Pedro Ramos, Presidente da APG – Associação Portuguesa de Gestão de Pessoas
F
icará para a História que houve um dia uma pandemia que veio mudar todos os paradigmas relacionados com a organização do trabalho, com os modelos de relacionamento e de liderança das pessoas nas empresas, com as dimensões tempo e espaço nas organizações, com os processos de vinculação e reconhecimento e, sobretudo, veio abalar as anteriores ideias e “verdades” associadas à gestão e medição de competências detidas pelas pessoas e o contributo destas para o sucesso do negócio.
No fundo, os últimos tempos vivenciados por todos nós trouxeram-nos novos (ou completamente renovados) desafios no que respeita à gestão de “todo o universo do talento” nas nossas empresas.
Desde logo, os tais talentos ganharam um enorme protagonismo e até capacidade de influência e negociação dado à elevada exposição do seu grau de criticidade em determinados contextos como resposta emergente aos desafios dos negócios. No sentido inverso, as empresas e as suas lideranças compreenderam que novas formas de relacionamento, de vinculação e, sobretudo, um mais alargado conceito de “atração permanente” de talento teria de ser rapidamente construído, desenvolvido e implementado sob pena de perda de poder acentuada no novo jogo da gestão do talento.
Mas, vamos por partes
Estamos hoje a viver num (novo) mundo BANI ! Um mundo verdadeiramente Frágil, profundamente Ansioso, estranhamente Não Linear e perigosamente… Incompreensível!
Isto necessariamente quer dizer que estamos hoje também a “jogar um jogo de talento” nas empresas, sobre o qual não conhecemos todas as regras em jogo… Será que conhecemos todas as peças do tabuleiro ao nível do comportamento que cada uma pode de repente adotar? E, ainda mais difícil…, será que as regras do jogo não podem mudar de um momento para o outro sem sequer que nos apercebamos?
Os talentos ganharam um enorme protagonismo e até capacidade de influência e negociação dado à elevada exposição do seu grau de criticidade em determinados contextos como resposta emergente aos desafios dos negócios
Pois é, no atual contexto não é certo que consigamos dominar e controlar todos os processos, que consigamos concretizar todos os planos e planeamentos por mais robustos que nos possam parecer, que possamos derrubar ou ultrapassar todos os obstáculos (vamos chamar-lhes “desafios”, certo?) por mais habilitados e armados que possamos pensar estar face aos atuais quadros relacionais dentro das nossas empresas.
Por outro lado, no meio de toda esta incerteza quanto ao presente (para não falarmos de futuro!) da gestão das pessoas, restou-nos apenas uma certeza das várias que tínhamos antes de todo este processo – a certeza de que só é possível vencer o jogo do negócio se tivermos os melhores jogadores.
Mas estes melhores jogadores são, afinal, as pessoas que passaram a ter o tal maior protagonismo e capacidade de negociação fruto das circunstâncias que falámos no início. E, pois é… já estamos de novo a falar de gestão de talento nas empresas.
Segredos para obter os melhores? É segredo! Os segredos não podem ser revelados…
Mas já que não nos contam o segredo, podemos ir experimentando… upss… eu disse “experimentando”? Pois é, hoje vivemos num mundo verdadeiramente experiencial. Numa era em que cada pessoa quer viver (e sentir) a melhor experiência da sua vida em cada momento… Isto é válido nas nossas vidas pessoais, como é válido na vida das organizações.
Por isso, e finalmente, falar de proporcionar boas experiências aos nossos colaboradores não pode ser apenas discurso de boas-vindas no onboarding, tem mesmo de ser a prática efetiva das empresas em todos os processos de gestão das pessoas.
Falar e proporcionar boas experiências aos nossos colaboradores não pode ser apenas discurso boas-vindas no onboarding, tem mesmo de ser a prática efetiva das empresas em todos os processos de gestão das pessoas
As pessoas sentem-se atraídas, cada vez mais, por projetos (empresas) onde acham que podem vir a viver e experimentar novos desafios, novas formas de estar, mas também onde possam sentir que podem contribuir para uma “pegada” maior para si e para uma comunidade que já vai bem para além dos “muros” psicológicos e sociais (pois os “muros” físicos das empresas já deixaram de existir) das suas empresas. Sim, estamos a falar de propósito pessoal e da sua relação com o propósito maior da organização, mas também estamos a falar de uma ideia cada vez mais lúcida das pessoas sobre o que pode ser o bem-estar e a sua felicidade num determinado contexto organizacional independentemente da sua função ou nível hierárquico.
Ora, se as pessoas se sentem atraídas às empresas e aos projetos profissionais por fatores diferentes, e essas pessoas acabaram de ganhar um capital e poder decisor sobre as suas vidas, então as empresas têm de restruturar todos os seus modelos, processos e práticas de gestão dessas pessoas em linha com essas novas formas de estar e viver nas organizações.
Estamos, desta forma, a lançar pistas para o tal segredo do sucesso que ninguém sabe qual é, mas que não custa ir tentando para ver se resulta.
