A Bosch Car Multimédia Portugal, S.A., unidade da Bosch em Braga e a maior do grupo em Portugal, tem crescido a olhos vistos. Dedicada ao desenvolvimento e produção de sistemas de infotainment, instrumentação e sensores de segurança para a indústria automóvel, duplicou a faturação nos últimos quatro anos conquistando, em 2018, um lugar entre os quatro maiores exportadores do país. A RHmagazine conversou com Carla Gomes, HR Manager da empresa, que fala dos aspetos potenciadores deste crescimento e dos desafios que acarreta.
A Bosch Car Multimédia Portugal, S.A. tem um centro de desenvolvimento para o grupo com muitos projetos em mãos. A que se dedica?
A Bosch produz, em Braga, um portefólio de produtos alargado que inclui sistemas de navegação, infotainment e instrumentação, bem como sensores de ângulo de direção para a indústria automóvel. No centro de investigação e desenvolvimento temos mais de 400 engenheiros com diferentes áreas de competência, como gestão de projetos, desenvolvimento mecânico, hardware e software, metodologias agile, machine e deep learning. As nossas equipas trabalham em soluções de mobilidade em que desenvolvem sensores automóveis de localização e perceção, soluções de infotainment, conectividade e human machine interface. A aposta passa, indubitavelmente, pelo desenvolvimento de projetos de forma antecipada, o que nos permitirá escrever um novo capítulo na área eletrónica e de software, tornando possível e mais próxima a condução autónoma.
Como explica o crescimento dos últimos anos?
Para alcançar estes objetivos, desde 2013, muito têm contribuído as parcerias com a Universidade do Minho. Além do desenvolvimento de tecnologias de elevado grau de inovação, abrangem o desenvolvimento de novos processos, produtos e soluções que permitem o reforço e a entrada em novos mercados. Contemplamos a criação, em Portugal, de conhecimento e tecnologia que se traduza em inovações mundiais em soluções do automóvel do futuro.
Este crescimento consubstancia-se em desafios constantes, que exigem muito de toda a equipa de gestão e, particularmente, dos recursos humanos. Por um lado, procuramos a excelência técnica, com abordagens flexíveis, soluções fiáveis e de qualidade, por outro inspiramos os colaboradores, oferecendo oportunidades de carreira num ambiente de trabalho sustentável e com um espírito de equipa excecional.
Contemplamos a criação em Portugal, de conhecimento e tecnologia que se traduza em inovações mundiais em soluções do automóvel do futuro
Que ações têm em curso para captar talento e como trabalham a EVP?
O recrutamento não só é o maior desafio atual das empresas, como será o maior desafio dos recursos humanos nos próximos anos. Numa conjuntura em que os talentos escasseiam e a competição entre empresas pelos melhores é cada vez mais marcada, a ideia do “post and pray” está totalmente ultrapassada e exige medidas robustas e criativas por parte dos recursos humanos. Temos mais de 150 vagas em aberto, mais de 50% referentes a perfis IT, e esforçamo-nos diariamente por atrair os melhores e contribuir para os resultados de negócio.
Feiras de emprego ou tech talks são extremamente relevantes na divulgação de vagas e captação de novos talentos, mas precisamos de reinventar as formas de atração, criando ações mais cirúrgicas, eficazes e eficientes. Para isso, começámos a investir em canais de comunicação que incidem no público IT e que impactam no posicionamento da Bosch.
O dia de recrutamento, em novembro, permite aos candidatos conhecerem a empresa e perceberem o ambiente dinâmico, inovador e desafiante em que poderão desenvolver competências. A revisão da employer value proposition, assente numa mensagem muito mais voltada para o futuro e para a criação de produtos de alta qualidade, permitirá ao candidato perceber o impacto que terá na vida das pessoas. Acima de tudo, queremos fazer a diferença. Uma nova mensagem #LikeABosch, conjugada com um novo estilo e um plano de comunicação sistémicos, impactará o mercado e a perceção que os candidatos têm da empresa.
Querem que o colaborador assuma que o seu desenvolvimento é responsabilidade sua. Na prática, em que se traduz esta ideia?
