Os planos de remuneração flexível estão a tornar-se cada vez mais relevantes na atual conjuntura económica. Se um salário base competitivo é o ponto de partida para tornar uma oferta de trabalho atraente, um pacote de benefícios personalizado é o complemento decisivo para motivar, envolver e reter os colaboradores numa organização.
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salário monetário e o chamado “salário emocional” – onde entram os benefícios flexíveis – são duas das alavancas que as empresas possuem para melhorar a experiência do colaborador e atrair e reter talentos.
A pandemia e a consequente mudança de hábitos dos trabalhadores, nomeadamente no que ao teletrabalho e à flexibilidade de horário laboral diz respeito, levou a uma evolução das políticas de remuneração flexível. Com a crise sanitária, surgiram novos benefícios, tais como o pagamento de despesas de teletrabalho e de plataformas como a Netflix; outros foram adaptados, como a conversão da formação presencial em formação online e os treinos virtuais em ginásios; por outro lado, outros benefícios viram a sua utilização diminuída, caso dos vales de refeição e dos passes para transportes públicos, já que o número de viagens para o escritório diminuiu face às modalidades de trabalho remoto e híbrido adotadas por grande parte das empresas.
Os programas de compensação flexível tornaram-se elementos diferenciadores entre empresas na luta pelo talento e o compromisso com o salário emocional estendeu-se a muitas organizações que ainda não o ofereciam, tornando-as marcas empregadoras de referência.
A aplicação de políticas de remuneração normalizadas, em que a todos os colaboradores é atribuído um determinado pacote homogéneo de benefícios, já não funciona, especialmente se considerarmos que existem até cinco gerações diferentes a trabalhar numa mesma organização, com diferentes interesses e necessidades.
O futuro da compensação caminha, então, inexoravelmente, para políticas de remuneração personalizadas, segmentadas, que permitem aos trabalhadores escolher entre os diferentes benefícios disponibilizados pela empresa, de acordo com as suas preferências. Estes modelos são uma ferramenta-chave para as empresas garantirem o bem-estar dos seus talentos, numa altura em que o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, o direito à desconexão e a flexibilidade são um compromisso claro.
Plano de compensação passo a passo
A fim de oferecerem estes programas aos seus empregados, as empresas precisam de estabelecer um plano de remuneração flexível. Na fase de pré-implementação, é fundamental que as empresas conheçam os seus colaboradores e as suas necessidades, com base na sua situação e estilo de vida, – idade, género, antiguidade, categoria hierárquica, qualificações, etc. Tal irá ajudar as empresas a definir corretamente o programa e, subsequentemente, a medir o impacto da sua implementação, através de ferramentas de monitorização, como surveys anuais ou pulse surveys regulares. Uma vez estabelecido o plano, é essencial que o departamento de recursos humanos comunique e promova a iniciativa, permitindo a cada empregado decidir livremente a melhor forma de distribuir a sua remuneração com base nas suas necessidades.
Os modelos de remuneração tradicionais e rígidos perderam o seu valor; cada pessoa é única e vive realidades diferentes, por isso será um fator de atratividade permitir-lhe customizar a sua experiência, considerando que “one size does not fit all”. Agora, mais do que nunca, as empresas precisam de poder oferecer aos seus empregados a possibilidade de personalizar o pacote remuneratório, de modo a poderem escolher como querem ser recompensados, com base no momento da sua vida.
Quem tem isto em conta na sua atuação é a Sociedade Central de Cervejas e Bebidas, como diz à RHmagazine, Rui Português, Total Rewards Manager da empresa: “a implementação de uma política de benefícios flexíveis na companhia veio reconhecer a diversidade das suas pessoas e permitiu aos colaboradores escolher um plano de benefícios completamente personalizado e adaptado às suas necessidades e preferências”.
A título de exemplo, os jovens valorizarão muito mais numa empresa a possibilidade do teletrabalho – já que dão extrema importância ao equilíbrio entre a vida pessoal e profissional –, a oferta formativa, vales para viagens ou o pagamento de mensalidades no ginásio do que um seguro de saúde ou um Plano Poupança Reforma (PPR) – estes, por sua vez, valorizados por faixas etárias mais altas. Já um colaborador com filhos dará preferência a cheques-infância ou à possibilidade de acompanhar as crianças no primeiro dia de escola.
Aquilo que para determinada pessoa faz sentido, para outra poderá já não fazer, e as empresas beneficiam em estar preparadas para compreender e abarcar esta mutabilidade de necessidades.
Adaptando a oferta, as empresas estão a ser mais eficientes em termos de custos, não desperdiçando dinheiro em benefícios, produtos ou serviços que os empregados não utilizam ou valorizam.
