A RHmagazine foi conhecer a Luisa Dornellas, Diretora do departamento de desenvolvimento e formação da CML e a sua equipa num momento de reinvenção e de criação de novas dinâmicas de intervenção e organização do trabalho, estimulando o recurso à conceção e realização de ações de programas de formação à distância.
A CML define e implementa formação para quase 10 000 colaboradores e ainda para os munícipes. Como está organizada para responder a públicos tão diferentes e a tantas necessidades diferentes?
Trabalhamos numa lógica de gestão de projetos, estando o departamento organizado por equipas /núcleos de trabalho. Definimos, para cada projeto, indicadores de monitorização e acompanhamento e praticamos uma avaliação liação sistemática dos resultados. Trabalhamos em rede e recolhemos ativamente as opiniões e sugestões dos nossos stakeholders, num exercício de reflexão e partilha, de forma a contribuir decisivamente para uma atuação mais eficaz e eficiente, no quadro da nossa missão. Assim, além das parcerias e protocolos com entidades externas, sejam Universidades, IPSS, ONG, Sindicatos ou Associações diversas, trabalhamos com uma rede de promotores de formação dentro da própria CML. Criámos a figura de Núcleo de Apoio à Formação em cada unidade orgânica (UO), garantindo a sua capacitação como promotores de formação, de forma a poderem exercer junto dos seus colegas, e em estreita colaboração com o departamento de desenvolvimento e formação (DDF), esta atividade complementar à atividade que desempenham nessa UO.
Uma das pedras de toque na equipa é a rotatividade em projetos, a polivalência de funções e autonomia de trabalho. Assim, por exemplo, um técnico além de ser gestor de formação pode ser formador de um determinado curso, integrar uma equipa de outra área ou mudar de unidade orgânica de que é técnico de ligação. Para uma organização como a CML, tal tem permitido não só a especialização de conhecimentos, como a oportunidade de diversificar atividades.
Em meu entender, esta forma de trabalharmos tem sido determinante para a consolidação da equipa em que os técnicos trabalham há muito anos, mantendo-os motivados e com uma performance elevada, não obstante a facilidade com que poderiam mudar de serviço na CML.
Ao revisitar a última análise SWOT realizada, verifiquei que se realçou como principais pontos fortes o compromisso da equipa com a formação, a existência de recursos humanos na CML altamente especializados em diversas áreas, a rentabilidade da Bolsa de Formadores, uma equipa com conhecimentos técnicos elevados no core business e a criatividade do departamento de desenvolvimento e formação (DDF). São estes resultados que me permitem sentir que é um privilégio liderar esta equipa, cujo desempenho foi decisivo para os resultados alcançados em 2020. Em termos globais, em 2020 promovemos 560 ações de formação, frequentadas por 5 289 participantes e acolhemos, em diversas unidades orgânicas da CML, 183 estagiários.
Como impactou a pandemia o vosso trabalho?
Mantenho, independentemente da pandemia, a convicção de que o investimento na formação e educação é fundamental, porquanto a qualificação constitui a chave para maior crescimento económico, mais emprego e coesão social. Assim, temos procurado encontrar soluções inovadoras no plano dos objetivos, nos modos de organização e nos meios utilizados, para responder ao inesperado desafio que a pandemia colocou a toda a sociedade portuguesa, e conseguir melhorar e aumentar rápida e sustentadamente as competências dos trabalhadores e os seus níveis de qualificação. Gerimos esta situação como um macro-projeto: era preciso, muito rapidamente, fazer o diagnóstico, o planeamento, a implementação e a gestão-controlo e ajustamento. Ao nível do diagnóstico, e ainda antes da declaração do estado de emergência nacional, identificámos todas as tarefas e projetos que a equipa poderia realizar em teletrabalho e providenciámos as condições de equipamentos de informática, instalação de software e acesso à internet, garantindo que todos pudessem trabalhar a partir de suas casas de forma remota e segura. Também garantimos que o DDF continuaria a responder, por meios remotos ou não, aos pedidos de informação sobre as ofertas de Aprendizagem ao Longo da Vida.
Num segundo momento, identificámos como poderíamos apoiar os trabalhadores e dirigentes proporcionando oportunidades de formação. Assumimos que a melhoria das competências digitais dos trabalhadores poderia contribuir para inovar nos serviços prestados, melhorando a eficiência operacional e o seu desempenho. Por outro lado, como sabemos, a oportunidade de aprender tende a deixar de estar confinada à sala de formação e ao horário rígido, para poder decorrer no tempo oportuno e local escolhido. Do ponto de vista pedagógico, a preocupação do ensinar foi substituída pelo criar condições de aprendizagem e, como tal, uma evolução dos conteúdos para os contextos, do papel para o online e do quadro para o multimédia. Por este motivo, e principalmente no momento que vivemos, as modalidades de formação à distância (e-learning ou b-learning) permitiram tirar o máximo proveito das tecnologias de comunicação atualmente disponíveis, colocando-as ao serviço das pessoas como suporte na formação e desenvolvimento pessoal, académico e profissional.
