Na Adecco Portugal, o que é que perspetivam para o mercado do recrutamento nos próximos meses?
Como temos três unidades de negócio diferentes, as realidades também não serão as mesmas em cada uma das áreas. O outsourcing e o trabalho temporário ajudam muitas empresas em termos de flexibilidade e, muitas vezes, quando estas estão com receio do futuro, utilizam essas metodologias, justamente, pela sua componente flexível. Por isso, em momentos de crise, estas áreas de negócio podem até crescer – ainda que setores, como o industrial, possam experimentar um decréscimo, por estarem mais expostos à crise energética.
Atualmente, no que respeita aos nossos principais clientes, não sentimos, ainda, nenhum abrandamento, nem nas duas áreas mencionadas, nem na de recrutamento e seleção especializados.
Continuamos a crescer bastante, mas estamos, como todas as empresas, a tentar ser prudentes, face à desaceleração na economia.
Tem aumentado o fator “incerteza”, e estamos alerta, definindo planos A, B e C – neste momento, qualquer empresa cliente tem o budget 1, 2 e 3, dependendo do que vai acontecer ao mercado. O que esperamos que não aconteça é que as empresas comecem já a fazer reduções, quando ainda não chegou esse abrandamento, pelo menos, na Adecco e seus clientes. Estamos num momento muito interessante, porque fizemos, este ano, em Portugal, um plano de investimento, e crescemos 25%. Foi o ano em que investimos mais, dos últimos cinco.
E investiram em quê, concretamente?
Contratámos cerca de 80 FTE (Full-Time Employees) para as unidades de trabalho temporário, outsourcing especializado – especialmente, para as áreas de sales & marketing e indústria logística – e recrutamento e seleção especializado, também para sales & marketing e áreas de TI. Com Portugal a ser eleito para este plano de investimento, apostámos em profissionais altamente especializados, o que nos permitiu crescer os tais 25%.
Têm notado o retorno desse investimento?
Sim. Começámos no segundo trimestre do ano a fazer o plano de investimento e, no terceiro, já conseguimos ter o payback desse investimento. Foi rápido, porque também existiu um estado de animação pós-Covid muito grande. Depois do primeiro trimestre, começámos a ter um pico de pedidos – uma média de 1.300 pedidos por semana, que nunca tínhamos tido.
Houve um recorde de colocação de pessoas em todas as áreas de negócio.
Em muitas startups tem havido alguma retração nas funções tecnológicas – antes, tão procuradas e difíceis de encontrar –, por falta de verba, fruto dos aumentos das taxas de financiamento. A vossa experiência confirma- o?
Ainda não sentimos essa retração, mas está efetivamente a acontecer em algumas startups e até em grandes multinacionais – como foi o caso da Microsoft, que anunciou, há relativamente pouco tempo, o despedimento de profissionais na área de TI. Na Adecco, sentimos que continua a ser um mercado muito dinâmico, dado que um profissional de tecnologias em Portugal pode vir de qualquer país do mundo. Há essa competitividade, a nível mundial, e continuamos a ter muitos bons profissionais, o que nos permite – e aos nossos clientes – ainda não sentir esse abrandamento.
Sentem que o mercado de recrutamento e seleção já é um mercado mundial, e trabalham-no dessa forma?
Em determinadas funções, o mercado é completamente internacional. Como vantagem de sermos uma multinacional, temos acesso, em base de dados, a candidatos de vários pontos do mundo, como Brasil, França, Itália, Espanha, que são países onde nos movemos mais. Seja nas áreas de shared service center – nas quais temos bastantes clientes –, seja em finance, RH, apoio ao cliente, as línguas e a especialização são fundamentais a nível de experiência, e não nos focamos na nacionalidade do candidato. O oposto também se verifica: principalmente Espanha recorre bastante a candidatos portugueses – profissionais a quem não pedem uma nacionalidade específica, mas sim uma determinada experiência e idiomas… competência em que somos bastante bons. Designadamente em tecnologias e, sobretudo, em remote, o talento português, cada vez mais, trabalha para outros mercados.
E isso não eleva os vencimentos, podendo trazer um problema de equidade para os portugueses?
