A verdade é que na maioria das vezes damos por nós com um percurso totalmente traçado pelas empresas pelas quais passamos ou, pior, ele vai ao sabor do mercado e das oportunidades com que nos deparamos, acontecendo naturalmente.
Esta temática da gestão de carreiras tem sido vista, até agora, como a definição dos critérios de evolução profissional, da carreira do indivíduo, no sentido de desenvolver e reconhecer os contributos individuais de cada um por forma a potenciar uma maior adequação pessoa-função mas sempre na perspetiva da organização.
No entanto, consideramos este fator muito redutor e mesmo incorreto ao nível da perspetiva daquilo que é o percurso do organismo vivo das empresas, os seus colaboradores.
Planear, manter, desenvolver e motivar os colaboradores exige metodologias, recursos e respostas técnicas por parte das empresas que queiram manter e principalmente potenciar as pessoas, é verdade. Contudo, hoje em dia são os profissionais que devem planear e dirigir o seu desenvolvimento profissional, definindo as metas e objetivos para a sua carreira, assegurando as necessidades e medidas necessárias para o alcance desses objetivos estabelecidos, definindo naturalmente o seu percurso, gerindo-o e garantindo que tudo faz sentido, não pautando a sua carreira pelas oportunidades que surgem ao sabor do mercado, muitas vezes sem pensar sobre elas e o sentido que fazem.
A empresa na qual trabalhamos é um agente fundamental no sentido em que nos faculta ferramentas, mas o conhecimento é propriedade do indivíduo, acompanhá-lo-á para onde for e é isso que o torna um valioso ativo, sendo que as tools & techniques devem ser reconhecimento e degraus em função dos nossos knowledge & skills.
Esta relação de dualidade não é simples de se gerir, dado que o indivíduo tem de descobrir o ponto de encontro entre o que idealizou para a sua carreira e o seu compromisso para com a empresa na qual trabalha, a prossecução das expectativas do seu empregador. Este, por sua vez, deve mantê-lo motivado e capaz, deve atrair, reter e patrocinar o desenvolvimento do conhecimento produtivo deste com vista a um elevado desempenho, mas será com incentivos que se consegue essa motivação? Efetivamente, em tempos de crise, ninguém paga contas com a conhecida palmadinha nas costas, mas hoje, felizmente, começa a ser a cultura do intelecto que mais cativa os profissionais e os incita a ter uma performance cada vez melhor, porque sabem que isso sim é material para a sua carreira, isso sim levam consigo, e sim, isso são os verdadeiros galões e mais-valias obtidos com o seu trabalho.
Nesta sociedade do conhecimento em que vivemos, as pessoas conhecedoras são donas dos seus próprios meios de produção, pois eles estão dentro das suas cabeças.
Para serem felizes no local de trabalho não é suficiente trabalhar e receber um vencimento ou bónus, as pessoas começam a querer ser protagonistas nas suas organizações.
Entramos no campo da gestão de talentos, cujo equilíbrio reside no ajustamento entre as exigências e expectativas da organização e as necessidades e disposições do indivíduo. Mas o que é talento para a minha empresa? Esta noção e requisitos devem ser apresentados de forma transparente desde o início, de modo que os colaboradores possuam modelos e guias de orientação para a sua ação, para que analisem se a noção de talento da empresa concretiza e vai ao encontro dos seus objetivos individuais de carreira.
A empresa deve alimentar a criatividade dos seus colaboradores e o propósito para o seu trabalho mas, nesse percurso, é natural que se erre, que se façam más opções, que se dê o passo errado. Esse «erro» deve ser aceite e acolhido caso se trate do erro inteligente, aquele que a empresa releva aos colaboradores que reconhece serem pessoas geralmente inconformadas com a realidade, curiosas por natureza, por vezes temperamentais e dispostas a perguntar e descobrir, a correr riscos.
Trata-se de um erro mas é um erro inteligente, porque é uma fonte de aprendizagem, o chamado lessons learned em gestão de projetos, e aprender é a origem de todo o conhecimento e inovação.
O verdadeiro líder não repreende estes erros inteligentes mas encara-os como tentativas de descoberta e considera-os virtudes numa equipa curiosa, empenhada e comprometida. O erro inteligente significa o resultado de uma boa tentativa de fazer algo diferente, com risco calculado no que foi possível, e que, por alguma razão não prevista, não correu bem conforme idealizado.
O erro inteligente precisa de ser tolerado. Este elemento cultural faz falta a muitas das nossas empresas, no sentido em que a pessoa está na essência, no caminho certo. Ela deverá ser protegida, acarinhada, comportamentos estes que são essenciais para que se crie a cultura certa na organização, uma cultura de apoio e de suporte.
