Este ano, a nova edição do “Estado da Nação: Educação, Emprego e Competências em Portugal” traz algumas novidades: para além de atualizar as metas propostas pelas Fundação José Neves (FJN) para 2040 e um conjunto de indicadores de progresso do país, foca-se na relação entre a educação e a produtividade, que hoje analisamos.
Este é um tema crítico, dado que o aumento da produtividade das empresas portuguesas e consequente melhoria da economia é crucial, para que os salários médios possam crescer e, assim, acompanhar o aumento de qualificações, limitando desta forma a fuga de talentos para o estrangeiro e aumentando a satisfação de quem investe em mais educação.
De acordo com os dados do Estado da Nação 2022, prevê-se uma relação positiva entre a produtividade e os salários pagos aos trabalhadores. Comparando a produtividade e o rendimento médio dos membros da União Europeia é percetível uma correlação clara e forte e que, portanto, quanto maior a produtividade, em média, maior o rendimento e salário médio dos trabalhadores. Por exemplo, em 2019, o Luxemburgo era o país com maior rendimento líquido médio da UE, na ordem dos 34.000€, e o segundo com maior produtividade (cerca de 172%), imediatamente abaixo da Irlanda com uma produtividade na ordem dos 177%. Já Portugal, estava entre o grupo de países da União Europeia com rendimentos e produtividade mais baixos, posicionando-se como o 7.º país com o rendimento médio mais baixo da União Europeia (apenas acima de países como Croácia, Bulgária, Eslováquia, Grécia, Hungria e Roménia) e o 6.º país com menor produtividade (apenas acima de países como Roménia, Polónia, Letónia, Grécia e Bulgária).
Em 2019, Portugal era o 7.º país com o rendimento médio mais baixo da União Europeia e o 6.º com menor produtividade
Desde o início do século XXI que a produtividade portuguesa nunca ultrapassou os 70% da média europeia, valor que atingiu entre 2006 e 2010 e depois novamente em 2013. Em 2019, antes do início da crise pandémica, cada trabalhador português produzia o equivalente a 66% do trabalhador médio da União Europeia.
Apesar da divergência da produtividade portuguesa face à média europeia, esta tem, em geral, registado uma tendência positiva nas últimas décadas. No entanto, após 2006, registou-se um crescimento muito menos acentuado da produtividade, seguido de praticamente uma estagnação, que, segundo o estudo da FJN, se deve, sobretudo, a fragilidade internas do país, como é o facto de Portugal continuar na cauda da Europa em termos de qualificações – é o país com a maior percentagem da população com baixas qualificações, ou seja, sem ter terminado o ensino secundário. Em 2021, este era o caso para 40,5% dos portugueses entre os 25 e os 64 anos, um valor que é mais do dobro do verificado em 23 países da União Europeia no mesmo ano.
Antes do início da crise pandémica, cada trabalhador português produzia o equivalente a 66% do trabalhador médio da União Europeia
Entre 2013 e 2019, a produtividade na maioria dos setores de atividade aumentou, contudo este efeito foi atenuado por uma realocação do emprego para os setores menos produtivos, como as atividades imobiliárias e as atividades de alojamento e restauração. O resultado é um aumento muito ligeiro da produtividade, que, de acordo com o estudo, poderia ser intensificado com uma realocação do emprego dos setores menos produtivos para os mais produtivos.
Qualificações e produtividade: uma relação direta?
As empresas com colaboradores mais qualificados são, em média, mais produtivas – uma vantagem que pode ser parcial ou totalmente anulada se a disparidade de qualificações dentro da empresa também for elevada. Isto significa que quanto mais próximas as qualificações dos trabalhadores entre si, independentemente do seu nível, maior a produtividade da empresa. Esta é uma conclusão particularmente relevante se considerarmos o enorme fosso das qualificações entre as gerações mais jovens e mais velhas: empresas com trabalhadores jovens (com menos de 35 anos) mais qualificados apenas conseguem ter ganhos de produtividade se o número de jovens na empresa tiver um peso significativo no total de trabalhadores.
Em particular, um aumento das qualificações dos trabalhadores com menos de 35 anos só se faz notar quando este grupo de trabalhadores representa pelo menos 40% da força de trabalho da empresa. Se estes jovens representarem entre 10% e 40% não há melhorias na produtividade e se forem menos do que 10%, o efeito na produtividade pode ser negativo.
Um aumento das qualificações dos trabalhadores com menos de 35 anos só se faz notar quando este grupo de trabalhadores representa pelo menos 40% da força de trabalho da empresa
Tal como se refere no relatório, este resultado sugere que o aumento das qualificações da geração mais jovem a que se tem assistido nas últimas décadas, pode não estar a contribuir para uma melhoria da produtividade por se enquadrar em empresas com uma força de trabalho maioritariamente mais velha e com níveis de qualificações inferiores.
