A pertinência do estudo das estratégias comportamentais deriva do facto de ele poder proporcionar aos gestores de RH as ferramentas necessárias para estes contribuírem para um combate mais eficaz face aos comportamentos destrutivos nas organizações.
Efetivamente, no contexto atual, marcado pela imprevisibilidade e pela crescente necessidade de as organizações se tornarem sistemas flexíveis e capazes de responder adequadamente às exigências económico-sociais, torna-se fundamental estudar o comportamento dos indivíduos, quando integrados nesta realidade organizacional. Particularmente em Portugal, um país que atualmente passa por uma crise que tem afetado as diferentes esferas do social, o estudo do comportamento dos indivíduos, quando se deparam com o declínio da satisfação, torna-se ainda mais relevante.
A nível académico, este fenómeno, ou seja, os comportamentos intencionais e deliberados adotados pelos indivíduos com o objetivo de resolverem o foco de insatisfação com o trabalho, foi inicialmente estudado num âmbito generalista por Hirschman (1970). Mais tarde, Farrell (1983) desenvolveu um modelo ortogonal para as organizações com duas dimensões (ativa vs. passiva e construtiva vs. destrutiva). Este modelo – designado sob a sigla EVLN − postula que, quando se deparam com o declínio da satisfação com o trabalho, os indivíduos tendem a: sair (exit), procurar resolver o foco da insatisfação através do exercício de uma voz pró-social (voice), permanecer leais à organização (loyalty) ou tornar-se negligentes na realização do seu trabalho (neglect). Apesar de ser considerado o referencial teórico para estudar o fenómeno em causa, tem sido identificado um conjunto de limitações, teóricas, concetuais e metodológicas (Dowding et al., 2000; Grima e Glaymann, 2012), que originaram uma diminuição de estudos sobre o tema. Por outro lado, esta situação é agravada pelo facto de este constructo não ter uma designação consensual.
Relativamente à designação do constructo, e tendo como referência o trabalho desenvolvido por Nascimento (2010), propõe-se que seja denominado de «estratégias comportamentais». O termo «estratégia» justifica-se pelo facto de acentuar o seu cariz intencional e deliberado. Como Simon (1997, p. 77) referiu: «o conjunto de decisões que determinam o comportamento durante um determinado tempo pode ser chamado de estratégia». Já o termo «comportamental» é utilizado para realçar a ação realizada por forma a atingir determinado objetivo.
No que respeita às limitações do modelo EVLN, apresentar-se-ão as duas que têm maior influência no trabalho dos gestores de recursos humanos. A primeira prende-se com o facto de o modelo EVLN ter caraterísticas ortogonais através da conciliação das duas dimensões, limitando o comportamento dos indivíduos a uma das quatro estratégias comportamentais possíveis (saída, voz, lealdade e negligência). Na concetualização do modelo EVLN, enquanto abordagem ortogonal, não se considera a possibilidade de os indivíduos agirem de forma sequencial, ou seja, se uma estratégia comportamental não resolver o foco de insatisfação então opta-se por outra e assim sucessivamente. Autores como Withey e Cooper (1989) consideraram esta possibilidade; no entanto, desenvolveram propostas de ordem concetual. Aponta-se ainda um conjunto de proposições a serem testadas empiricamente, por forma a perceber quais as sequências de estratégias comportamentais que melhor se adequam a cada organização.
A segunda limitação referente ao modelo EVLN refere-se ao facto de este postular quatro estratégias possíveis, sem considerar, por um lado, o facto de as estratégias poderem não ser estáticas e, por outro, a possibilidade de existirem outras estratégias comportamentais para além das identificadas pelos autores. De notar que a voz é uma estratégia que poderá não assumir unicamente um cariz ativo e construtivo como é apresentado no modelo EVLN. Poderá, por exemplo, ter caraterísticas agressivas, tornando-se assim uma estratégia de cariz destrutivo (Hagedoorn et al., 1999). Outros autores contemplam a existência de outras estratégias, nomeadamente o silêncio (Dyne et al., 2003) ou mesmo o cinismo organizacional (Naus et al., 2007). O levantamento exaustivo das diferentes estratégias comportamentais e respetivas variações tornará este tema ainda mais pertinente.
Neste sentido, em que medida pode a academia, através do estudo das estratégias comportamentais, ser uma mais-valia para os gestores de recursos humanos?
Em primeiro lugar, porque o estudo das estratégias comportamentais incide sobre os comportamentos, intencionais e deliberados, que os indivíduos adotam numa situação muito particular, que é a satisfação. Se o gestor de recursos humanos se focar no entendimento destas estratégias comportamentais, poderá compreender que (1) quando um colaborador adota determinado comportamento, identificado como estratégia comportamental, a sua satisfação com o trabalho está a diminuir e (2) se adota uma estratégia comportamental, então, num segundo momento, irá adotar outra e assim sucessivamente. Através deste diagnóstico, o gestor de recursos humanos conseguirá prever qual a estratégia seguinte dos seus colaboradores. Neste sentido, poderá agir em conformidade, procurando encontrar alternativas no âmbito das práticas de GRH que levem à prevenção/não adoção de comportamentos de cariz destrutivo (e.g., saída ou negligência).
Bibliografia
Dowding, K., John, P., Mergoupis, T., e Vugt, V. (2000), «Exit, voice and loyalty: Analytic and empirical developments», European Journal of Political Research, 37, pp. 469-495.
Dyne, L., Ang, S., e Botero, I.C. (2003), «Conceptualizing employee silence and employee voice as multidimensional constructs», Journal of Management Studies, 40(6), pp. 1359-1392.
Farrell, D. (1983), «Exit, voice, loyalty, and neglect as responses to job dissatisfaction: A multidimensional scaling study», Academy of Management Journal, 26(4), pp. 596-607.
Grima, F., e Glaymann, D. (2012), «A revisited analysis of the exit-voice-loyalty-neglect model: contributions of a longitudinal and conceptually extended approach», Management, 15(1), pp. 1-41.
Hagedoorn, M., Yperen, N.W., Vliert, E., e Buunk, B.P. (1999), «Employee’s reactions to problematic events: a circumplex structure of five categories of response, and the role of job satisfaction», Journal of Organizational Behavior, 20, pp. 309-321.
Hirschman, A.O. (1970), Exit, Voice, and Loyalty: Response to Decline in Firms, Organizations and States, Harvard University, Cambridge, Massachusetts, EUA.
Nascimento, J.L. (2010), Influência do Comprometimento Organizacional nas Estratégias Comportamentais, Mediadas pelo Comprometimento com os Objectivos e pela Satisfação Global com o Trabalho, tese de doutoramento não publicada, ISCTE, Lisboa.
Naus, F., Van Iterson, A., e Roe, R. (2007), «Organizational cynicism: Extending the exit, voice loyalty, and neglect model of employees’ responses to adverse conditions in the work place», Human Relations, 60(5), pp. 683-718.
Simon, H. (1997), Administrative Behavior: A Study of Decision-Making Processes in Administrative Organizations (1.ª edição, 1945), The Free Press, Nova Iorque.
Withey, M.J., e Cooper, W.H. (1989), «Predicting exit, voice, loyalty and neglect», Administrative Science Quarterly, 34, pp. 521-539.