Isabel Padinha deixou para trás 13 anos no setor da banca, para se tornar, primeiro, agente Bimby e, depois, country manager da multinacional alemã que a comercializa, em Portugal.
Isabel Padinha era apenas um número entre tantos outros. Descontente, viu o seu trajeto profissional alterar-se depois de uma viagem de 300 quilómetros com destino ao Porto. No norte do país conheceu a Bimby e a Vorwerk, a multinacional alemã que a comercializa, e trouxe na bagagem um robô de cozinha e um sonho em fermentação. Tornou-se agente Bimby e o sucesso dos primeiros meses de vendas refletiu-se no convite dos alemães para liderar a marca, em Portugal. Nos dois pratos da balança estavam os 13 anos de experiência no setor da banca e um novo desafio, que a country manager da Vorwerk abraça desde 2003. Apaixonada por pessoas, Isabel Padinha conhece o rosto e o nome dos 120 quadros, distribuídos pelas 13 lojas abertas ao público e departamentos de informática, logística, contabilidade, marketing e advisors relationship management, e de muitos dos 1500 consultores que integram a empresa no território português. Lidera com base no exemplo, sem perder de vista as lideranças que observou, e aposta no desenvolvimento do “extraordinário” capital humano que a rodeia, porque com investimento e envolvimento “as pessoas são capazes de ir mais longe”.
Revê-se na liderança da Vorwerk Portugal?
Com certeza que me revejo, porque acho que sou um bocadinho a cabeça deste projeto de formação. Estou ao comando deste barco desde 2003 e, desde esse ano, temos sempre um budget muito específico para investir na formação, não só técnica, como também comportamental, porque acreditamos que as pessoas podem mudar e eu acredito que a formação pode ajudar muito a alavancar essa mudança. Na Vorwerk, focamo-nos muito na formação, tanto lá fora, aos nossos consultores, como cá dentro. Se me pergunta se o investimento em formação aos quadros é igual a todos os níveis, respondo-lhe que não. A área comercial, como é uma área de vendas, tem um foco maior na formação, comparativamente com a formação que têm os meus colaboradores da contabilidade, por exemplo. Mas posso dizer-lhe que sempre que fazemos uma ação comercial alargada e temos um speaker, ou alguém que vem dar uma palestra convidamos sempre todo o staff, para nos ajudar a pensar fora da caixa, porque, no fundo, estou no backoffice, mas tenho uma responsabilidade por todas as 1500 pessoas que estão no terreno e que vivem e pagam as suas contas deste trabalho. É muito importante que exista uma comunicação com uma espinha dorsal, top down e de dentro para fora.
É uma liderança que se materializa, sobretudo, com a aposta na formação?
É uma liderança com foco nas pessoas e digo-lhe porque é que vejo isto assim. As empresas normalmente têm uma estrutura. Posso dar-lhe o meu organigrama e se construir a sua empresa pode copiá-lo. Têm uma estratégia e cada empresa tem a sua, mas também é copiável. Têm as tecnologias e a quarta dimensão das empresas diz respeito às pessoas e esta é a única área que não se copia. Para mim, quando investimos nas pessoas e as envolvemos, elas são capazes de ir muito mais longe e dar-nos aquilo que não pedimos. Daí que sonhe com o investimento nas pessoas, no seu desenvolvimento pessoal, porque acredito que todos nós, com o apoio certo, motivação e formação certas, somos capazes de nos desenvolver para um patamar superior. Tenho um capital humano nesta empresa que se reflete em resultados extraordinários.
A Bimby foi eleita, em 2018, pela oitava vez consecutiva, uma Superbrand. Atribui os resultados alcançados ao capital humano que compõe a empresa?
