Autora: Marta Vilar, Head of Talent Development da GMV Portugal
Estamos prontos, preparados, equipados. Estivemos dois anos a reunir forças, resguardando-nos, provando e experimentando. E, finalmente, com a carga pronta e metida nos contentores, estamos prontos para arrancar para um outro mundo, abraçar um novo modelo.
Inúmeras palavras se escreveram e muitas mais se escreverão sobre os efeitos da pandemia na mudança de paradigma no trabalho. Encontramo-nos no berço de uma nova era, uma era que, provocada por um evento a escala mundial, nos obrigou a uma alteração profunda na forma como vemos o papel da empresa e o nosso lugar de trabalho.
Claro está: isto do teletrabalho teve as suas vantagens… Apesar das dores de adaptação iniciais, representou para muitas empresas a continuidade da sua atividade. Assistimos à deslocalização do local onde se trabalha para outros lados, reduzindo o custo e, acima de tudo, o tempo “perdido” em deslocações e, em alguns casos até, com as condições certas de internet no interior, permitindo o regresso às origens de muitas pessoas dos grandes centros urbanos, tirando proveito, assim, de uma maior qualidade e de um nível de custo de vida muito mais reduzido. Isto leva muita gente a perguntar: “Então, se isto até funciona bem assim, porquê mudar?”. Até porque a própria palavra “voltar” quase que implica um olhar para o passado…e muito caminho se percorreu, para ponderar sequer o voltar por completo aos modelos de trabalho presencias.
Durante dois anos, as pessoas mudaram, as empresas mudaram, assistimos a uma mudança de paradigma, no qual os dogmas e instituições tradicionais associados ao trabalho e a produtividade foram abalados e uma, todavia, embrionária nova forma de organização do trabalho, à distância, foi concebida.
No entanto, durante dois anos, a obrigação para o teletrabalho em exclusividade trouxe um preço elevado a pagar, que para muitos ainda está em regime de moratória, mas mais cedo que tarde será cobrado. Não nos podemos esquecer que somos seres humanos, o que implica que naturalmente somos seres sociais, gregários, que funcionamos em grupo e reagimos em sociedade e o isolamento a que estivemos condicionados nos últimos tempos, terá um custo muito elevado. O trabalho realizado exclusivamente à distância promove o isolamento, a perda da relação social, chegando em alguns casos a levar a um desinteresse pessoal ou outros problemas graves do foro clínico e patológico.
Por outro lado, durante este tempo como espécie dominante, fizemos aquilo que a natureza nos programou para fazer: adaptamo-nos, criamos as condições necessárias para um escritório doméstico, procuramos dar às nossas pessoas o acesso que necessitam à informação, de forma segura, rápida e fiável. E, com isto, conseguimos otimizar muitas das tarefas individuais, que precisam de foco e concentração. De certeza que a análise daquela folha de Excel ou a criação daquele PowerPoint para a apresentação ou, até mesmo, a redação daquele relatório de progresso que nos foi pedido, terão muito mais qualidade se estivermos concentrados, no sossego do nosso lar, sem que ninguém nos interrompa.
Mas este processo de evolução não estará completo, se não considerarmos todas as partes…nomeadamente as que se perderam pelo caminho: a relação humana e social, a aprendizagem informal e a transmissão de valores e cultura de empresa. Já todos percebemos que a reunião de brainstorming com a equipa, o acolhimento e boas-vindas do novo colega ou mesmo aquela conversa “mano a mano” que temos pendente de marcar com o chefe, sobre a performance do ano passado, quando realizadas pelo Teams, não são a mesma coisa.
A câmara e o ecrã funcionam como barreiras que bloqueiam o natural desenvolvimento das relações humanas e sociais nas equipas de trabalho, destas com outras equipas e entre as mesmas e o todo da empresa.
Nem que seja, porque, ao fim deste tempo, já começamos a sentir a falta de saber como vai o filho da colega da Contabilidade ou se o caniche do colega do Marketing não voltou a morder na vizinha ou, até, ouvir a história sobre a viagem à neve do diretor de Qualidade. Que levante a mão quem não tem já saudades da conversa da copa. Ora, para quem trabalha numa empresa onde se programam satélites, testam automóveis para conduzirem sozinhos, previnem-se ciberataques, programam instrumentos para radioterapia e preparam drones e soldados do futuro, imaginem a qualidade das conversas da copa…e o quanto lhes sentimos a falta.