As empresas devem estar preparadas para abarcar a mutabilidade de necessidades dos seus colaboradores
De colaborador a embaixador
Toda esta questão da compensação flexível contribui para melhorar a experiência do colaborador. Um recente estudo da Deloitte diz-nos que 80% dos colaboradores consideram que a experiência que vivem na empresa é muito importante. Um colaborador feliz sentir-se-á mais comprometido, o que irá repercutir-se na sua produtividade e longevidade na empresa. Sublinhar ainda que, mesmo terminado o vínculo contratual, um colaborador satisfeito será embaixador da marca, transmitindo tudo aquilo que foram as suas melhores experiências para outras organizações. Isso ajudará as empresas a atrair perfis de alta qualidade e, geralmente, com maior afinidade pelos seus valores e cultura.
Esta temática ganha cada vez mais relevância, e com ela começam a surgir soluções tecnológicas que permitem às empresas a gestão e otimização dos pacotes de remuneração flexível, a partir de uma só aplicação de telemóvel. Além disso, este tipo de plataformas oferece às empresas informação valiosa no que concerne aos benefícios mais e menos valorizados pelos colaboradores, dotando-as de dados relevantes para conceberem um pacote abrangente de benefícios.
80% dos colaboradores consideram que a experiência que vivem na empresa é muito importante
Inflexibilidade da legislação
A remuneração flexível está a tornar-se, de facto, um elemento diferenciador na luta pelo talento, apresentando-se como uma das medidas mais poderosas para melhorar o bem-estar dos empregados sem aumentar os custos laborais para a empresa. No entanto, nem tudo sai facilitado com este tipo de medida.
Em Portugal, contrariamente a outros países, como é o caso de Espanha e do Reino Unido, não existe legislação específica em matérias de tratamento fiscal, de segurança social e laboral dos pacotes de benefícios flexíveis, o que torna toda esta questão complexa. Se benefícios sociais, como os seguros de vida ou de saúde, veem-se excluídos de tributação em sede de IRS e aceites como gastos dedutíveis em sede de IRC, a questão complica-se se falarmos de benefícios como ginásios, serviços de internet ou de telecomunicações, oferta de telemóveis, entre outros não considerados de utilidade social.
Neste contexto, Rui Catarino, Mgr. Reward & Recognition and Org. Effectiveness da Vodafone Portugal, defende que “a introdução da remuneração flexível poderá tornar-se ainda mais relevante se a legislação fiscal e laboral incentivar a sua utilização, permitindo às empresas terem um papel ainda mais preponderante, tornando-as, inclusive, socialmente mais responsáveis”.
Temos, portanto, assistido nos últimos anos – em concreto neste último ano e meio de pandemia – a um incentivo à criatividade dos diretores de RH na atribuição de benefícios. A pandemia acelerou a construção de uma lógica que tem em conta uma visão holística do colaborador, considerado único e não apenas mais um. Com o aumento da competitividade decorrente deste contexto pandémico, o qual abriu um mercado global, permitindo recrutar pessoas espalhadas um pouco por todo o mundo, impôs-se uma maior necessidade de um plano de retenção. Apesar de não ser o único fator para reter talento, a compensação flexível é essencial, contudo, é importante que não seja esquecida pela legislação portuguesa.
Testemunhos
“A escolha de benefícios flexíveis da Sociedade Central de Cervejas e Bebidas é efetuada através da disponibilização mensal de uma bolsa, de montante igual para todos os colaboradores, devendo ser utilizada, na sua totalidade, no conjunto de benefícios flexíveis disponibilizado, em áreas tão diferentes como a saúde e o bem-estar, a educação, a proteção e benefícios do dia a dia”, Rui Português, Total Rewards Manager da Sociedade Central de Cervejas e Bebidas.
“A Vodafone Portugal já teve implementado um plano de benefícios flexíveis durante um assinalável número de anos, o qual depois evoluiu para um alargamento dos benefícios globais extensíveis a todos os colaboradores, que visa cobrir as diferentes preferências de cada um, independentemente do seu género, idade e função. Exemplo destes benefícios é o plano de pensões com mais do que um gestor financeiro e cada um com quatro fundos de pensões com risco diferente entre eles. Outro exemplo é o seguro de saúde – com um plano-base muito competitivo -, com várias opções que podem ser adicionadas dependendo da necessidade de cada colaborador e com um valor bastante reduzido, tal como o serviço de comunicações – mais uma vez com um valor reduzido -, em que cada colaborador pode adicionar alguns familiares”, Rui Catarino, Mgr. Reward & Recognition and Org. Effectiveness | HR – Vodafone Portugal.
“Atualmente, na SUMOL+COMPAL, não temos implementado um regime de benefícios flexível. No entanto, tendo como objetivo o aumento da nossa vantagem competitiva em termos de atração e retenção de talentos, assim como o aumento dos níveis de motivação dos nossos colaboradores, estamos neste momento a realizar um estudo como forma de compreender a viabilidade e vantagens associadas à implementação de um regime de benefícios flexível na nossa realidade”, Maria João Banazol, Direção de Pessoas | Compensação e Benefícios da SUMOL+COMPAL.
Artigo publicado na edição n.º 137 da RHmagazine, referente aos meses de novembro/dezembro de 2021.
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