A pandemia trouxe uma nova forma de pensar a formação e obrigou, de forma positiva, os trabalhadores a “abrirem as portas” a novas modalidades de formação, bem como a adquirir ou melhorar as suas competências digitais para obter formação à distância. “Obrigou” igualmente os formadores internos da CML a adquirir competências digitais para adaptar os conteúdos formativos da formação presencial à formação à distância. Esta transição para a formação à distância já vinha sendo planeada para acontecer em 2020; a pandemia veio acelerar imenso a implementação deste processo e demonstrar a formandos, formadores e dirigentes da CML, a necessidade de existência de uma plataforma LMS para desenvolver a Formação à Distância.
Na prática a pandemia trouxe novas metodologias?
Claro, a retoma das atividades formativas obrigou à criação de novas dinâmicas de intervenção e de organização do trabalho, estimulando o recurso à conceção e realização de programas de formação à distância, tendo sido este o grande desafio que se colocou ao Departamento de Desenvolvimento e Formação da CML. Podemos dizer que adaptamos as metodologias que utilizamos na formação b-learning, transformando as sessões síncronas presenciais em sala em sessões presenciais à distância, através das ferramentas de comunicação online Teams e Zoom. Criámos webinários para explicar a utilização de ferramentas para a criação de conteúdos formativos digitais. Adaptámos o PRVCC (Processo de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências) presencial para o formato online através da plataforma Moodle, permitindo continuar, desta forma, os processos de reconhecimento, validação e certificação de competências escolares.
No âmbito da atividade do Centro Qualifica da CML, mantivemos a preparação dos candidatos, fazendo o seu acompanhamento à distância, utilizando diversas plataformas como o Teams, Zoom ou mesmo o WhatsApp. Assim, conseguimos que candidatos concluíssem o seu portefólio, vissem validadas as suas competências, e realizámos diversas sessões de júri online. Tal foi muito relevante para alguns cidadãos que, estando em situação de desemprego, puderam concluir este processo e assim obter as qualificações indispensáveis para celebrarem o seu contrato de trabalho. Outros, sendo trabalhadores da CML, aproveitaram desta forma a sua situação de teletrabalho para concluir um processo de aumento das suas qualificações.
Como resultado, registámos 1 872 participantes em formação online em 371 ações de formação online.
Neste quadro, criámos ou incrementámos programas, dentre os quais gostaria de destacar a Academia LXV+, as Aulas em Competências Digitais, o Programa de Coaching, a utilização da Plataforma moodle de formação em e-learning, a utilização da Plataforma Yammer e o Helpdesk Formação. A Academia LXV+ é uma plataforma que permite aos trabalhadores terem acesso a um catálogo de vídeos online, em Gestão e Soft Skills, provenientes de especialistas de formação em gestão, liderança, inovação ou empreendedorismo, e que tem como principais vantagens a autonomia, a facilidade de acesso em possuir conteúdos interessantes, motivadores e multiplicadores, sendo assim um complemento à formação tradicional. As Aulas em Competências Digitais na página de Facebook do Centro Qualifi +Valor LX resultaram da necessidade de interromper as oficinas do PILD-Programa para a Inclusão e Literacia Digital. Para não parar o programa, adaptámos ao suporte Facebook as aulas digitais do Passaporte Competências Digitais. Estas aulas tiveram mais de 10 200 visualizações e mais de 30 mil minutos de aulas digitais visualizadas. O Programa CoOl – Progra31ma de Coaching – Estamos aqui para si pretende apoiar os trabalhadores, de todas as categorias profissionais, a encontrar novas ferramentas para lidar com a realidade atual, facilitar o ajustamento a novas formas de trabalho, auxiliar no processo de readequação do comportamento social e ainda contribuir na gestão das novas rotinas.
Nesta fase em que as dinâmicas profissionais, pessoais e sociais se alteraram, a DMRH/ Departamento de Desenvolvimento e Formação, proporciona aos trabalhadores da CML um programa de Coaching. A participação neste programa é voluntária, gratuita e totalmente confidencial. Também continuamos a trabalhar na procura e reforço de potenciais e-formadores e a desenvolver trabalho com os coordenadores de formação, visando a transformação e/ou criação de cursos na modalidade de e-learning na Plataforma moodle de formação em e-learning, bem como visando a criação de condições para os Técnicos da CML realizarem o seu trabalho online na Plataforma Yammer. No seguimento de orientações do vice-presidente, foi apresentada uma proposta de implementação de um sistema de Helpdesk Formação organizado em duas vertentes. A primeira destina-se à obtenção de respostas sobre a formação e a segunda à aquisição/aperfeiçoamento de conhecimentos e competências.