É necessário redefinir as carreiras com novos modelos assentes no autodesenvolvimento, iniciativa e individualidade dos percursos de carreira. Sentimos, ainda, necessidade de promover iniciativas de desenvolvimento de talento que incitem uma experiência baseada na aprendizagem, exposição e visibilidade. Este novo ambiente terá como base princípios básicos de igualdade de oportunidades, desenvolvimento contínuo, experiência internacional dentro da empresa e desenvolvimento e crescimento como uma responsabilidade do colaborador.
Os processos de desenvolvimento baseados em metodologias agile deverão acompanhar as novas necessidades destas equipas, dos líderes e de cada colaborador. Carreiras tradicionais precisam de se reinventar, dando espaço a percursos mais complexos que contribuirão para aumentar as perspetivas de desenvolvimento do colaborador.
Temos de acompanhar a transformação cultural com uma alteração do conceito de liderança em que cada um, independentemente da função ou nível hierárquico, assume a liderança do seu desenvolvimento. Deixar que cada um contribua para o todo, potenciando os seus pontos fortes ao mesmo tempo que alavanca os pontos menos positivos, através da aprendizagem de uma escuta baseada na perspetiva do outro, é o caminho para um crescimento mais rápido e muito mais rico.
Temos de acompanhar a transformação cultural com uma alteração do conceito de liderança em que cada um assume a liderança do seu desenvolvimento
Como se manifesta a transformação digital na área da formação?
Assistimos a uma transformação do modelo tradicional de formação em sala para um modelo assente no digital, na iniciativa, inovação e difusão dos conhecimentos. Alinhados com o despoletar de uma organização Agile, são vários os eventos formativos baseados em partilhas de conhecimento e experiências, que podem ser organizados pelos próprios colaboradores. Estas atividades contribuem para a promoção da visibilidade e networking, em que o colaborador impulsiona não só o seu desenvolvimento, mas também o dos outros.
Na Bosch e-universities, disponibilizamos plataformas de aprendizagem digitais para interação com professores e outros alunos, além de acesso a material e conteúdos diversos. Mais uma vez, procuramos formas de aprendizagem transformacionais ajustadas ao nível de conhecimento de cada colaborador e aos objetivos que pretende atingir. Também os nossos operadores verão mudanças significativas: novas metodologias estão a ser desenhadas com vista a um ambiente de aprendizagem inovador, baseado em gamificação, realidade virtual e realidade aumentada.
A formação altera modos de estar e pensar dos colaboradores, mas é também uma forma de gerarem impacto nos outros, assumindo um papel de consultores e mentores, com uma atitude de inovação e empreendedorismo.
Dizem que a liderança é fundamental para crescer. Como têm trabalhado este tema?
A transformação digital tem trazido à liderança grandes desafios, exigindo uma transição dos modelos tradicionais para modelos mais ágeis, que prepararão a empresa para o futuro. A primeira grande alteração consistiu na fundação de um novo conceito, em que todos somos responsáveis pela colaboração e liderança (“We Lead Bosch”).
Baseado em fortes princípios de autonomia, comunicação aberta, excelência, inovação, feedback, confiança, respeito e empatia, este conceito leva-nos a um modelo de liderança refletido em três dimensões: liderança de negócio, liderança dos outros e a liderança de cada um. Tudo isto levou a Bosch a introduzir o conceito de liderança positiva, cuja base é construída nas atitudes, crenças e valores. Neste domínio, prolifera a introdução de novas dinâmicas de feedback numa perspetiva de user experience, de forma a permitir que líderes e organizações acompanhem a evolução e motivação dos colaboradores. Introduz-se o conceito de “feedforward” e dissemina-se a vantagem que a influência positiva tem na motivação dos colaboradores e no sucesso da organização. Não se trata de ignorar problemas, mas de investir o mesmo tempo na procura de forças e potências, construídas com base em experiências de sucesso anteriores.
Entrevista publicada na edição n.º 136 da RHmagazine, referente aos meses de setembro/outubro de 2021.