Se nós não tivéssemos as pessoas certas, com a formação certa, com princípios éticos, com valores e que vivessem o espírito Bimby desta forma, duvido muito que tivéssemos os resultados que temos, sobretudo quando, de há uns seis anos para cá, temos vindo a assistir a uma proliferação de robôs de cozinha no mercado, onde somos pioneiros e onde nos copiaram o estilo, a forma e a abordagem. Há, no entanto, uma coisa que não se copia – as pessoas. O nosso capital humano é realmente extraordinário.
E a liderança que hoje preconiza resulta das lideranças que foi observando?
No meu percurso profissional, assisti a muitos estilos de liderança, uns melhores, outros menos bons e creio que fui absorvendo como uma esponja tudo aquilo que não quereria ser se estivesse ao comando de uma empresa. Liderar é ser exemplo e, nos dias em que tenho de tomar decisões difíceis, tento sempre calçar os sapatos do outro, perceber como se vai sentir com o que vou dizer e tentar levar as pessoas àquilo que eu quero, sem que tomem consciência que a decisão é minha. É delas. É muito desafiante este trabalho de liderança. O meu pai morreu quando tinha 18 anos e eu queria ir trabalhar e ter o meu dinheiro. Fui, então, para o ISLA e fiz um percurso de acompanhamento de CEOs, assistentes de direção e administradores, que me permitiu observar durante muitos anos o que era isto de liderar pessoas. Se houve pessoas com quem me identifiquei e que guardo memórias muito positivas do que é ser um líder, houve outras que tive a certeza que nunca quereria copiar, nem ser. Sabe aquela frase “diz-me e eu esquecerei, ensina-me e eu lembrar-me-ei, envolve-me e aprenderei”? Sinto que quando envolvemos as pessoas, elas dão-nos de uma forma surpreendente.
Os agentes Bimby, constituindo-se como trabalhadores independentes, não usufruem da política de recursos humanos da empresa. Que apoio lhes prestam?
As leis laborais para colaboradores independentes são muito restritas e há determinadas ações que nós não podemos fazer com eles. Ainda assim, ao longo dos anos, temos vindo a investir muito na formação destas pessoas no terreno, porque, no fundo, são a ponte entre a Vorwerk e o cliente. Privilegiamos uma comunicação que tenha uma linha condutora e que seja sempre a mesma daqui para fora. Os consultores dos clientes têm, todas as semanas, uma reunião às terças-feiras, preparada pelos seus líderes de equipa e gestores de loja, que visa motivá-los, porque se há semanas que correm bem, há outras que correm menos bem. É preciso motivar muito estes profissionais, porque a vida de um consultor não é fácil. Nós dizemos que podem viver todos os estágios da felicidade, da euforia, do desânimo e do desalento em menos de 24 horas. É muito importante olhar para os objetivos, ver o que se fez e preparar a semana seguinte. Temos esta ciclicidade semanal de verificação do trabalho no terreno e do estado emocional dos nossos consultores. O programa de formação dos agentes no terreno é muito diferente do programa de formação que temos aqui, na sede.
Que diferenças apresentam?
Temos uma academia de vendas destinada aos nossos agentes no terreno e uma academia para os nossos líderes de equipa, que são os pilares intermédios entre o agente e os nossos quadros, porque fazem a ponte com as gestoras de loja. Os líderes de equipa têm uma academia mais vocacionada para a liderança e para o feedback. Temos, também, a academia para as nossas gestoras de venda, que já são quadros da empresa e que têm uma formação muito direcionada para a liderança, motivação e feedback.
Qualquer colaborador, no exercício da sua profissão, carece de motivação, especialmente os comerciais, que, como dizia, conhecem todos os estádios da felicidade e da tristeza num só dia. Como é que se motivam estes colaboradores?
