Autora: Joana S. Mendes, Psicóloga Clínica
G
reat Resignation tem sido um termo muito falado no meio dos Recursos Humanos e Gestão de Pessoas desde o final do ano passado. Foi criado por Anthony Klotz, um psicólogo organizacional que observou algumas tendências no mercado de trabalho americano que levaram a despedimentos em massa num ano que, apesar de incerto, trazia alguns sinais de recuperação.
Ele apontou quatro indícios que podem ter levado a essas demissões em massa:
a) Em 2020, muitas pessoas, por precaução, adiaram os seus despedimentos devido à incerteza que se fazia sentir e decidiram manter os seus empregos. Logo, com a recuperação económica todos esses despedimentos concretizaram-se.
b) Elevados níveis de “Burnout” reportados por muitos trabalhadores, tanto dos setores da saúde, tecnologia, como do retalho alimentar, o que levou a que a Organização Mundial da Saúde, em 2019, redefinisse a síndrome de “Burnout” como resultante de stress crónico no local de trabalho que não foi gerido com sucesso. A OMS refere ainda que o “Burnout” se revela em três dimensões: sentimentos de falta de energia e exaustão, aumento de distância mental do trabalho e diminuição da eficácia profissional e do desempenho. Elevados níveis de “Burnout” são sempre causadores de elevados níveis de “turnover”.
c) O trabalho remoto foi em 2020 a norma e, muitas pessoas, habituaram-se a ter mais flexibilidade nos horários, menos distrações, menos tempo no trânsito e menos gastos com combustíveis. Assim sendo, existe uma parte substancial dessas pessoas que não quer, de modo algum, regressar ao escritório e ao modo de vida que tinham. Como tal, preferem despedir-se e procurar um emprego/empresa que lhes permita trabalhar remotamente.
d) O isolamento e o confinamento obrigatório deram às pessoas a oportunidade de estarem em contacto com as suas emoções, de saírem do “piloto automático”. Muitas delas, pela primeira vez. Isto deu-lhes a oportunidade de se questionarem, reverem as condições dos seus empregos, perceberem o que queriam da sua vida, chegando muitas vezes à conclusão de que o emprego que tinham não se alinhava com os objetivos traçados para a sua vida.
Em suma, todas estas pessoas saíram dos seus empregos em busca de valorização profissional, melhor equilíbrio nas suas vidas pessoais e, sobretudo, saíram, por sentirem que o seu antigo emprego tinha um impacto negativo na sua saúde mental.
A saúde mental, o stress e o desgaste imposto pela pandemia da COVID-19 tem estado, de facto, nas bocas de todo o mundo, desde as redes sociais, jornais e até nas televisões ouvimos e bem: “É preciso cuidar da saúde mental das pessoas”.
Até há bem pouco tempo pensávamos na saúde mental como algo que nada tinha a ver com as empresas e o mercado de trabalho, como se as pessoas deixassem as suas inseguranças, incertezas, dúvidas e medos lá fora, antes de picarem o ponto. Nada podia estar mais longe da verdade e, estes dois últimos anos, têm sido exímios a mostrar isso mesmo. Líderes de equipa e outros cargos de chefia viram-se confrontados com algo novo, para o qual não estavam preparados: lidar com as dificuldades e problemas emocionais dos seus colaboradores. E foi exatamente quando os colaboradores começaram a relatar as crises de pânico, o vazio que sentiam, ou mesmo o mobbing que sofriam é que o pano caiu…e ainda bem. Esta tomada de consciência de que o colaborador é uma pessoa com sentimentos, emoções positivas e negativas, tem levado muitas empresas a contemplar no seu orçamento anual não só formação especializada para os seus líderes, mas igualmente apoio psicológico para que todos os colaboradores sintam de uma forma efetiva que o seu empregador lhes dá todas as condições para que possam prosperar na sua função.
Líderes de equipa e outros cargos de chefia viram-se confrontados com algo novo, para o qual não estavam preparados: lidar com as dificuldades e problemas emocionais dos seus colaboradores
E em Portugal, seguiremos esta tendência?
É ainda incerto se veremos em Portugal um despedimento massivo e voluntário de pessoas, como aconteceu nos EUA. Porém, são muitas as pessoas com talento que já se despediram ou que irão fazê-lo durante 2022. Isto é, sem dúvida, uma grande oportunidade para as empresas repensarem a sua atratividade perante os colaboradores e eliminarem esta desconexão que parece haver na relação entre trabalhador e empresa – o chamado Great Disconnet, visível na diferença entre aquilo que a empresa oferece e aquilo que o trabalhador procura.
Sugere-se, portanto, que as empresas equacionem as seguintes questões:
- Por quais valores se querem definir e apresentar-se ao mercado de trabalho?
- Que apoios querem dar aos seus colaboradores para que eles atinjam o seu máximo potencial?
- Que flexibilidades querem proporcionar aos seus trabalhadores?
- Qual o tipo de trabalhador que querem reter: os que vivem mais próximo das suas sedes ou os melhores do mundo?
Tudo isto resultará numa maior humanização da cultura organizacional e só com este olhar mais próximo, de igual para igual, será possível haver um matching bem-sucedido entre empresas e colaboradores que resultará, sem sombra de dúvida, na criação de locais de trabalho mais felizes e, consequentemente, numa maior retenção de talento.
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