Eletricistas, mecânicos e soldadores são algumas das profissões mais procuradas pelos empregadores portugueses, que, pela falta de candidatos e ausência de competências técnicas, têm dificuldade em contratar, avança o mais recente estudo desenvolvido pela ManpowerGroup.
Identificar o talento e contratá-lo: eis o desafio das empresas em 2018, que regista os níveis mais altos de escassez de talento desde 2006. De acordo com o último Talent Shortage Survey, desenvolvido pela ManpowerGroup e apresentado esta segunda-feira, em Lisboa, na primeira edição das Talent Talks, 45% das organizações – mais 5% face a 2016 – apresentam dificuldades na contratação de profissionais. Aos candidatos, que escasseiam, é-lhes conferido mais poder de escolha, os clientes estão mais sofisticados e exigentes, a população está mais envelhecida, há um desencontro entre as competências que os trabalhadores encerram e as que estão disponíveis no mercado e a tecnologia é, hoje, parte da mão-de-obra das empresas. É esta a fotografia do atual mercado de trabalho.
Em Portugal, 46% das empresas que participaram no estudo sobre escassez de talento da ManpowerGroup revelam dificuldades na contratação de perfis – percentagem que coloca o país acima da média dos países analisados. Os profissionais especializados, onde se incluem os eletricistas, os mecânicos e os soldadores, são os mais procurados no mercado português. No ranking dos dez perfis mais procurados encontram-se também os perfis técnicos, os motoristas, os engenheiros, domésticos e limpezas, professores, informáticos, apoio ao cliente, gestores de projeto, advogados e investigadores e os administrativos.
Conforme referiu Vítor Antunes, managing director da ManpowerGroup, as competências mais procuradas nem sempre exigem um diploma universitário, antes conhecimentos técnicos e tecnológicos. Na multinacional de recrutamento estão em aberto 1300 vagas para apoio ao cliente, 482 para administrativos, 339 para motoristas, 338 para perfis especializados e 299 para perfis técnicos.
As pequenas empresas são as que admitem ter mais dificuldades em contratar (55%). Seguem-se as grandes empresas (43%) e as médias e microempresas (42%). A dificuldade na contratação de profissionais explica-se, segundo os resultados da pesquisa, pela ausência de competências técnicas dos perfis (25%), falta de candidatos (24%), falta de experiência (13%), desencontro de expectativas remuneratórias (10%) e ausência de soft skills (10%).
Competências técnicas ou soft skills?
O atual mercado de trabalho, digitalizado e automatizado, exige determinadas competências que os profissionais de 35% das empresas nacionais não detêm. É a sua capacidade de aprendizagem, ou learning ability, que fará a diferença. “As pessoas com maior capacidade para aprenderem, com inteligência emocional e com capacidade para estabelecerem relações são as que vão ter maior desempenho no mercado de trabalho”, afirmou Vítor Antunes na apresentação do Talent Shortage Survey, que revelou, ainda, que o espírito colaborativo é a competência mais valorizada e, simultaneamente, a mais difícil de encontrar. A automação nas organizações parece não alterar as suas estruturas humanas. De acordo com os dados do estudo da multinacional de recrutamento, 56% das empresas planeiam manter ou aumentar o número de empregados.
Para colmatar a ausência de competências, 64% das organizações investem na reconfiguração de competências técnicas e 54% na reconfiguração de soft skills. As estratégias das empresas incluem, também, o investimento em mais formação (54%), a alteração dos requisitos relativos à experiência e às habilitações literárias (36%), o recrutamento em redes sociais e media tradicionais (33%), a melhoria dos benefícios oferecidos aos colaboradores, através do aumento dos dias de férias e de novos incentivos para o bem-estar (32%), pagamento de salários mais elevados (29%), oferta da possibilidade de trabalhar remotamente (23%) e contratação em regime de outsourcing (16%).
Talent Talks
A primeira sessão das Talent Talks reuniu esta segunda-feira, em Lisboa, profissionais de várias áreas que assistiram à apresentação do estudo da ManpowerGroup e ao debate levado a cabo pelos convidados da mesa redonda. Para Gonçalo Duque, coordenador das escolas e programas do ensino secundário na Junior Achievement, a escassez de talento resulta da inadaptação do ensino. O responsável da organização internacional que promove o empreendedorismo e a literacia financeira revelou que os jovens são mais colaborantes dos seis aos dez anos e que os mais velhos, no ensino secundário, “não sabem que curso escolher, o que é o orçamento familiar e o que é um seguro”.
Miguel Fontoura, diretor da AICEP – Associação Internacional das Comunicações de Expressão Portuguesa, afirmou que “as entidades de investimento estrangeiro procuram talento e, para isso, olham para Lisboa e para o Porto. Não olham para Portugal”. O responsável pela Associação sublinhou que, no país, “os salários são mais baixos, mas não são, exclusivamente, o fator mais atrativo em Portugal”, onde “há talento, acessibilidades, custos operativos mais baixos e portugueses com capacidades técnicas, flexíveis e dispostos a trabalhar e a trabalhar por objetivos”.
João Pargana, professor de Gestão de Recursos Humanos do ISEG, afirmou que “a universidade é uma escola de saberes e de valores”, que ministra conhecimentos técnicos e que começa, agora, a preparar os alunos para as soft skills que são exigidas no mercado de trabalho. Para o docente, que destacou a importância que o employer branding assume nas organizações no contexto de escassez de talento, “as empresas tiram pouco partido das universidades”.
As Talent Talks viajaram ontem para Leiria e hoje para o Porto, onde contaram com a presença do Instituto Politécnico de Leiria, a NERLEI, a Porto Business School e a Câmara Municipal do Porto.