Cândida Santos
Career Services Management e Docente na Porto Business School
Durante o verão de 2015, Pierre Nanterme, CEO da Accenture, anunciou que a empresa deveria repensar o seu sistema de gestão de desempenho, assumindo que, depois de décadas de servir o seu propósito, o modelo era massivamente desmotivador. As pessoas que trabalhavam na Accenture eram diferentes, não mais se motivavam por ser um número na escala de avaliação, mas antes por terem um propósito, estarem ligadas com pessoas, procurarem a verdadeira felicidade e contribuir positivamente para a humanidade.
É possível desencadear um melhor desempenho, indo ao encontro da motivação intrínseca das pessoas, promover que se sintam felizes no trabalho, ajudará a libertar mais energia. Por outro lado, auxiliar a encontrar um propósito para aquilo que fazem, será mobilizador e a ligação com os demais conduzirá a um maior envolvimento. Permitirmos que os colaboradores contribuam de modo significativo, fará com que se sintam apreciadas. Gerir e liderar, tendo em conta os impulsionadores fundamentais humanos, levará as pessoas a sentirem-se mais realizadas e a serem colaborativas e produtivas.
Esta nova realidade faz com que as organizações estejam cada vez mais focadas nas pessoas e menos orientadas para os processos e é nesse clima de mudanças, que vemos as empresas a terem a coragem de abandonar os seus modelos de avaliação de desempenho, focados na motivação extrínseca e tentar novas abordagens.
Assistimos a grandes alterações, dando prioridade à qualidade das interações e ao feedback qualitativo em tempo, bem como tornar o diálogo sobre o desempenho mais significativo, focado no futuro e no desenvolvimento.
A simplicidade é uma outra tendência, deixando os longos formulários, consumidores de tempo considerado completamente inútil. Cada vez mais focados na experiência dos colaboradores e no melhor desempenho, a simplicidade deverá começar nos processos de trabalho. Michael Armstrong disse no seu Handbook of Performance Management [1] que um sistema de gestão de desempenho deve ser “ridiculamente fácil de entender”, e isso é algo que as empresas começam a perseguir.
A tendência será seguir o exemplo dos gigantes globais como a General Electric e a Microsoft, que eliminaram a complexidade, as avaliações anuais, as reuniões de calibração e a avaliação de competências, escolhendo fazer conversas regulares de qualidade e feedback.
As empresas não precisam mais de tecnologia rica em recursos, pois é mais cara, menos confiável e atua como uma barreira à boa gestão de desempenho. A simplicidade será também tida em consideração em termos tecnológicos, com sistemas mais simples, leves, flexíveis, que deem suporte às conversas de feedback.
A associação do desempenho a remuneração e aos prémios está também ameaçada. Esse é um grande passo permitindo que as pessoas se sintam valorizadas, tornando-se por isso mais produtivas. As decisões sobre as remunerações podem ser tomadas tendo em consideração o mercado e o grau de responsabilidade. Por sua vez, os prémios podem ser baseados nos resultados da equipa ou no desempenho da empresa. Deste modo, será suprimida a subjetividade inerente à remuneração relacionada com o desempenho e economizando tempo e esforços significativos para todos.
Para muitas organizações, essa mudança é assustadora, temendo que seja desestruturadora. A McKinsey encontrou uma resposta e propõe uma abordagem, segundo a qual os esforços se deveriam concentrar na identificação e ajuste da recompensa apenas para os melhores e os mais baixos desempenhos, em vez de ser para todos.
O foco nos resultados da gestão de desempenho mudará. Cada vez mais, as empresas avaliarão a qualidade e o impacto da comunicação sobre a gestão de desempenho, entre gestores e colaboradores, assumindo o grande impacto que a qualidade dessas interações terá nos resultados individuais e coletivos. Conhecer esta realidade permitirá identificar quem são os melhores gestores e quem são aqueles que necessitam de suporte para desenvolver melhor as suas equipas.
