendo claro que a solução não será linear. Para responder a este, e a outros desafios do futuro, importa instituir uma cultura assente na aprendizagem interativa, baseada na experiência e na aprendizagem com o erro, e acima de tudo presente no dia a dia de quem faz acontecer.
Um novo modelo de organização…
O termo recursos humanos está a ser progressivamente substituído por outras variantes que fazem sobressair a importância da vertente humana, deixando cair o termo “recursos”. Esta mudança embora seja importante, não é suficiente.
O futuro requer que se reimagine a forma como o trabalho é feito. Este reposicionamento dos recursos humanos deve ser acompanhado de um novo modelo operacional assente na construção de redes de equipas, que ao juntar pessoas com diferentes backgrounds, e competências, crie as condições para promover a colaboração e fomentar a agilidade, bem como o tempo de resposta às céleres imposições que o novo ritmo de trabalho incute.
… e também novas tecnologias
Algumas organizações já abriram caminho e adotaram novas plataformas tecnológicas, que transformam a forma como os colaboradores vivem e interagem com os processos de recursos humanos. Mas há muito mais por descobrir, a robótica e a realidade virtual prometem revolucionar a forma como se opera e colabora nas organizações. Nesta digitalização dos recursos humanos, importa ter uma visão holística do landscape aplicacional, por forma a criar um ambiente que faça sentido e promova o engagement dos colaboradores, evitando cair na tentação de construir uma colcha de retalhos de soluções, que embora seja assente na instalação de soluções individualmente inovadoras, comprometem no seu todo a operacionalidade e engagement com os colaboradores.
Conclusão
A mudança gera incertezas e raramente há, se é que há, uma solução única e direta para ir do presente ao futuro num ápice. Cada organização parte de um ponto diferente e deverá construir o seu próprio “futuro bem-sucedido”, o caminho será feito agilmente enquanto se testam soluções, reinventado as formas de posicionamento e colaboração, demonstrando predisposição para errar, bem como uma maior capacidade para (re)aprender e redefinir objetivos caso seja necessário. Afinal é disto que se trata quando se fala em “Ser Digital”.