A câmara e o ecrã funcionam como barreiras que bloqueiam o natural desenvolvimento das relações humanas e sociais nas equipas de trabalho, destas com outras equipas e entre as mesmas e o todo da empresa
Por esse motivo, vamos abraçar o futuro munidos de um modelo híbrido e inovador. Preparado para o hoje, mas desenhado a pensar no amanhã. Neste modelo, haverá lugar para continuar a realizar aquelas tarefas que requerem a concentração e o silêncio a partir de casa, sem interrupções. Mas também haverá espaço para nos juntarmos em presença, reunir a equipa à volta da mesa (mesmo que alguns estejam em remoto), tirarmos dúvidas, partilharmos problemas e resolvermos questões na imediatez de um olhar para o colega da mesa ao lado. Continuarão a existir maneiras para encurtar as distâncias com os colegas que se encontram muito longe, noutras geografias, através duma videochamada, mas também temos espaço para conhecer aqueles nossos vizinhos de gabinete que nem sabemos bem em que projeto estão a trabalhar, mas que por certo nos poderão ensinar algo e a quem poderemos ensinar também.
Sabendo que o resultado só dependerá dos princípios que o regem: as pessoas no centro da organização, o líder da equipa como protagonista e a confiança, compromisso e responsabilidade de todos. Acreditamos que, assim, conseguiremos dar sentido e motivos para ir ao escritório, porque é essencial que as equipas se encontrem pessoalmente, transmitindo a cultura da empresa, gerando coesão e envolvimento com o projeto e com a empresa, principalmente se existem novos elementos a acolher nas equipas.
O resultado só dependerá dos princípios que o regem: as pessoas no centro da organização, o líder da equipa como protagonista e a confiança, compromisso e responsabilidade de todos
E, assim, com os olhos no futuro, estou certa de que podemos ir resolvendo os desafios do presente. Falamos do maior desafio em cima da mesa para as empresas que operam no mundo da tecnologia: o engagement das suas pessoas.
As empresas tecnológicas em Portugal até podem apregoar uma política de salários mais competitiva, os melhores e mais inovadores benefícios sociais ou, até, a melhor oferta formativa, que tudo junto não será suficiente para reter o seu talento. Cada vez mais nos damos conta que estes critérios, apesar de importantes, não são os mais determinantes. Que as empresas que o conseguem alcançar possuem um critério diferenciador, um orgulho de pertença e a identidade com a empresa. O que podem as empresas oferecer de diferente? A sua Employer Value Proposition (EVP) e isto é muito mais do que o valor que se recebe na folha de ordenado. A malha que pode segurar ou deixar cair por terra esse vínculo com a organização é a cultura, são os valores pelos quais a empresa se pauta e com os quais nos identificamos, o não escrito, o não verbal, aquele intangível que por muitos manuais ou políticas que se leiam, muitos acordos e contratos se redijam e que por muitas sessões de acolhimento feitas por Teams…não chegam ao outro lado. O ADN corporativo é algo que não se transmite com a leitura de um documento, não se explica, mas sente-se. Numa altura em que se fala na “grande demissão”, em que as empresas tecnológicas atravessam tempos em que é tema de discussão estratégica as dificuldades de aquisição e retenção de talento, a forma de enfrentar as elevadíssimas taxas de rotatividade, pode-se facilmente imaginar que à distância, tudo isto tende a agravar-se.
O que podem as empresas oferecer de diferente? A sua Employer Value Proposition (EVP) e isto é muito mais do que o valor que se recebe na folha de ordenado
Por isso, acreditamos que só uma solução combinada, que abraça as vantagens dos dois mundos, assente num modelo flexível, híbrido e responsável poderá contribuir para reduzir estes riscos e potenciar as vantagens.
Por estes motivos, e porque acreditamos que o sucesso é um caminho de conquistas e exploração do desconhecido, vamos apostar neste modelo de flexibilidade como o nosso veículo a caminho do futuro.
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