Relativamente ao “software” de gestão de desempenho, a opção deverá recair sobre um processo contínuo, uma vez que as avaliações anuais são consideradas desajustadas e vão por isso caindo em desuso, dando lugar a conversas regulares sobre desempenho e feedback contínuo.
Os princípios do feedback contínuo e das reuniões regulares são simples e reconhecidos por todos como uma abordagem bem-sucedida, mas não podemos esquecer que novos hábitos demoram a serem adquiridos. Haver um software que incentive ativamente a realização dessas formas de gestão do desempenho, lembra às pessoas o que tem que ser feito e dá visibilidade sobre quem está e quem não está a realizar os vários passos essenciais para o sucesso do programa.
São diversas as empresas que têm mudado os seus modelos de gestão de desempenho, uns absolutamente revolucionários e outros menos disruptivos e mais de continuidade.
A Adobe, uma empresa americana que desenvolve programas informáticos com sede em San Jose, Califórnia, fundada em 1982, foi a percursora da mudança quando abandonou as avaliações anuais de desempenho em 2012. Em vez disso, passaram a haver check-ins regulares, suportados por comentários frequentes, positivos e construtivos. Não há classificações e é possível que cada área da organização determine com que frequência devem ser feitas essas conversas, de acordo com seus ciclos de trabalho. O resultado foi um aumento significativo no engagement e uma redução do turnover em cerca de 30%, desde que o novo processo se iniciou [2].
Um outro exemplo chega-nos da Deloitte, uma das grandes consultoras mundiais por todos nós conhecida, que considera ter poupado dois milhões de horas de trabalho com os seus check-ins semanais. Em 2015, aboliu as avaliações de desempenho anuais, o feedback de 360 graus e os objetivos em cascata, isto depois de calcular que esses processos consumiam uma quantidade de tempo notável – dois milhões de horas por ano, em toda a organização.
O novo processo da Deloitte exige que cada líder de equipa faça o check-in com cada membro da sua equipa, uma vez por semana, para discutirem prioridades e trabalhos de curto prazo, comentar os trabalhos realizados recentemente e dar orientações. Uma forma de garantir que esses check-ins aconteçam com a frequência desejada é definir que a iniciativa partirá dos membros da equipa, e não dos líderes. Trimestralmente, com base nos check-ins semanais, são feitas revisões, onde os líderes deverão responder a quatro questões, focadas no futuro, sobre cada membro da equipa. Aos líderes é perguntado onde veem o colaborador no futuro, em vez de querer saber qual a opinião que têm sobre o trabalho realizado.
A General Electric, um conglomerado de empresas multinacionais de Nova York e sediado em Boston, Massachusetts, durante décadas operou com o sistema “rank and yank”. Criado pelo seu ex-CEO, Jack Welsh nos anos 80, os colaboradores eram avaliados uma vez por ano, havia índices de desempenho anuais e curvas de distribuição forçada. Mas o que lhe deu o nome foi o facto de os 10% de colaboradores com os mais baixos resultados serem despedidos e essa não é exatamente a melhor receita para o engagement. Em 2015, a GE anunciou que passou a gerir o desempenho através de uma app (designada PD@GE – Performance Development at GE). Neste novo modelo, os gestores têm conversas frequentes de assessment do desempenho dos seus colaboradores quanto aos seus objetivos e prioridades. A app regista os sumários das conversas havidas, aloja notas manuscritas, documentos e gravações de voz. O foco do modelo reside na melhoria contínua. Não existirá, aliás, avaliação quantitativa. Os colaboradores podem requerer feedback a qualquer momento, a quem quer que seja que acompanhe o seu trabalho, com ênfase no processo de coaching permanente. O piloto do modelo teve lugar na equipa de people management, defensora e early adopter do mesmo. O propósito do novo modelo é tornar o feedback algo contínuo e fluído para toda a organização, mudar o vocabulário usado na gestão de desempenho e adotar tecnologias inovadoras para tornar o feedback fácil de dar e de receber, e produtivo para todos.