O medo é o principal destruidor de ideias. Medo do ridículo, da punição, da exclusão, da perda de valorização profissional que destrói a criatividade. Quantos de nós não foram já ou são continuamente prejudicados pela falta de visão do seu superior hierárquico, que se recusa a reconhecer o valor das pessoas, limitando ao mesmo tempo o departamento de recursos humanos, colocando sobre si próprio as decisões de quais, em que formato e quando cada formação e avaliação têm lugar? Posteriormente, no final de cada ano, apresentam-se como um great place to work, quando na verdade foram comparados com algumas empresas onde o medo e opressão infestam os corredores.
Jack Welch, um líder conceituado na gestão de projetos (1935), referia de forma reveladora: «o segredo é nunca deixar de ser ousado, de experimentar, de criar alternativas. A missão do líder é acertar na maioria dos casos de modo que os outros possam tentar, errar, tentar de novo, sempre, sem nunca perder a autoconfiança. Aliás, arruinar a autoconfiança de uma pessoa equivale a roubar património a uma empresa.»
Da mesma forma, foi questionado a Marie Blanchard, uma referência na área da liderança, em que consistia a liderança e ela respondeu: «Liderança é amor. É amar a sua missão, os seus clientes, os seus colaboradores e a si mesmo o suficiente para sair do caminho, para que outros possam ser magníficos.»
Nos dias de hoje, as empresas não têm estruturas organizacionais capazes de gerir as carreiras de todos os colaboradores, mas têm o dever de potenciar o valor das pessoas, respeitar e oferecer as ferramentas para que cada um, sem receios e opressões, possa lançar os seus próprios desafios no encalço da visão estratégica da empresa.
Ambientes inovadores convivem positivamente com o erro inteligente, o que contribui para fortalecer a confiança e o propósito dos seus componentes. Assim, parece-nos que o contexto do erro e consequentemente do fracasso fica relativizado sob o enfoque da inovação. Inovação e burocracia não andam de mãos dadas.
O maior erro que podemos cometer é o de ficar o tempo todo com receio de cometer algum.
A empresa que aposta no capital humano deve dar o suporte e conforto na queda quando acontecem os erros inteligentes, dado que isso é sinal do seu investimento na formação da pessoa, de que a reconhece pelo seu valor, pela entrega, pelo que esta agrega de bom à empresa.
De facto, é importante que na fase de recrutamento se encontre a convergência de interesses e visão entre a empresa e a pessoa, entre o que vai ao encontro do perfil e objetivos da empresa, aquilo em que pretende investir e, por outro lado, aquilo que o indivíduo tem delineado para a sua carreira. Isto, claro, a juntar a todos os aspetos que são de contemplar na fase de recrutamento acerca do perfil do candidato, se é uma pessoa que consiga dar soluções ou se tem um perfil mais operacional e de subordinação, se se identifica com a cultura da empresa e, mais importante, se a empresa está disponível para aceitar uma pessoa que se paute pela autonomia e não pelo controlo.
Mudança do mindset da empresa − há que refletir ainda sobre a forma como se pratica a gestão do capital intelectual da empresa. Esta outra vertente do conhecimento, a retenção de conhecimento/talento, baseia-se no facto de o sucesso das organizações depender em larga escala da forma como elas gerem e retêm o seu talento interno. Há que encarar o capital intelectual próprio da empresa como um asset, o qual, quando suportado de forma correta, confere um potencial incalculável à organização. Porquê gastar fortunas em apoio externo quando se está provavelmente a colocar «na prateleira» aquele conhecimento que levou por vezes anos a ser gerado, cuja triagem já fizemos em fase de recrutamento e que, se não for estimado e valorizado, irá, com certeza, partilhar o seu conhecimento com a concorrência? Nas organizações maiores começa a tornar-se uma tendência e é um desperdício total, humano e financeiro.
Só se conseguirmos ser líderes de nós próprios teremos as condições para liderar uma equipa.
Quais os seus talentos, competências e qualidades? Quais são os seus ativos internos atuais e quais os que necessita de desenvolver? Trace o seu plano de ação de valorização profissional.
Seja o manager do seu talento, o artesão da sua carreira e depois disso sim, estará apto a gerir uma equipa, uma unidade, uma organização, se for isso que ambiciona. Aprenda a conhecer o seu talento e daí será muito fácil reconhecer o talento nos outros, nos que já demonstraram capacidades e nos que não sonham que as têm e das quais as empresas andam à procura. Ao criar um ambiente propício, a empresa atingirá o seu potencial máximo na geração de valor.
