“A insustentável leveza do ser” em tempo de medidas excecionais e as virtualidades improváveis das escolhas empresariais.
Um olhar diferente.
Numa era de incessantes perplexidades, numa era de tomada de decisões “de largo espectro”, em que as perspetivas das escolhas leves contrastam fortemente com opções pesadas – que amarram inexoravelmente o futuro do Homem (e para além do que Milan Kundera já deixou in illo tempore tratado, no que aqui pretendo convocar, também o futuro das Organizações) – urge refletir hoje sobre o significado e impactos de tais determinações… e também sobre as virtualidades a que tais opções nos podem conduzir… em termos coletivos.
Num enquadramento em que um “acaso absoluto” e de dimensão inimaginável – a necessidade de prevenção e combate à Covid19 – se abateu e continua a abater-se sobre as Organizações, é preciso responder. Com eficácia. Com eficiência. Com rigor. Para continuarmos depois, tão próximo de antes, quando possamos.
Para tanto, medidas de natureza excecional e temporária foram aprovadas como mecanismos de preservação do emprego e como modo de reação à imposição de distanciamento e isolamento sociais, no sentido de minimizar, tanto quanto possível, os impactos verificados nas Organizações, que deixaram de poder laborar – parcial ou totalmente.
Aqui chegados, cumpre percecionar – a montante e a jusante – como fortalecer as Organizações após e durante, tão dura provação, e como aproveitar os ensinamentos e reflexões que este período convoca, como aplicar internamente, a posteriori, este valor gerado em período de turbulência.
Não tenho dúvidas que o status atual da economia e a forma como somos forçados a lidar com ele, nos vários prismas da nossa Vida, nos força também a reequacionar, a forma como vivemos e trabalhamos, a forma como nos relacionamos no seio das Organizações, a forma como lideramos e determinamos os impactos que produzimos nos Outros.
Ora, também no mundo empresarial, entendemos que este “regresso forçado às nossas próprias conchas” e o chamamento que o mesmo nos impele a, em simultâneo, continuarmos a contribuir – na medida do que a cada um seja exigível, e consoante as funções que exercemos e as nossas circunstâncias – deve ser potenciado em prol da Organização em que estamos integrados.
Senão vejamos,
Para além da gestão das prioridades óbvias e imperativas, determinadas pelas necessidades atuais de prevenção e de combate à Covid19 (que passam, designadamente pelo cumprimento escrupuloso do Plano de Contingência comunicado, pela implementação de medidas de isolamento e de distanciamento social e pelo recurso a figuras destinadas a garantir a manutenção dos postos de trabalho como o lay-off simplificado, o recurso a linhas de crédito, a adoção do teletrabalho, o recurso aos incentivos e apoios financeiros previstos, etc.), é igualmente chegado o momento de gerirmos esses e outros desafios que nos são impostos, em prol da continuidade e da excelência organizacionais.
Com efeito, entendemos que se investirmos algum deste tempo de exceção, igualmente na redefinição da estratégia a seguir, nas várias vertentes empresariais, estaremos, não só melhor preparados para gerir o futuro, como mais focados no que realmente é crítico para cada Organização e para o seu sucesso.
Numa era em que a definição de prioridades é de facto o móbil da nossa atuação, a triagem do imprescindível, do supérfluo e do ruído torna-se, também, mais translúcida.
E nesta ótica, decidimos elencar alguns items que entendemos deverem igualmente ser merecedores de uma análise interna rigorosa.