E quando falamos em produtividade, não podemos depositar a responsabilidade apenas nos colaboradores. É certo que a produtividade é maior com colaboradores mais qualificados, mas também as qualificações dos gestores têm um efeito positivo neste indicador.
As qualificações dos gestores de empresas têm aumentado, mas Portugal continua a ter a maior percentagem de empregadores e gestores que não terminou o ensino secundário, seguido de perto apenas por Malta. Em 2021, este era o caso para 47,5% dos empregadores, praticamente o triplo da média europeia que se fixou em 16,4%, um aspeto que pode estar a limitar a produtividade da economia portuguesa.
Em 2021, 47,5% dos empregadores não tinham o ensino secundário completo
Formação: Uma aposta a favor da produtividade
A aposta na formação dos trabalhadores por parte das empresas também promove a produtividade, no entanto, ainda é uma minoria de empresas que aposta na formação dos trabalhadores.
Segundo um estudo que compara a performance de empresas portuguesas que receberam bolsas de formação do Fundo Social Europeu com outras empresas semelhantes que também concorreram, mas não as obtiveram, as empresas que foram apoiadas registaram aumentos de, pelo menos, 5% na produtividade, viram aumentar o número de trabalhadores também em 5%, o volume de vendas entre 5% a 15% e as exportações entre 2% a 15%.
Apesar dos benefícios da formação de trabalhadores para as empresas, 84% das empresas portuguesas não apostaram na formação dos seus trabalhadores em 2019. Das 16% que apostaram, a grande maioria promoveu efetivamente atividades educativas e formativas (93%).
84% das empresas portuguesas não apostaram na formação dos seus trabalhadores em 2019
A importância dada à formação varia, entre outros fatores, consoante a dimensão das empresas: em empresas com 500 trabalhadores ou mais, apenas um em cada 10 empresas não aposta na formação contínua dos seus trabalhadores. Por outro lado, são apenas 11% as empresas até 10 trabalhadores que o fazem. Também a idade dos trabalhadores tem influência, já que são os trabalhadores das idades intermédias (18 a 44 anos) que mais participam em ações de formação. Entre os mais velhos, com 65 e mais anos, a participação reduz-se a apenas 19%.
A disparidade também se faz notar ao nível das qualificações dos trabalhadores que participam em formação, com uma clara tendência para os trabalhadores com maiores níveis de escolaridade (Mestrado 58%, Licenciatura 49% e Bacharelato 48%) e em profissões mais qualificadas e, em geral, melhor remuneradas. Estes dados revelam que os trabalhadores menos qualificados e mais velhos são aqueles que menos participam nas ações de formação, possivelmente aqueles que mais beneficiariam de uma atualização de competências. Carlos Oliveira, Presidente Executivo da Fundação José Neves, já havia comentado este dado em entrevista à RHmagazine, realizada no âmbito da 1.ª edição do Estado da Nação.
“As pessoas mais qualificadas já perceberam as vantagens da Educação e, portanto, é-lhes mais fácil perceber porque é que têm de continuar a desenvolver competências ao longo da vida. Já as pessoas com menores qualificações não têm esta perceção, porque já passaram por essa realidade há muito tempo, acham que não vão ter nenhuma vantagem ou que a formação é para aqueles que já estudaram muito.”
(Re)Leia a entrevista, na íntegra, aqui.
De acordo com um inquérito internacional, 50% das empresas portuguesas consideram a formação dos colaboradores muito importante, um valor superior à média das empresas dos 27 países da UE (35%), mas a realidade é que são menos as empresas portuguesas que apostam efetivamente na formação.
Outro inquérito internacional, realizado a empresas com pelo menos 10 trabalhadores, revela que o principal obstáculo para as empresas portuguesas não apostarem na formação dos seus trabalhadores, apontado por 46,3% delas, é o elevado custo dos cursos de formação. Além disso, 40,5% das empresas portuguesas apontam a dificuldade em conciliar o tempo necessário para formação com o elevado volume de trabalho.
Siga-nos no LinkedIn, Facebook, Instagram e Twitter e assine aqui a nossa newsletter para receber as mais recentes notícias do setor a cada semana!
Excelente matéria e análise, vamos dar luz a esse estudo! Portugal precisa mais do que nunca dessa mudança para evoluir a tempo…e é através da VALORIZAÇÃO DA AREA DE RH nas empresas, investimento e senioridade dos profissionais na área, o caminho se tornará mais claro e ágil.