A Cargill, uma multinacional cuja atividade é a produção e o processamento de alimentos, introduziu um novo modelo que inclui conversas no local de trabalho, em vez das avaliações anuais. Começou por transformar os seus processos tradicionais de gestão de desempenho em 2012, quando introduziu o “Everyday Performance Management” [3]. Transferiu as classificações de desempenho e os formulários de avaliação anuais para conversas frequentes com os gestores e feedback regular e construtivo. Definiu como objetivos para o novo modelo recompensar e reconhecer regularmente os gestores que demonstrem boas práticas de gestão de desempenho no dia-a-dia, partilhar as experiências e dicas dos seus gestores bem-sucedidos, responsabilizar as equipas pela prática da gestão diária do desempenho e desenvolver as habilidades necessárias para ter sucesso na gestão de desempenho quotidiana, incluindo a comunicação bidirecional eficaz, feedback e coaching. O resultado foi impressionante, com 70% dos colaboradores da Cargill a afirmarem que se sentem valorizados como resultado das suas conversas contínuas sobre desempenho com o seu gestor [4].
E em Portugal, o que tem vindo a acontecer? A tendência é a mesma, agilizar e destacar os aspetos positivos, bem como perspetivar o desenvolvimento. O Grupo EDP, uma empresa global de energia, líder em criação de valor, inovação e sustentabilidade, desenvolveu o modelo Amplify, que considera ser o ciclo de desenvolvimento do colaborador, promotor do seu crescimento como profissional e como pessoa. O propósito do modelo Amplify é amplificar as competências e o desenvolvimento dos colaboradores, ajudando a construir o futuro das pessoas e da organização.
Por sua vez, o Super Bock Group, uma empresa portuguesa e com centro de decisão em Portugal, cuja atividade principal assenta no negócio das cervejas e das águas engarrafadas, face a mudanças registadas no contexto organizacional sentiu necessidade de reenquadrar e consequentemente definir um novo modelo de gestão de desempenho, que designou por RUMO. No acrónimo, o R significa resultados do negócio, o U uniformização e otimização, o M mercado e clientes e o O organização e pessoas. Os objetivos definidos para o modelo foram promover a partilha e o conhecimento dos objetivos, reconhecer e diferenciar o mérito, estimular a melhoria contínua do desempenho e mapear potencial e talento.
O Grupo Fidelidade, que atua na área dos seguros há mais de 200 anos, também mudou recentemente o seu modelo de avaliação de desempenho. O seu nome é FidBack, aproveitando o seu próprio nome, para um dos princípios do modelo, o feedback. Com esse novo modelo pretende fomentar e reconhecer o desempenho global, através da melhoria do desempenho individual e dos resultados, promover a meritocracia, a diferenciação, a responsabilização e o reconhecimento. Mas também envolver, motivar e comprometer as suas pessoas, suportar a melhoria contínua do desempenho individual, garantindo um alinhamento com a estratégia e objetivos organizacionais.
Embora os modelos de empresas portuguesas referidos não foquem de igual modo o detalhe, dão-nos conta das mudanças e do acompanhamento daquilo que são as tendências globais. Quando olhamos para o que estas organizações implementaram, podemos ver algumas tendências muito claras, que provavelmente serão a base da gestão do desempenho nos próximos anos. A conversas individuais de desempenho, ou check-ins, por iniciativa do colaborador, o feedback frequente e no contexto de trabalho, sem recurso à “sala dos terrores”, onde aconteciam as entrevistas de avaliação, numa perspetiva positiva e construtiva.
Vemos também os objetivos de curto prazo, e não os objetivos anuais, a serem revisitados regularmente, e as revisões de desempenho serem prospetivas, concentradas mais no desenvolvimento e coaching e menos na avaliação. Assistimos à queda das classificações quantitativas e aos suporte dos processos de gestão de desempenho feito por softwares on-line e otimizados para dispositivos móveis.