Numa época – que o é, de introspeções diversas – tanto de natureza ética, como pessoal, individual, profissional e coletiva – consideramos que o colocar tudo em perspetiva é um exercício, não só salutar como imprescindível neste desafiante momento, pelo que se impõe igualmente a todas e a cada uma das Organizações que gerimos ou em que nos integramos, um verdadeiro “auto-exame interno” (nesta fase, necessariamente teórico, mas com vista a ser aplicável à prática, assim que for oportuno), a vertentes como:
- o modelo de comunicação interna em vigor – em especial a forma como a Organização tem mantido o contacto com as suas Equipas, neste tempo de provação e de sacrifício coletivo;
- o modelo de relacionamento interpessoal implementado;
- os mecanismos de feedback e de motivação interna utilizados para reter e atrair talento humano (o ativo intangível de qualquer Organização);
- as formas de coesão e de cooperação internas privilegiadas pela empresa, caso existam;
- a necessidade de designação de colaboradores “interface” ou de um “Gabinete de Crise”, que possa estudar a implementação proactiva de medidas, de planos de contingência ou de reação a fatores externos/causas de força maior;
- os modelos de trabalho e de organização do tempo de trabalho implementados, e designadamente, as virtualidades decorrentes da implementação de um modelo eficiente (ex: a adoção de um modelo intermitente que possa convocar fases de teletrabalho, com fases de efetiva presença na empresa, nas funções que o permitam);
- a definição das atividades core e das atividades meramente instrumentais no setor em que cada empresa opera;
- a forma como está estruturado o atual organograma empresarial e as eficiências e potenciais ineficiências geradas pelo mesmo e linhas de reporte definidas;
- a identificação de recursos imprescindíveis à manutenção das operações em curso – sejam eles matérias-primas, fornecedores, prestadores de serviços, logística, ativos ou outros;
- as necessidades de instrumentos e meios, nas diversas operações;
- os índices de formação (e a aposta que é feita na contínua formação) dos Colaboradores;
- a adoção de uma lógica de economia de meios (não só no imediato, no momento de resposta à crise pandémica, mas como modus operandi permanente, cancelando ou substituindo deslocações e viagens não imprescindíveis e privilegiando o recurso a meios-remotos de comunicação, sempre que possível, evitando custos e despesas dispensáveis;
- a forma como remuneramos e premiamos o talento dos nossos profissionais e aplicamos os demais recursos da empresa;
- a forma como conduzimos os Colaboradores a contribuir com o seu “extra-mile”, de forma entregue e realizada e a forma como os avaliamos;
- a forma como encaramos e gerimos o binómio – compatibilização da vida pessoal com a vida profissional – nos vários grupos de colaboradores ao serviço da empresa versus criação de valor para a Organização e mais-valias geradas;
- os mecanismos de responsabilidade social ativados – internos e externos à Organização e a forma como atendemos às necessidades pessoais dos colaboradores e quais os mecanismos de solidariedade implementados, se alguns,
- etc.
Provavelmente haverá quem ao analisar este elenco de sugestões não vislumbre no imediato a mais-valia que a salvaguarda e visão crítica de todos estes aspetos poderá traduzir, a médio ou longo prazo.
Não obstante, mesmo em tempo de urgência social – entendo, na qualidade de assessora jurídica de empresas na área de direito laboral – que a opção por decidir seguir por aqui, ou por direção inversa poderá ser a diferença entre manter sólidos e eficientes os pilares centrais de cada Organização – com impacto no ciclo de valor gerado no seu setor de atividade – ou nalguns casos (que tememos, poderem não ser poucos, seguramente), ao serem ignoradas tais variáveis, poderá a Organização estagnar, decair e entrar em declínio, sem recurso a ferramentas e mecanismos aptos a evitar esse status quo.
Num momento de estagnação económica, e em que se perspetiva a eclosão de uma crise sem precedentes à escala mundial, o recentrar destas prioridades poderá ser decisivo para cada Organização, sobretudo no momento de aplicar este brainstorming e efeito útil gerado à retoma da atividade operacional, pois a análise que preconizamos traduz planeamento estratégico – o qual, por força das circunstâncias que vivemos, é, agora, mais filtrado e ao serviço de valores de sustentabilidade nunca antes testados, em que as variáveis deixam de ser apenas financeiras, económicas, operacionais, para o serem a uma escala mais participativa e global, que atende também, às efetivas necessidades e contributos de todos os stakeholders em presença.
Numa altura em que a saúde pública assume um papel preponderante, consideramos que gerir deste modo “saudável”, Organizações que pretendemos sejam salutares a todos os níveis, implica, também, proceder a este diagnóstico interno, com ponderação e rigor.
Talvez seja precisamente neste exame atento que residem, em contexto adverso, as virtualidades improváveis das escolhas empresariais, assim por nós apelidadas.
A isto designamos “business as (un)usual”, em tempos igualmente “incomuns”, mas na esperança que o atender a todas estas variáveis se torne na tónica a adotar, independentemente do momento ser, ou não, de exceção.
#cadaumdevefazerasuaparte
#gerircomeficienciaefoconofuturo
#fiqueasalvo
#emcasaouaolemedaorganizacao