Claramente. Tivemos o caso de uma multinacional francesa que estava à procura de profissionais, tanto em Espanha como Portugal, e, pelo facto de os salários serem mais baixos em Portugal, pensou que o vencimento poderia ser 30% mais baixo. Dissemos que não é assim que funciona, até porque eram posições em IT e algumas em full remote. Realizámos, posteriormente, um estudo específico para esse cliente e vimos que os salários que está a praticar, quer em Espanha, quer em Portugal, nesta área de TI, são iguais. Por um lado, é bom, porque não existe diferenciação e os nossos profissionais são cotados como qualquer outro; por outro lado, torna-se muito difícil para as empresas portuguesas serem competitivas para estes candidatos.
Como precisam tanto de alguns perfis, algumas empresas estão a oferecer, àqueles que chegam, vencimentos superiores aos dos atuais talentos. O que recomendaria a uma empresa para evitar este tipo de problemas de equidade?
O que estamos a fazer internamente – e a indicar aos nossos clientes – é a desenvolver melhor a career path de cada área, com mais níveis de senioridade e de performance, para que cada profissional possa ir ascendendo aos mesmos níveis daqueles que vão entrando. Se uma empresa tem uma pessoa com 10 anos de experiência e vai buscar outra com menos experiência, oferecendo-lhe um salário mais elevado, isso vai gerar um clima de desconfiança e desconforto, levando a primeira a querer sair. Permitir que as pessoas cresçam mais rápido, dar-lhes outros projetos e fazer swap de funções entre áreas possibilita, pelo menos, minimizar esse risco.
Há, cada vez mais, uma pressão das empresas para que as pessoas regressem ao escritório e uma pressão dos colaboradores pelo teletrabalho. Como têm vivido isto?
O que estamos a adotar, neste momento, é um regime híbrido: dependendo das funções, as pessoas podem ter um, dois ou três dias de teletrabalho por semana – na sede, temos dois dias de teletrabalho nas áreas de operações e nas agências mais pequenas, onde há menos pessoas, temos apenas um dia, havendo sempre flexibilidade horária. Não acredito, de todo, no regime de voltar a 100% ao escritório, porque as pessoas demonstraram que são capazes de ser produtivas e que se pode confiar nelas. Há que haver flexibilidade, dependente do setor de atividade e da função.
Nas vossas áreas de atividade, quais os principais desafios para os próximos anos?
Os principais desafios para a área de trabalho temporário, sem dúvida, prendem-se com a escassez de candidatos. Na área do turismo, por exemplo, temos uma escassez de perfis tão grande que demoramos muito mais tempo na atração de candidatos do que na componente de gestão de clientes. Basicamente, hoje em dia, quem tem o candidato é rei. É verdade que esta é uma vantagem competitiva para a Adecco, que sempre ganhou todos os prémios de quem melhor serve e, ao nível de Portal da Queixa, é considerada a melhor empresa de trabalho temporário do país.
Os candidatos sentem que somos o seu career adviser, porque acompanhamo-los em toda a sua carreira – podem começar com um projeto de trabalho temporário e passar, posteriormente, para um projeto permanente, seja através do recrutamento e seleção especializados ou de outsourcing.
Estamos a focar-nos muito na career journey dos candidatos, para minimizar esta escassez.
O trabalho temporário é uma ótima ferramenta ao nível da flexibilidade, e o outsourcing também, porque, normalmente, as empresas fazem outsourcing daquilo que não é core das suas áreas de negócio e, assim, o que passa para nós é o risco, já que somos nós que temos de medir a produtividade. É uma área que também está a crescer bastante.
Por sua vez, no recrutamento e seleção especializados sentimos que o mercado ainda está muito dinâmico, devido a esta escassez de talentos e à grande rotatividade. Claro que, quanto mais se sentir a crise, mais os candidatos começam a pensar duas vezes antes de mudar de emprego, porém acreditamos que esta área de recrutamento não vai ser muito melindrada com isso, pois vai continuar a existir uma grande escassez de perfis.
O que tem sido desenvolvido pela Adecco na área da responsabilidade social?
Temos diversas iniciativas locais e internacionais. Através do nosso programa “Win 4 Youth”, por exemplo, para além dos nossos colaboradores poderem contribuir com a prática de exercício físico que é revertida em euros para instituições de solidariedade, temos ajudado bastantes associações apadrinhadas – a nível mundial, trabalhamos com a Cruz Vermelha e, a nível local, colaboramos com instituições como a Associação Mão Amiga, o IPO, a Associação Salvador… Globalmente, temos a Fundação Adecco, que tem o compromisso total com os CEO de grandes empresas pela responsabilidade social, diversidade e inclusão.
Entrevista publicada na edição n.º 143 da RHmagazine, referente aos meses de novembro/dezembro de 2022.
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