Por Rocío Cervino
CEO da MOLA-Human Lab
Andamos 47% do tempo distraídos, diz Harvard. A oscilação entre os pensamentos do que já aconteceu e projeções futuras são uma realidade in crescendo, fruto dos tempos digitais em que vivemos, onde parece que não chegamos a tempo a nada.
O bombardear constante de informação e a presença de múltiplos estímulos fazem com que nos habituemos à distração, à desconcentração e à atenção e presença parciais. Vamos de tarefa em tarefa neste “tenho que” que nos arrasta. Até que surge a imperiosa necessidade de escolha: ficar num processo composto de tarefas que visam apenas objetivos ou querer fazer disso um processo vital, uma “life-time experience” diferencial é a consciência, a atenção plena colocada no próprio processo. É a isso que chamamos de mindfulness”: Mind – Mente | Fullness – Plenitude. Uma capacidade para sair do piloto automático e voltarmos ao presente, de permanecermos presentes, nesse presente; fazer visitas constantes ao “agora” pois, como dizia Eckhart Tolle, “o agora é o único momento que algum dia terá”.
Em palavras do próprio Kabat-Zinn, pioneiro na utilização desta prática no modelo da medicina oriental nos anos 90, “mindfulness” é “prestar atenção de maneira intencional ao momento presente sem julgamentos” (entende-se sem julgar e sem nos julgarmos). Aceitar o momento pelo que é, sem nos identificarmos com os nossos pensamentos.
A proposta do “mindfulness” é treinar esta mente para criar um espaço entre a afluência constante de estímulos e as respostas que gera. A este espaço chamamos-lhe lugar de observação, onde a reação gerada pela emoção não é imediata, permitindo assim que a resposta seja dada, desde a calma, com mais clareza. Melhores respostas proporcionam por sua vez melhores reações comportamentais e melhores decisões.
“Não é que o mindfulness seja a resposta a todos os problemas. Mas todos os problemas podem ser vistos mais claramente através da lente de uma mente clara” – Kabat-Zinn
É aqui que nasce a aplicação do “mindfulness” no mundo laboral
Seguindo o exemplo da pioneira Google que criou, apoiada por reconhecidos neurocientistas, o seu próprio programa “Search Inside Yourself” no ano 2015, cada vez mais empresas dos mais variados tamanhos e setores de atividade têm vindo a incorporar esta prática, guiadas pela necessidade que os colaboradores manifestam em gerir melhor o “stress”. Num “work-life one”, onde já não existe mais uma brecha entre a vida profissional e pessoal e sim a procura de uma vida plena. As empresas “mindful” tornam-se corresponsáveis pelos diferentes espetros da vida do colaborador ao complementar o seu autoconhecimento e desenvolvimento pessoal, ao contribuir para a sua felicidade e qualidade de vida. O vínculo empresa-sociedade é assim reforçado.
Como implementar o “mindfulness” no contexto empresarial?
A prática do “mindfulness” é fácil, mas requer consistência e disciplina. Apostar nestes dois fatores é a chave para que tanto os colaboradores como a própria organização se beneficiem da sua utilidade. Quer seja através das diferentes técnicas de meditação, guiadas ou autónomas situações que os colaboradores aprendem da mão de um especialista, quer seja através da atenção plena em tudo aquilo que fazem: ler, escrever, ouvir, falar, comer, descansar… o impacto positivo que se gera é acumulativo e reverte na sua criatividade e produtividade, assim como na redução drástica das doenças crónicas, do absentismo, da insatisfação, do esgotamento
e dos conflitos. Quando um colaborador se sente bem, o seu potencial ilimitado é ativado e colocado ao serviço do ecossistema organizacional.
Dicas para uma implementação efetiva
- Criar um compromisso com a prática,
- Disponibilizar um espaço e horário para a mesma, assim como as condições adequadas e a acessibilidade ao material de apoio (almofadas, mantas, som…)
- No início do dia gerar a intenção individual de colocar uma intenção concreta para a jornada laboral e ter essa intenção principal presente até o fim do dia
- Manter uma respiração consciente durante toda a jornada e revisitar algumas técnicas de reeducação respiratória nos principais momentos: no início do dia, antes do almoço, depois do almoço e no fim do dia
- Reduzir a velocidade na realização das tarefas: cultivar “monotasking” vs “multitasking”
- Fazer pausas e descansos segmentados
- Escutar os outros
- Colocar consciência nas nossas palavras e linguagem corporal – lembrar que mais importante do que dizemos é como o dizemos
- Fazer o exercício de escutarmo-nos mais a nós mesmos
- No fim do dia fazer uma breve reflexão, sem julgamento, do que foi a jornada e de como agimos nas diferentes situações
Artigo publicado na edição 123, julho/agosto 2019, da RHmagazine