Os indivíduos são complexos, cada um tem as suas ambições, necessidades, atitudes, desejo de responsabilidade, conhecimentos. O aumento de produtividade tem ligação direta aos relacionamentos interpessoais, atitudes, sentimentos e perceção das pessoas envolvidas, que se sentem especiais e pela primeira vez acham realmente que a administração está interessada em si e no seu trabalho.
A partir dos contributos históricos de Douglas McGregor (1906-1964), Abraham Maslow (1908-1970), Herzberg (1923-2000) e McClellond (1917-1988), podemos tentar reunir algumas conclusões sobre a forma como motivar pessoas no local de trabalho, mas é Rosebeth Kanter (1943), em artigo publicado na Harvard Business Review, que explica como as tools & techniques do passado estão desatualizadas, apresentando cinco ferramentas para o futuro, em termos de motivação. Destacamos o que nos diz acerca do autocontrolo e da ideia de que hoje as carreiras são cada vez mais incertas e o futuro das empresas menos previsível. Assim, o mínimo que se pode fazer para dar satisfação e qualidade de vida às pessoas que trabalham consigo é permitir-lhes que se sintam mais livres e responsáveis pelas suas vidas profissionais.
Devemos, por isso, ser exigentes quanto ao significado dos resultados mas sempre que possível delegar tarefas e a decisão sobre a forma como a equipa as deverá levar a cabo. Na Agile21 tentamos transmitir este conceito todos os dias e o resultado tem sido muito positivo e cada vez mais surpreendente.
Temos de abandonar a lógica de hierarquia a que estamos habituados e o poder que a caracterizou no passado, evoluir para uma maior compreensão e responsabilidade; no fundo, evoluir de uma lógica de controlo para autocontrolo.
Existem competências que identificamos como estando ligadas a uma maior facilidade de aprendizagem e outras competências que aprendemos e desenvolvemos ao longo da vida.
Posto isto, podemos dizer que todos temos talentos inatos, bem como limitações inatas e outras ainda que desenvolvemos ao longo da vida, mas a todas confere o denominador comum que se relaciona com transformação de conhecimentos, habilidades e atitudes na prossecução de um objetivo, de um compromisso, de resultados práticos. Enquanto as qualificações remetem para o contexto de funções e cargos, as competências manifestam-se no contexto da atividade de trabalho, ligadas à ação, e é aqui que se pode distinguir dos restantes e atuar. Por exemplo, ao nível das competências de caráter comportamental, tenha os requisitos psicológicos desejáveis para a organização para a qual trabalha. É isso que o vai diferenciar e ter impacto nos seus resultados. Interesse-se, esteja a par, domine o negócio. Conheça ao pormenor o que faz e saiba falar sobre tudo o que se relaciona com a organização.
A gestão do seu talento implica esta paixão pelo desenvolvimento profissional e das suas competências e isso só pode passar por dar sentido ao trabalho que faz a cada dia. Atuando ao nível do conhecimento, através de formação e treino, tendo uma atitude empreendedora, por via da atitude de presença, participação e informação, gera-se um ciclo virtuoso.
A verdade nua e crua é que quem não sente um propósito no seu percurso e progresso intelectual e profissional é um mero executante. O risco reside na possibilidade de se defrontar com o erro, com o insucesso, com ideias diferentes das suas, mas não tema nunca o erro inteligente, aquele que cometemos na busca incessante do conhecimento e é consequência da nossa perseverança, participação e ação proativa.
E vale a pena: podemos ir muito mais longe do que alguma vez sonharíamos chegar. É preciso dar o exemplo desse espírito empreendedor, generoso, e colocar o seu talento ao serviço da sua organização e dos demais – é para isso que lhe pagam (!) − mas principalmente de si próprio. Crie essas sinergias e avance sem medos.
Com a medida certa de trabalho, empenho, abertura ao feedback, autoconhecimento e autocrítica, estimule o seu talento, confiando em si mesmo, apaixonadamente.
Motivar-se, desafiar-se para a eficiência e formar máximas próprias são bases de partida para aumentar a sua produtividade e competitividade no mercado.
Emancipe-se, tome as rédeas da sua vida, da sua carreira, não se deixe abalar pela crise e pelos noticiários. Como diz o outro: não chore, venda lenços!
por:
Andrea Gueifão – Associated Agile21, CSO & Agile marketing diretor
Hugo Lourenço – Agile21 associated partner, CEO
Publicado na RH Magazine – Edição nº 82