Na nossa organização semanal há um grande foco em mecanismos de motivação. Motivar significa motivos para ação e compete-nos a nós, enquanto empresa, dar-lhes motivos para se colocarem em ação. Fazemos muito reconhecimento. Eu recebo cartas incríveis de pessoas que trabalham noutros lados e que me escrevem a dizer que, em 20 anos, nunca receberam um obrigado de um diretor e sentem que aqui, a cada terça-feira, há uma palavra de incentivo, um obrigada e o mostrar de um caminho para se continuar e isso é extraordinário. Nós não temos o perfil típico de um agente no terreno. Temos como consultores pessoas licenciadas, com mestrados, enfermeiros, um médico, donas de casa, pessoas de um estrato social mais elevado e de um estrato social mais modesto e eu acho que é nesta diversidade de caráteres que se encontra um equilíbrio, porque, e como digo sempre, quando o aluno está pronto o professor aparece. Se nós quisermos, vemos professores em todo o lado.
Quando investimos nas pessoas e as envolvemos, elas são capazes de ir muito mais longe e dar-nos aquilo que não pedimos.
Valorizam determinados requisitos para o desempenho da função comercial?
Dois: a atitude e a vontade. Na formação base dizemos que a nossa atitude determina a nossa altitude. Aqui não há barreiras. Se nós quisermos aprender, partilhar, experienciar e sermos humildes, “the sky is the limit”. Nós recebemos, durante a crise, pais desempregados que encontravam, a cada terça-feira, um motivo para caminharem e foi aqui que muitos aprenderam a voar para outras áreas e tiveram a esperança de que o amanhã pode ser diferente. Nas empresas olha-se muito para um currículo académico. Quando entrevisto um candidato, olho para o currículo para ver as competências técnicas, mas entre uma pessoa sem mais experiência que um 19 e uma pessoa com um 12, que já fez um mochilão, faz voluntariado, tem filhos, que se preocupa em estar cedo em casa para fazer a segunda fase da sua vida, porque nós não temos de estar aqui até às oito da noite, valorizo mais as características da segunda do que um 19. Também abrimos o mercado de trabalho a mulheres que depois dos 40 anos lhes viram ser fechadas todas as portas. Quando aqui entraram estavam postas de parte e, hoje, são o “homem da casa” e empresárias em nome individual. Têm o seu próprio negócio e, com ele, sustentam-se, sustentam os filhos e acalentam os sonhos de uma família e isso é espetacular.
Dizia que os colaboradores não têm de ficar para além da hora. Faz questão que bebam dessa filosofia?
Na sede a gestão é completamente diferente da de lá de fora, porque os agentes são profissionais livres que não têm horário. Aqui dentro, privilegio muito uma vida para além do trabalho, porque acredito que traz equilíbrio e colaboradores mais felizes, com uma entrega enorme, no tempo que cá estão. Nós picamos ponto porque a lei nos obriga a fâze-lo, mas eu não o controlo e se uma colaboradora precisar de ir ao cabeleireiro amanhã de manhã, desde que tenha o seu trabalho feito, convivo muito bem com isso e elas até brincam comigo e dizem que sou a única diretora que as manda para casa ter filhos, mas sei que a maternidade traz equilíbrio e felicidade e um filho que tenha um irmão vai ser uma pessoa completamente diferente se conhecer o sabor da partilha. Vivo isso na minha vida pessoal e nos bancos via pessoas a preencherem horário até às oito da noite sem fazerem nada e pensava “que tristeza ser um chefe que sabe que estou aqui, porque é bonito sair às oito, quando existe uma vida privada para se viver e que fazia de mim uma colaboradora muito mais realizada, criativa e fértil para a empresa”. Lembro-me de ter grandes guerras com a minha chefia, quando me tornei num dos 20 mil colaboradores de um banco muito grande, que comprou o banco pequenino onde trabalhava e que empregava 60 profissionais, porque às seis horas me ia embora e não abdicava de ser mãe dos meus filhos. Como vivi isso na pele, sou muito flexível com as minhas pessoas e não me importo se quiserem trabalhar a partir de casa. Não contabilizo horas. Contabilizo tarefas. Se as tarefas estiverem bem feitas, podem fazê-las onde quiserem. Não é preciso estarem aqui e isto para as pessoas que aqui trabalham é muito importante. Se os meus colaboradores são super criativos? São. Se são extraordinários? São. Temos muito para melhorar? Temos.
