por: Helena Martins (Instituto Politécnico do Porto)
Uma reflexão sobre a importância do relacionamento com os colaboradores no processo de avaliação de desempenho.
Em qualquer organização, algumas das decisões mais importantes que são tomadas dizem respeito às pessoas: quem é a pessoa certa para esta função? Quem é que deve ser promovido? Quem merece ser aumentado? Quem pode acumular mais responsabilidades?
A avaliação de desempenho assume, então, um papel obviamente muito importante e, no entanto, este é um processo em grande medida externo aos colaboradores.
De acordo com Latham e Latham (2000), para a generalidade dos trabalhadores, a avaliação de desempenho é frequentemente a única forma que estes têm de obter feedback do quão bem se estão a sair no seu trabalho; não obstante, a maioria dos estudos desenvolvidos nesta área referem que a aplicação do processo é pouco consistente, incluindo diferentes níveis de implicação face ao processo por parte de diferentes líderes/chefias, ausência de continuidade entre as avaliações e pouca − ou mesmo nenhuma − relação com o sistema de compensações e benefícios no seu todo (Davis e Landa, 1999; Redman et al., 2000).
Temos, portanto, uma realidade algo paradoxal e mesmo um pouco esquizofrénica no que toca a este processo de GRH: a avaliação de desempenho é fundamental, mas a sua aplicação é frequentemente incoerente e inconsistente na estrutura organizacional.
Psicologizemos: sendo feita de forma formalizada ou não, a avaliação de desempenho dá aos colaboradores uma certa ideia de reciprocidade palpável, de receber algo em troca do seu esforço, empenho e desempenho. Assume-se que um colaborador que faça bem o seu trabalho, atinja os seus objetivos, etc., obterá uma boa avaliação de desempenho. Está implícita a ideia de recompensa ou «moeda de troca», seja esta moeda de troca um simples reconhecimento ou algo mais substancial como uma promoção, um aumento, etc.
Ora, sucede que, de acordo com Feldman (1981), os processos cognitivos envolvidos na avaliação de desempenho são essencialmente automáticos (e.g., quando o avaliador vai acumulando informação acerca do desempenho de um colaborador no dia a dia), exceto quando ocorre algum problema (e aqui a situação pode ser formalmente analisada).
Esta forma mais ou menos inconsciente de reunir informação permite que a avaliação de desempenho tenha um caráter contínuo e holístico, mas também vai propiciando a existência de vieses cognitivos, categorização dos colaboradores, entre outros processos de perceção claramente subjetiva − potenciando assim o surgimento de injustiças no processo de avaliação de desempenho.
É que esta forma de gerir a informação, muitas vezes por «caixas» ou categorias, é um processo de gestão que desenvolvemos de forma mais ou menos consciente para muitas áreas da nossa vida e que faz parte da nossa forma de ser, estar e apreender o mundo. Difícil de contornar.
Ora, se por um lado é até muito intuitivo que um processo de avaliação de desempenho que crie sentimentos de injustiça pode prejudicar o funcionamento da organização, na medida em que as pessoas estarão menos dispostas futuramente a investir na empresa e que a relação do trabalhador com a empresa fica afetada, é por outro lado surpreendente perceber que algumas pistas de investigação sugerem que este impacto se deve especificamente a uma deterioração na relação dos trabalhadores com a empresa e com a chefia. Ou seja, não só o trabalhador fica desiludido com a empresa, como essencialmente a sua relação com a chefia fica alterada (incluindo em situações em que esta chefia possa estar «de mãos atadas»).
Em 2001, Phelan e Lin chegaram mesmo a provar, através de uma simulação matemática, que métodos de promoção aleatórios podem mesmo ser melhores para a performance global da organização do que a promoção baseada no mérito (!) ou outros métodos.
Ou seja: não é necessariamente a má avaliação de desempenho em si (e as suas consequências estruturais) aquilo que mais prejudica a empresa, é a forma como esta afeta as relações laborais que pode pôr em causa as organizações.
Se considerarmos que hoje em dia temos cada vez mais empresas knowledge-intensive e na área dos serviços onde efetivamente os indivíduos fazem (muita) diferença, torna-se absolutamente fundamental assegurarmos que as relações laborais não são rombamente prejudicadas em processos que − ainda por cima − são vistos como muito influentes nas carreiras dos indivíduos.
Por entre as desilusões dos avaliados estão ainda as necessidades de formação e desenvolvimento que não são, em geral, abordadas nas discussões sobre o seu desempenho: apesar de as organizações proclamarem que o seu sistema de avaliação de desempenho é usado para compreender as necessidades desenvolvimentais dos seus recursos humanos, na realidade é frequente este propósito assumir um papel secundário na avaliação de desempenho (Redman et al., 2000). Alguns autores (e.g., Mani, 2002; Simmons, 2002) referem inclusivamente que este processo em geral não motiva os colaboradores a melhorarem a sua performance.
Assim, e uma vez que é virtualmente impossível ser completamente justo na distribuição da avaliação de desempenho, torna-se imperativo que o processo seja o mais claro e transparente possível e que sejam desenvolvidas estratégias de gestão para a preservação e o fortalecimento das relações laborais.
Porque muitas vezes não é o que dizemos, mas como o dizemos e a forma como o apresentamos que faz toda a diferença.