Autor: Mário Ceitil, Presidente da Mesa da Assembleia da APG
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Esta associação, diga-se, já vem de longe e tem constituído um dos eixos da chamada “Gestão Técnica de Recursos Humanos”, particularmente de uma das suas principais ferramentas, designadamente a “Análise e Qualificação de Funções”, onde o “esforço físico”, a “quantidade de trabalho” e o “tempo estimado de experiência requerida” constituíam alguns dos principais fatores a considerar para atribuir um valor de qualificação a uma determinada função ou posto de trabalho.
Seja por influência dessas ferramentas “clássicas” da GRH nas estruturas de muitas empresas, seja ainda por circunstâncias sociológicas herdadas da chamada “era industrial”, o que é facto é que ainda prevalecem hoje filosofias e modelos de gestão em que, como refere Waytz, no artigo citado, a “atividade (busyness) adquiriu um símbolo de estatuto”, onde se considera que as pessoas que se esforçam muito e estão sempre “muito ocupadas” são “moralmente admiráveis”, independentemente do respetivo output que produzem.
Talvez devido a esse tipo de mentalidades, estamos constantemente a tropeçar na prática do dia-a-dia com as tais pessoas alegadamente “super ocupadas”, que alardeiam a sua permanente falta de disponibilidade como se fosse uma bandeira de eficácia e de importância, dominando um vocabulário onde abundam expressões como “agora não posso”, “não tenho tempo”, “vejo isso depois” e uma outra, mais canónica, que, apesar de ser referida num tom que aparenta uma certa auto comiseração, esconde, pelo contrário, a auto contemplação de alguém que se considera a si próprio bafejado pelo estigma da indispensabilidade: “não tenho tempo para nada”.
Esta síndrome de “pobreza de tempo” (time poverty), não ataca apenas as pessoas em registo profissional.
Na vida pessoal, a alegada escassez de tempo também é frequentemente invocada para mandar para as “calendas” um determinado possível encontro com amigos ou familiares”, através de expressões tão banais como “um dia destes telefono-te”, “tenho andado muito ocupado”, “vou ver quando consigo arranjar um bocadinho de tempo”, etc. e até em circunstâncias mais complexas, como a daquelas pessoas que, não tendo muito com que se ocuparem, quando alguém lhes telefona ou convida para um encontro, sentem necessidade de esconder a sua subocupação, invocando a fórmula que lhes salva ilusoriamente os vestígios de dignidade que ainda lhes restam: “vou ver na minha agenda”.
A prevalência do modelo “estar ocupado” (busyness) sobre o de “obter resultados” (business), apesar de ainda subsistir em muitas organizações está hoje já muito próximo do “prazo de validade”. Sendo certo que ainda subsistem os exemplos profissionais dos “ativistas frenéticos”, que circulam pelos espaços das empresas com coreografias de permanente agitação, que, embora dando a ilusão de serem pessoas muito ocupadas, apresentam geralmente níveis de produtividade muito baixos, são cada vez mais olhados como uma “espécie em vias de extinção”.
Como refere Waytz, “na vida empresarial, o estar ocupado (busyness) já não é uma virtude” e “avaliar os colaboradores em função de estarem mais ou menos ocupados é uma maneira terrível de identificar os talentos mais criativos e mais produtivos”.
O equilíbrio entre o trabalho e o lazer, entre a atividade frenética e a contenção do silêncio, entre o estar ocupado e a fruição simples e autêntica do tempo a passar, são hoje os verdadeiros sinais de uma inteligência criativa e transformadora, capaz de produzir em simultâneo elevados níveis de produtividade e de bem-estar, estabelecendo a relação virtuosa consubstanciada na própria ideia do “work-life balance”.
Ser produtivo e eficaz não é ter a obsessão de “fazer tudo, em todo o lado, ao mesmo tempo”, como no título de um filme candidato ao Óscar deste ano; é, pelo contrário, treinar a nossa mente para estabelecermos prioridades claras relativamente aquilo que realmente queremos alcançar, focalizarmo-nos naquilo que é verdadeiramente importante, e cultivarmos espaço e tempo para que a nossa mente possa vislumbrar horizontes alternativos que nos façam crescer e prevalecer.
Porque, e numa referência final a Adam Waytz, “se quisermos que os nossos colaboradores verdadeiramente progridam, é preciso dar-lhes
tempo para que as suas mentes possam vaguear”.
(1) Adam Waytz . Beware a Culture of Busyness: Organizations Must Stop Conflating Activity with Achievement. HBR, March-April 2023