Tem conhecimento de profissionais que se despediram para integrar a Vorwerk?
Tenho muitos casos, mas sabe uma coisa muito engraçada e que também nos deixa a pensar? Para as pessoas, o dinheiro não é tudo e para mim não é, sinceramente. No equilíbrio entre “aqui sou feliz” e “ali ganho mais”, tenho visto, ao longo dos anos, prevalecer a escolha do “aqui sou feliz” e isso é muito gratificante para nós e, para mim, é o retorno não quantificável do investimento que faço na formação das pessoas. Já trouxe speakers incríveis que, de outra forma, não teriam oportunidade de ouvir. Tinha um sonho de dez anos que acabei de concretizar – trazer o Augusto Cury a Portugal para dar uma palestra às minhas pessoas. Demorou-me dez anos, mas foi cumprido. Trouxe, também, a María Belón e puderam ver a pessoa que originou o filme O Impossível, que sofreu uma adversidade tremenda, que não tem uma perna e que hoje faz voluntariado aos refugiados. São oportunidades que não são quantificáveis numericamente, mas que trazem uma identidade muito própria à Bimby.
Ouvem as opiniões dos profissionais?
A Vorwerk Internacional tem um sistema de medição da satisfação dos colaboradores que se realiza a cada dois anos – o EAR (Employees Are Responding). Este ano, excecionalmente, vai ser a três. Nós temos dois pelouros na sede – o administrativo e o comercial – geridos por pessoas diferentes, que reportam diretamente à Vorwerk Internacional. Na minha área, a comercial, a taxa de resposta ao último EAR foi de 100%, o que é raro acontecer. Não aconteceu em nenhum país da Vorwerk, na Europa, e o índice de satisfação foi de 97%. Esta atitude mais liberal traz-me muita satisfação. Se for ali dentro e o colaborador não estiver na secretária, não me faz confusão nenhuma, porque sei o colaborador que tenho, conheço as suas capacidades e o potencial de trabalho que me entrega. Há áreas onde as coisas não são tão liberais, se bem que tenho consciência que há funções que têm horários fixos. Eu não posso ter uma telefonista que chega às dez horas. Se entra às nove horas é as 8h55, mas posso encontrar outro tipo de compensações para esta pessoa. Portanto, estou muito tranquila. Não chego a todos, obviamente, e também tenho os meus defeitos. Sou humana, não tenho 100%, mas estou muito feliz com os 97%. Trabalho e esforço-me todos os dias por fazer mais, melhor e diferente.
Lembro-me de ter grandes guerras com a minha chefia, porque às seis horas me ia embora e não abdicava de ser mãe dos meus filhos.
Que futuro ambiciona para a Bimby em Portugal?
Comecei com um sonho – ter uma Bimby em casa de cada português. Nessa altura não havia concorrência e nós vivíamos como Adão e Eva no paraíso e era tudo mais fácil. Comíamos maçãs todos os dias. Neste momento, já sei que esse meu sonho não vai ser realidade, porque existem outras marcas, claro que não tão boas como a minha, como é óbvio [risos], mas pelo menos não tão apaixonadas como a minha. A Vorwerk está a trabalhar numa visão de omnichannel, portanto vamos estar também em mais canais, a trabalhar nessa estratégia e a evoluir, com certeza, como subsidiária, para outros produtos e outras divisões na Vorwerk Portugal. Como é que isto se liga com as pessoas, que são os nossos agentes? É o nosso grande desafio neste momento e uma grande responsabilidade. O meu objetivo é que, no dia em que eu deixar aquela cadeira, esta empresa funcione tão bem ou melhor do que quando eu cá estava. Se conseguir, talvez por isso trabalhe tanto no desenvolvimento de pessoas, acho que a minha missão e a minha passagem por este desafio foram cumpridas.
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