E resulta a apresentação e exposição das boas práticas de RH em termos de “montra” organizacional de experiências que potenciam a atração e a captação dos tais melhores jogadores… E resulta a construção do conjunto de narrativas certas e o adequado storytelling com base no envolvimento efetivo das pessoas nas empresas numa lógica de vivência de boas experiências que, de forma continuada, contribuam e sustentem os processos de vinculação, envolvimento e “atração permanente”* das pessoas, os tais talentos, às nossas
empresas.
As boas práticas das empresas são afinal o garante de que vale a pena tentar, empreender, conceber, testar, experimentar…fazer diferente e fazer melhor como forma de posicionamento no “mercado dos talentos” mas, mais do que isso, no quadro da criação das condições ideais de sinergia entre as melhores experiências das e para as pessoas e os melhores resultados dos negócios das empresas.
As boas práticas das empresas são o garante do quadro da criação das condições ideais de sinergia entre as melhores experiência das e para as pessoas e os melhores resultados dos negócios das empresas
Constituem, desta forma, desafios à nossa capacidade de atrair os melhores e de os manter atraídos continuadamente ao longo da sua jornada na empresa, numa lógica de alinhamento entre pessoal e organizacional, de agregação de valor para si e para os outros, de marca efetiva e distintiva de contribuição no sucesso do negócio da sua empresa que no fim do dia vão fazendo crescer os tais conceitos essenciais para sobreviver ao tal mundo BANI – confiança, envolvimento, vinculação, desejo de superação, felicidade e experiência muito positiva!
E é neste momento verdadeiramente experiencial, no qual cada pessoa na empresa tende a querer sentir-se como única e especial, assumem especial relevância as boas práticas que potenciam estas dimensões experienciais, mas também os processos e modelos mais “à medida” de chegar, envolver e apaixonar, cada uma das nossas pessoas nas empresas. A comunicação emocional, modelos de liderança de envolvimento e “mão na massa” e ferramentas cada vez mais ágeis, flexíveis, digitais e que permitam ações ao momento, fazem cada vez mais a diferença enquanto boas práticas de captação e de atração permanente ou continuada dos talentos nas empresas.
Se há uma verdade que acabámos por obter nestes últimos tempos é que…não há mais verdades absolutas! Ninguém – líderes ou liderados – sabe exatamente como pode ganhar o tal jogo. Por isso, é hora de testar, tentar, errar, mas sobretudo, partilhar os sucessos e os insucessos numa lógica de aprendizagem e construção de conhecimento interno.
Se há uma verdade que acabámos por obter nestes últimos tempos é que… não há mais verdades absolutas! Por isso, é hora de testar, tentar, errar, mas sobretudo, partilhar os sucessos e os insucessos numa lógica de aprendizagem e construção de conhecimento interno
Para as outras empresas e equipas, a partilha das nossas boas práticas tem tudo a ver com aquela essencial “competência do presente” que nos conduzirá ao futuro das empresas – a generosidade!
Quando se partilham boas práticas não se faz apenas marketing individual das ações unilateralmente, nem devemos entender como algo do tipo “lá estão estes a querer dar nas vistas”, mas generosamente ajudamos os outros a crescer e a desenvolver-se através das partilhas que fazemos e, quase sempre, generosamente recebemos sempre algo igualmente importante em troca.
Boas práticas e boas partilhas é o desejo da APG – Associação Portuguesa de Gestão das Pessoas!
*Já perceberam que eu fujo sempre da palavra “retenção”, certo? Tenho para mim, como venho referindo noutros momentos, que as pessoas não gostam de ser “retidas”. Permitam-me a analogia aos relacionamentos pessoais: alguém numa relação permanecerá feliz se souber que a outra pessoa tem “na manga” uma estratégia para a reter? Se num relacionamento pessoal não faz sentido falar em retenção, porque no relacionamento entre empresa e colaborador insistimos em falar em reter ou em retenção? Uma vez mais, como nos relacionamentos pessoais, cada um de nós inicia uma relação porque se sente atraído por outra pessoa e manter-se-á nessa relação se ambas as pessoas envolvidas “trabalharem” para se continuarem a atrair mutuamente. Cada um de nós quer continuar a ser atraente e quer continuar a ser atraído/a pela outra pessoa! E esse relacionamento vai durar enquanto a “experiência pessoal” de cada uma das pessoas envolvidas estiver em níveis extraordinários… ou, pelo menos, positivos. Deve ser assim nas empresas! Estamos a falar de uma ATRAÇÃO PERMANENTE ou continuada, com foco em proporcionar excelentes experiências aos nossos colaboradores para que estes mantenham os níveis de envolvimento em alta e que sintam a necessidade de continuarem a investir para continuarem a ser atraentes e atraídos pelas suas empresas e pelas suas lideranças.
Artigo publicado no suplemento especial “Melhores Práticas em RH” que acompanhou a edição n.º 140 da RHmagazine, referente aos meses de maio/junho de 2022.
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