Sentiram necessidade de desenvolver novos cursos?
Não só sentimos necessidade de adaptar a oferta formativa a uma nova modalidade, já que os cursos decorriam genericamente na modalidade de formação presencial, como necessariamente surgiram novos cursos, sobretudo de suporte à utilização de novas aplicações informáticas pelos formadores, como forma de organizarem cursos de formação online. Exemplo disto é o curso sobre a “Plataforma Moodle”, o curso sobre Cibersegurança na utilização dos serviços públicos digitais, o de Design Thinking, o de Plantas Aromáticas ou o curso sobre Liderança Remota, entre outros.
A Luísa trabalha na CML há muitos anos. Viu evoluir o mercado de trabalho e as competências dos colaboradores da CML durante muito tempo. Como são os talentos atuais em relação aos mais antigos?
As pessoas são cada vez mais preparadas e detêm não só mais competências como são capazes de realizar trabalhos mais diferenciados. Hoje, um técnico na administração pública, tal como nas empresas, realiza com maior autonomia o seu trabalho e tende a conhecer o contexto externo nos domínios em que trabalha. A globalização e as novas tecnologias de informação e comunicação mudaram totalmente a forma como se trabalha.
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Qual o maior desafio atualmente no departamento de formação da CML?
Face às novas exigências da sociedade, sobretudo em relação aos municípios como instituições públicas de gestão em proximidade, o desafio nos RH tem que ver com as alterações tecnológicas, estruturais e económicas que todos observamos, e que afetam todos os aspetos da nossa vida, bem como o facto de o perfil do munícipe se estar a alterar. Portanto, os desafios serão responder às atuais e novas necessidades dos munícipes, e da sociedade, utilizando os meios técnicos, tecnológicos e humanos que temos à disposição, para responder de forma mais rápida, eficaz, eficiente e realista. Isto implica, naturalmente, aprendizagem permanente e desenvolvimento contínuo de novas competências, algumas previsíveis, outras que ainda não conhecemos. Assim, o desafio em termos de RH será captar, manter e desenvolver talentos nas áreas que sustentam os processos e as tomadas de decisão; a que hoje já é um desafio é a área das TICs (esta questão é crítica para as instituições da administração pública (AP), dado que o mercado para os diplomados em informática é muito competitivo, até internacionalmente, e a AP não consegue, com as carreiras e tabelas de remuneração, ser atrativa), da análise de dados para sustentação científica das tomadas de decisão (como foi evidente agora durante a pandemia) ou ao nível dos interfaces de comunicação e prestação de contas aos munícipes (as redes sociais, as APPs e outras interfaces que vão surgindo). Prevejo que, se o mercado não responder a estas necessidades, teremos de recrutar e fazer esta formação internamente, o que será um enorme desafio, mas em que já tivemos sucesso noutras áreas, com a formação, por exemplo, de Jardineiros e Calceteiros.
Um outro desafio, acelerado pela pandemia, tem que ver com a organização do trabalho, quer do ponto de vista dos espaços e dos fluxos de trabalho, quer a nível do teletrabalho, que é muito mais do que apenas trabalhar remotamente. É, parece-me, um desafio que implica uma alteração da cultura do trabalho em Portugal, e sobre o qual, penso, continuaremos a refletir nos próximos tempos. Outra questão tem que ver com a saúde mental, mercê das pressões que a vida moderna nos traz e que, felizmente, começa a ser uma questão mais democratizada e abordada numa perspetiva de prevenção. E como este período de pandemia nos obrigou a perceber, o desafio maior é colaborarmos, trabalharmos em equipa, valorizando as competências de cada um para o bem comum. E há o desafio permanente de quem gere RH (eu prefiro dizer Pessoas ou Talentos, que me remete para a complexidade e o aspeto humano dos “recursos”): ter pessoas motivadas e identificadas com a cultura da CML, que tenham orgulho em trabalhar na CML, pessoas sensíveis às necessidades dos outros (sejam eles os munícipes, sejam eles os seus colegas e outros atores municipais) e com gosto em aprender sempre, sem estarem limitadas pela sua área de formação académica.
Entrevista completa publicada na RHmagazine nº 132 (Janeiro/fevereiro 2021)